Em vez de um protesto com cartazes e palavras de ordem, defensores do livro O Avesso da Pele se reuniram na Livraria Clareira, no Bom Fim, em Porto Alegre, para recitarem em voz alta, trecho por trecho, o romance que foi recolhido de uma biblioteca de escola em Santa Cruz do Sul e posteriormente censurado em outros lugares do Brasil. A leitura coletiva iniciou às 18h desta sexta-feira (8) e só terminou quando as 192 páginas chegaram ao fim.
O apoio à obra e ao escritor Jeferson Tenório foi uma proposta do Festival Literário Rastros do Verão, que movimenta diversas livrarias de rua da Capital. Escritora e colunista de GZH, Martha Medeiros fez questão de participar. Ela já havia prestigiado o romance que retrata a história de um professor negro morto pela polícia ao ser confundido com um bandido, mas, quando soube que havia sido considerada inadequada para estudantes do Ensino Médio, quis ler mais uma vez.
— Li e reli esse livro, porque queria entender o que estava acontecendo para ter sido censurado. Não há nada nele que seja aviltante e proibido para adolescentes. O que está acontecendo com esse livro é perseguição — afirmou a escritora, momentos antes de sentar-se diante dos demais e dar início à leitura das páginas.
Em torno de 50 pessoas se espremeram na pequena livraria situada na Rua Henrique Dias. Alguns sentados em cadeiras do lado de dentro, outros em pé, do lado de fora. Professora de artes no Colégio Estadual Júlio de Castilhos, Danielle Rosa, 37 anos, decidiu ler o livro quando a obra censurada e tornou-se um dos principais assuntos da semana no noticiário nacional.
— É um absurdo. Não podemos negar o acesso à arte. Precisamos falar de todos os assuntos com os adolescentes, propor discussões na escola, e não criar tabus sobre qualquer coisa. E o livro é lindo, eu ri, me emocionei e me identifico — destacou a docente, que leciona para o Ensino Médio.
Fundador do Rastros de Verão, Fernando Ramos teve a ideia da leitura coletiva quando o premiado livro de Jeferson Tenório foi censurado também pelo governo do Paraná, que determinou seu recolhimento das escolas estaduais. Segundo ele, o escritor ficou abalado com a forma como parte da sociedade está encarando sua obra.
— Isso desgasta, mas não é nada que o Tenório não saiba. Faz parte de uma guerra cultural. Mas eu sou otimista. Reunir as pessoas que defendem o livro é mais interessante do que fazer um abaixo-assinado ou um manifesto. É muita gente pela mesma causa. O fato de as vendas do livro terem aumentado 400% na Amazon é uma prova disso — diz Ramos.