A jornalista da Globo Ilze Scamparini, 64 anos, um dos rostos mais conhecidos do telejornalismo brasileiro, está no Rio Grande do Sul para eventos de lançamento de seu livro de estreia, Atirem Direto no Meu Coração (Harper Collins, 2021, 304 páginas).
Na manhã desta terça-feira (27), a profissional, que trabalha há mais de duas décadas como correspondente internacional na Itália, concedeu uma entrevista ao programa Timeline Gaúcha, da Rádio Gaúcha, e falou, entre diversos assuntos, sobre o processo de escrita da obra. Questionada como conseguiu achar tempo na rotina para escrever, explicou:
— Tive que optar pelas madrugadas. Depois do jantar, descansava um pouco e escrevia até umas 3h. Foi cansativo, mas muito interessante. Quando o cansaço começou a pesar demais, optei pelo (horário do) nascer do sol. Meu despertador tocava às 4h. É a melhor hora para escrever. Tem todo o silêncio da madrugada, mas não tem aquele cansaço absurdo. Foi assim que eu escrevi meu livro. Aprendi a dormir muito pouco, adquiri esse hábito, acho que nem faz bem.
Uma das temáticas do livro de Ilze é o contexto da guerra, já que a história da obra é baseada em entrevistas realizadas pela jornalista com uma mulher que lutou como soldado de milícia na Guerra do Kosovo (1998-1999).
— A guerra não tem nada de bom, só desertifica a alma das pessoas. Eu acho que o livro mostra isso, acho que essa é uma das qualidades do livro — avaliou. — É impressionante a capacidade do ser humano de se acostumar com o cruel. É algo que tem que ser explicado pelos especialistas. (O ser humano) perde a capacidade de indignação. Se meu livro tem alguma mensagem, pelo menos eu tentei (passar), é mostrar o perigo dos nacionalismos e a inutilidade da guerra.
Rotina de correspondente
A respeito da rotina de trabalhar em um país e trabalhar para outro, a jornalista destaca o desafio de viver sob a regência de dois relógios.
— Em uma parte do ano, são cinco horas de diferença (entre a Itália e o Brasil). Acontece alguma coisa e você não tem nem com quem falar, porque é madrugada aqui. Isso te cria uma duplicidade enorme e uma complicação na vida, que depois você se habitua. Acordo cedo, leio todos os jornais e revistas e blogs italianos, coisas que são relevantes e que podem me dar uma ideia do que pode acontecer no dia. Aí passo a ler os jornais brasileiros. Primeiro os italianos, porque é o territórios onde estou. Tomo café, vou caminhar um pouco, cuido da minha cachorrinha. Aí começo a pensar em qual história oferecer para os telejornais. Falo com o escritório da Globo de Londres e penso o dia, o que pode render. Se não tem nenhuma notícia interessante, cuido de uma produção do Fantástico ou de algum outro telejornal. Passo o dia trabalhando.
Momento marcante
Na entrevista, Ilze ainda relembrou o momento em que, ao entrevistar o papa Francisco, em 2013, ouviu como resposta de uma pergunta a famosa frase "Quem sou eu para julgar os gays?". O momento teve repercussão mundial e marcou uma nova fase da Igreja com a comunidade LGBT+.
— Foi uma pergunta muito arriscada. Nenhum jornalista tinha feito uma pergunta dessa natureza para um papa. Eu estava em pé ao lado do Papa, saí, fui para o fundo do avião, e meus amigos já vieram me abraçar. Se houve uma celebração, foi naquele momento, recebendo o abraço dos meus amigos jornalistas. Ali, se entendeu, naquela frase, que não só era a frase mais importante da Jornada Mundial da Juventude, como aquela frase iria inaugurar alguma coisa muito importante — afirmou.
— Um jornal estrangeiro definiu como "a pergunta e a resposta que muda a história dos pontificados". Realmente, foi importante. O que eu acho curioso é que ainda provoca... Já se passaram 10 anos, e ainda hoje se discute isso. Claro que a ala conservadora da igreja não gostou nem da pergunta nem da resposta. Então existe resistência, mas existe também comemoração ainda hoje desse momento. Que foi um momento, modéstia à parte, de grande intuição minha e, sobretudo, de grande intuição do nosso Papa. Foi bacana — acrescentou.
Lançamento em Porto Alegre
O livro de Ilze também terá lançamento em Porto Alegre na próxima quinta-feira (29), no Espaço Astir (Av. Independência, 1.053), a partir das 18h30min.