A Feira do Livro de Porto Alegre conta com diferentes personagens circulando entre as bancas, como autores, livreiros e visitantes. O escritor Esteban Rey Fontan, 51 anos, poderia passar despercebido enquanto passeia pelos corredores da Praça da Alfândega se não fosse por dois detalhes – carrega uma coelhinha marrom por onde transita e veste preto de cima a baixo.
— Sofri muito bullying no segundo grau da escola. E uma das poucas coisas que me aliviavam daquele sofrimento era ouvir as músicas melancólicas do Bauhaus (grupo inglês). E o Peter Murphy (vocalista da banda) sempre vestia preto — explica Rey Fontan, jornalista por formação que incorpora a indumentária na cor preta desde os 13 anos de idade.
Faça chuva ou sol, esteja quente ou frio, ele veste preto. A sala de sua casa também é pintada da mesma cor. Atencioso com as pessoas, Rey Fontan admira filmes expressionistas alemães. Vive em Esteio, na Região Metropolitana, onde passa os dias se dedicando à correção e à leitura de livros de futuros autores. Além de escritor, também tem uma pequena editora.
Questionado sobre a razão de levar uma coelha à Feira do Livro, ele explica que o motivo é a depressão. A mascote o ajuda a superar os momentos mais difíceis. Veio com o tutor de trem dentro de uma bolsa aberta, com ração e folhas de couve-flor para comer.
Batizada de Pó Pi (assim mesmo, com o nome separado e com acento), tem cerca de um ano de idade. Na quarta-feira (1°), esteve pela primeira vez na Praça da Alfândega. Estava calma e passeou por cima de alguns livros nos balaios.
— Já trouxe antes o coelho Pom Pom e os meus porquinhos-da-índia — conta o escritor, enquanto alguns visitantes param para fotografar a coelha e pedem para segurá-la no colo.
Rey Fontan já lançou dois livros. A Paixão dos Amantes pela Morte (2010) é uma obra composta por 14 contos e chegou a inspirar uma peça no Theatro São Pedro e na Casa de Teatro no ano 2000. O livro de estreia rendeu críticas de nomes como Juremir Machado da Silva, Luiz Antonio de Assis Brasil, Moacyr Scliar e Cíntia Moscovich. Já o infantil A Lenda do Patinho Azul (2015) trata exatamente da temática do bullying. Esse segundo já oportunizou ao autor compartilhar suas experiências em mais de 60 palestras com alunos de escolas do RS.
Além da Pó Pi, Rey Fontan tem outro coelho, um cachorro, um gato, três porquinhos-da-índia e um galo. Mas esse último não mora debaixo do mesmo teto dos demais. Por cantar de madrugada, os vizinhos de seu condomínio exigiram que fosse levado para outro lugar. Agora, o galo vive no depósito de um amigo a cerca de 200 metros de distância. Mas recebe alimento, carinho e visitas diárias do escritor.
O contato com tantos animais o incentiva a planejar o próximo livro.
— Vou lançar no ano que vem o livro sobre o Pretume (nome do gato) e como ele me ajudou a combater a depressão. E um canal no YouTube que se chamará A Arca do Pretume — antecipa, dizendo que pensa ainda em publicar uma história em quadrinhos de seus companheiros.
O gato mencionado tem outra história bastante curiosa. Há alguns anos, Rey Fontan precisou ir a um hospital para uma consulta com um ortopedista. O felino, de cor preta, saltou em suas pernas na entrada da instituição. Horas depois, quando ele saiu, o gato voltou a procurá-lo na porta. Resultado: Rey Fontan o adotou.
O livro muda e salva vidas
ESTEBAN REY FONTAN
Jornalista, escritor e editor
O autor sempre esteve envolvido com o universo dos livros, sua maior paixão. Participou de oficinas literárias ministradas pelos escritores Luiz Antonio de Assis Brasil e Charles Kiefer. Lê sempre, e lê de tudo, em especial mitologia grega, psicanálise, Edgar Allan Poe e Shakespeare.
Também planejava lançar este ano uma trilogia de peças teatrais sobre tragédias, mas o projeto atrasou e agora deverá ficar para 2024. Enquanto isso, segue editando livros de outros autores e cuidando dos seus animais.
Na Feira do Livro, o autor conversa com livreiros, procura espaços para deixar seus livros e participa de debates com outros escritores. Conhece muita gente; e muitos o conhecem.
— O mais importante é ver a presença do público, ter crianças e jovens pegando os livros e lendo as histórias. O livro muda e salva vidas — reflete.
Com a coelhinha entre os braços, Rey Fontan deixa seu último recado:
— Ame amar o amor.