Parte da história da colonização alemã no Rio Grande do Sul desabou junto com as paredes da Casa do Imigrante nesta terça-feira (5), no bairro Feitoria, em São Leopoldo. Com problemas estruturais graves desde 2014, quando fechou ao público, o local estava para receber escoras de emergência na próxima semana para tentar evitar o pior. Tarde demais. A tragédia só não foi pior por que a maior parte dos objetos históricos já havia sido retirada da construção. Apenas alguns móveis continuam no local, na área que não foi afetada pelo desabamento.
A casa foi construída em 1788 e nela funcionava a Real Feitoria do Linho Cânhamo, que fazia cordas para os navios a vela e tinha mão de obra escrava. Em julho de 1824, a edificação ganhou um significado histórico que a marcaria para sempre: abrigou as primeiras 13 famílias (39 pessoas) de alemães que chegaram ao Rio Grande do Sul. No mesmo ano, as paredes de pedras da construção testemunharam outra marca para a posteridade: um dos primeiros cultos não católicos (protestante) no Estado.
– O imóvel estava, desde 2014, com esses sinais, foi quando se fechou à visitação. O local foi esvaziado e iniciamos o projeto de restauração. Desde 2017, quando foi aprovado o projeto, tentamos captar dinheiro para executar essa restauração, sem sucesso – conta o presidente do Museu Histórico Visconde de São Leopoldo (MHVSL), que administra da Casa do Imigrante, Cássio Tagliari.
Segundo ele, um temporal no mês de dezembro comprometeu definitivamente a Casa do Imigrante. Desde então, o esforço era evitar o pior por meio de escoras, o que seria feito na próxima semana, principalmente na área mais recente da construção. A parte mais antiga, de 1788, era construída em pedra e permaneceu de pé. A restauração completa estava orçada em cerca de R$ 700 mil.
Documentos históricos e quartos temáticos
Nos anos 1940, a construção foi adquirida pela prefeitura de São Leopoldo, que encaminhou uma restauração total do prédio. Foi quando se acrescentaram os traços tipicamente germânicos que imitaram o estilo enxaimel – técnica de construção que consiste em paredes montadas com hastes de madeira encaixadas entre si. Em 1984, o local foi transformado em museu, passando a ser administrado pelo Museu Histórico Visconde de São Leopoldo (MHVSL).
O prédio foi tombado pelo patrimônio histórico do Estado em março de 1992. Em 2011, parceria entre o Clube de Mães Feitoria e o MHVS executou projeto de dinamização de funcionamento da Casa do Imigrante. A Universidade Feevale, por meio de projeto de extensão, chegou a vincular alunos dos cursos de História e Turismo para desenvolverem atividades no espaço.
Quando em funcionamento, a Casa do Imigrante chegou a reunir um acervo de centenas de objetos históricos. Quem ia ao museu também deparava com máquinas de costura de 1880 e geladeiras de 1920. Nos cômodos, havia exposições temáticas de móveis, utensílios e vestuário utilizados pelos germânicos.
Era possível conferir como era uma cozinha colonial da época, um quarto de alfaiate, de dormir, uma oficina de fotógrafo e a uma venda típica da colônia, entre outras salas antigas. No pátio, uma atafona (engenho de moer grãos) e uma coleção de pedras tumulares antigas dava mais contornos à cultura alemã trazida ao Rio Grande do Sul. A deterioração, que em 2014 forçou o fechamento, também revelava aos visitantes paredes comprometidas pela umidade, tábuas levantadas no piso e teto com madeiras quebradas.
– A prefeitura tem a sua responsabilidade, mesmo a Casa não sendo um prédio da público, era administrado pelo Museu. A saída, agora, é unir forças. Já entramos em contato com o governo do Estado, faremos com o governo federal, e precisaremos da iniciativa privada – projeta o secretário municipal de Cultura de São Leopoldo, Pedro Vasconcelos.
Uma história da Casa do Imigrante
1788 – Construção do prédio que abrigou a Real Feitoria do Linho Cânhamo, especializada na fabricação das cordas dos navios portugueses.
1824 – Fazenda recebe os 39 primeiros alemães a desembarcarem no Estado.
1941 – Acontece uma grande reforma quando a prefeitura assume a casa, que foi repassada pelos luteranos que administravam o local. No mesmo ano, vira sede da Escola Dr. João Daniel Hillebrand.
1976 – Transforma-se em subsede do Museu Histórico Visconde de São Leopoldo.
1984 – O local é transformado em museu.
1992 – Prédio é tombado pelo Patrimônio Histórico do Estado.
2014 – A construção é fechada para visitação por falta de infraestrutura adequada.