A cada vídeo, Alice Baltezam, nove anos, posiciona o smartphone em frente ao rosto, abre um sorriso e repete a entusiasmada saudação: "Oi, galerinha!".
Já Milena Stepanienco, a Mileninha, 12, anuncia sua chegada com uma expressão semelhante e que se tornou seu bordão: "E aí, galerinha do YouTube!". As duas influenciadoras mirins integram uma geração que nasceu conectada. Consomem tudo sob demanda, estão sempre com o celular na mão e têm nos youtubers e blogueiros seus ídolos. E, como não é difícil abrir um canal online para postar conteúdo, sonhavam - como tantas outras crianças - em conquistar seu próprio espaço no mundo digital, um desejo que, concretizado, acabou envolvendo a família inteira numa intensa jornada.
Se você é pai ou mãe e seu filho ainda não pediu para gravar um vídeo e publicar nas redes sociais, talvez seja questão de tempo para isso acontecer. Dados da pesquisa TIC Kids Online Brasil, de 2016, apontam que 56% dos usuários de internet entre nove e 17 anos compartilham textos, imagens ou vídeos. Um levantamento recente da revista Crescer revela que os pequenos acompanham os youtubers: 47% têm algum influenciador ou canal a que assiste com frequência.
Os números vão ao encontro do mapeamento Geração YouTube, liderado por Luciana Corrêa, pesquisadora da ESPM. Focada no consumo e na produção infantil brasileira com recorte de zero a 12 anos, a pesquisa mostra que o número de visualizações de canais voltados aos pequenos saltou de 26 bilhões entre 2005 e 2015 para 52 bilhões apenas em 2017. Quem puxa a audiência para cima são youtubers mirins ou adolescentes, que cresceram, respectivamente, 123% e 490% em número de visualizações nos últimos dois anos.
- Houve um boom do consumo e da produção dos vídeos. Vemos aquelas crianças que cresceram vendo a Galinha Pintadinha seguirem consumindo outras coisas. Também teve um movimento de se inscrever nos canais. Hoje, creio que ainda estamos longe do ápice - comenta Luciana, que completa: - O fenômeno de ser influencer é quase um hábito da geração, já faz parte. Para essas crianças, é muito comum ficar se expondo.
Exposição realmente não é problema para Alice e Milena. Natural de Santa Cruz do Sul, Milena chegou a um patamar que muitos influenciadores mirins almejam: tem dois canais no YouTube que, juntos, somam 4 milhões de inscritos - no Instagram, seu perfil reúne 300 mil fãs. Moradora de Esteio, Alice trilha o mesmo caminho com seus 24 mil inscritos no canal Hora da Alice e mais 15 mil seguidores no Instagram.
As gurias são exemplos para milhares de crianças que desejam ter seu espaço nas redes sociais reconhecido pelo grande público. É o caso de Rafael Vargas Ferreira, oito anos, de Charqueadas. O menino decidiu que quer estrelar um canal no YouTube, e a família buscou auxílio de uma escola especializada na formação de crianças influenciadoras para ajudar a concretizar o sonho do guri. Em Porto Alegre, Rodrigo de Lima Huesken, 12 anos, passa por um processo parecido. Deu início a um canal, faz curso de teatro e participa de uma oficina na escola para aperfeiçoar sua performance nos vídeos e desenvolver ainda mais as habilidades de comunicação.
A reportagem de GaúchaZH acompanhou de perto a rotina dessas quatro crianças que acreditam, ainda tão cedo, ter encontrado no universo digital o seu lugar. Milena tem vida de estrela em Balneário Camboriú, onde vive com a família desde o início do ano - a mudança para uma cidade mais próxima de um aeroporto facilitou as idas a São Paulo e ao Rio de Janeiro. Alice e sua família mudaram a rotina para tentar consolidar um público fiel na internet e, hoje, já colhem os frutos de ter alguns milhares de seguidores. Rafael e Rodrigo ainda estão no início da maratona, comemorando cada seguidor que não seja um amigo ou membro da família - tudo isso sob o olhar atento dos pais, que tentam entender qual o limite dessa "brincadeira" e quando é a hora de dizer "não".