A falta de recursos da Lei de Incentivo à Cultura (LIC) para eventos tradicionais afetará a 69ª Feira do Livro de Porto Alegre, que ocorre entre 27 de outubro e 15 de novembro. Sem a liberação para a captação de verbas através do mecanismo, a atividade literária terá um orçamento com R$ 871.631 a menos (ou seja, 22,20% menor do valor total que pode ser obtido), o que impactará na entrega de atividades para os frequentadores.
De acordo com o presidente da Câmara Rio-grandense do Livro (CRL), Maximiliano Ledur, o baque é ainda mais significativo porque boa parte do valor que seria disponibilizado pela LIC já havia sido captado junto a empresas participantes — que teriam desconto em impostos pagos ao Estado. De acordo com o líder da entidade, é o primeiro ano, desde que a LIC foi criada, em 1996, que o evento não contará com o recurso.
Agora, para suprir essa queda orçamentário de centenas de milhares de reais, a ideia da entidade que organiza a Feira do Livro é pedir um suporte financeiro diretamente ao governador do Estado, Eduardo Leite — uma audiência já foi pedida, diz o presidente da CRL —, tentar patrocínios diretos e, também, buscar ampliar a Lei Rouanet, já pré-aprovada. Pelo mecanismo de captação de recursos federal, poderão ser destinados R$ 3.056.222,76. Somando os dois valores — da LIC e da Rouanet —, segundo Ledur, o evento chegaria ao seu tamanho ideal, com orçamento de R$ 3.927.853,76.
— Este valor incluiria toda a produção da Feira, da montagem, passando pela cobertura até todas as ações dentro do evento. A gente já tinha orçado tudo para a Feira deste ano — diz Ledur. — Vai prejudicar, por exemplo, a contação de histórias, para qual trazemos em torno de 500 turmas escolares da rede pública do Estado para a Feira. Isso vai ter que ser reduzido, porque a gente tem que tirar de algum lugar essa falta de dinheiro.
O presidente da CRL, assim, enfatiza que a contratação dos ônibus para fazer o deslocamento dos alunos até o evento não poderá ser feita — pelo menos, não na quantidade que ocorria nas outras edições. Além disso, os cachês dos autores trazidos para a festa literária poderão sofrer diminuições. Tudo está, no momento, sendo discutido pelos organizadores, que buscam soluções.
Ledur aponta que os valores pedidos este ano são praticamente os mesmos que os solicitados em 2022 (R$ 3.028.509,60 para a Rouanet e R$ 832.319 para a LIC). Mesmo assim, a ideia era colocar mais quatro bancas no evento:
— Atualmente, estamos fazendo a Feira do Livro com quase a metade do valor que era disponibilizado há 15 anos. Estamos diminuindo tudo o que dá.
Soma-se às dificuldades, também, a questão da captação da Rouanet. De acordo com Ledur, a lei é mais fácil de ser aplicada para eventos centralizados no país, uma vez que as empresas nacionais estão, em sua maioria, sediadas em São Paulo e a dedução de impostos neste mecanismo ocorre em nível federal. Para a Feira do Livro de Porto Alegre, mais local, o ideal seria a LIC, estadual. No momento, cerca de 70% do montante disponibilizado pela Rouanet foi captado, mas o tempo é curto para buscar o restante — faltam apenas três meses para o evento.
Sem a LIC, a gente compromete a quantidade e a qualidade do evento
MAXIMILIANO LEDUR
presidente da Câmara Rio-grandense do Livro
— Sem incentivo, a Feira do Livro fica muito prejudicada na questão de sua programação e no atendimento à população. Temos uma programação muito vasta, muito grande, que é muito importante para difundir o livro. Sem a LIC, a gente compromete a quantidade e a qualidade do evento — ressalta o presidente da CRL.
Mudança
A ausência da LIC na Feira do Livro de Porto Alegre se deu por conta da polêmica mudança de critérios de desempate promovida pelo Conselho Estadual de Cultura (CEC) para decidir para quais eventos as verbas seriam destinadas — "projeto com local de realização em município que menos recebeu recursos da LIC nos últimos 12 meses". Desta forma, eventos tradicionais ficaram de fora da distribuição, por estarem sediados em cidades que foram mais contempladas.
O CEC até tentou encontrar soluções para a situação dos eventos que não foram atendidos pela LIC junto à Secretaria Estadual da Cultura (Sedac) e à Casa Civil, como suplementação de verbas e remanejamento de recursos, porém, não obteve sucesso. No próximo ano, porém, o formato de escolhas de projetos que receberão apoio do mecanismo será ajustado para não deixar eventos tradicionais desamparados.
Segundo Ledur, a Prefeitura de Porto Alegre está dando suporte, cedendo a Praça da Alfândega para instalar o evento e disponibilizando a sua estrutura de funcionários para apoiar na limpeza e na segurança da atração literária. Além disso, no ano passado, um aporte de R$ 150 mil foi repassado para realização das atividades — em 2023, o valor deverá ser novamente cedido para a CRL.
— O CEC fica tentando justificar o injustificável. Não patrocinar eventos como a Feira do Livro, o Acampamento Farroupilha, o Festival de Cinema de Gramado e o Porto Alegre em Cena é um absurdo. Não se pode abrir mão de eventos com essa magnitude. Mas, maior ou menor, a Feira do Livro vai sair de qualquer jeito e a gente vai fazer uma Feira de dar orgulho para a cidade — afirma Ledur.