Um dia, o coelho cansou de sair da cartola e percebeu que poderia assumir o lugar do mágico. E teve uma vez em que uma garotinha descobriu a existência de uma velha sentada dentro de sua cabeça. A primeira premissa é o mote de O Pulo do Coelho (editora Carochinha, 48 páginas, R$ 39,90, ilustrações de Lais Dias), enquanto o segundo argumento faz parte de Edith e a Velha Sentada (editora Pallas, 64 páginas, R$ 49, ilustrações de Edson Ikê) — este um relançamento. Lançadas em maio, ambas as histórias saíram da mente de Lázaro Ramos.
Além de ator, diretor e apresentador, Lázaro é um autor de obras infantis. O Pulo do Coelho é sua sexta incursão no gênero. Ele ressalta que não sabia que escreveria diretamente para crianças: apenas tinha vontade de compartilhar suas histórias com o mundo. Para Lázaro, os temas aparecem naturalmente, e ele os trabalha sem focar necessariamente nos pequenos leitores.
— Minha visão de mundo é humorada, emotiva e lúdica. É um pouco o jeito que funciona minha cabeça, que acaba servindo muito bem para a literatura infantil — destaca.
Com ilustrações de Lais Dias, O Pulo do Coelho é uma história que, praticamente, surgiu inteira para Lázaro. Um dia, o escritor teve a ideia de trabalhar com a inversão dos papéis de um clássico circense: o coelho ocupar o posto de mágico. O livro conta a história de Gusmão (homenagem ao ator Mário Gusmão, que sempre representou um futuro possível para Lázaro), um menino de 11 anos que se transforma em coelho durante um sonho.
No início, ele passa a trabalhar para um mágico como parte do show em um circo. Até que ele decide se transformar na atração principal e parte atrás desse sonho. A jornada de Gusmão acaba se tornando uma busca por autonomia. O coelho está livre, e agora? Há a hesitação, a desconfiança, a frustração, mas ele aprende que não existe sucesso nem fracasso que sejam eternos. Conforme Lázaro, além da autonomia, O Pulo do Coelho traz uma mensagem forte sobre o que fazer quando se conquista a liberdade.
— A criança que pede para dormir sozinha ou atravessar a rua sem ajuda também enfrenta o medo do escuro ou do carro. Assim como quando nós, adultos, queremos largar um emprego, e quando fazemos isso sentimos um medinho dessa nova vida. A libertação também traz desafios — ressalta.
Equilíbrio
Edith e a Velha Sentada é o relançamento de um título de 2010. Desta vez, a obra é ilustrada por Edson Ikê. Lázaro planejava relançar esse livro há um tempo, mas, durante a pandemia, percebeu que seria relevante discutir novamente o uso equilibrado da tecnologia. Aliás, essa história já foi adaptada para um espetáculo em 2014, com direção do próprio autor.
Na trama do livro, Edith (nome da personagem inspirada na avó de Lázaro) é uma garota pouco curiosa e sem vontade de fazer amigos. Aos nove anos, ela é uma criança apática: vive vidrada nas telas da TV e do computador, ignorando o mundo e as emoções em seu entorno. Até que um dia uma vizinha faz uma indagação que Edith leva ao pé da letra: "Será que essa menina tem uma velha sentada dentro da cabeça?". Então, a garota decide procurar em qual lugar do seu cérebro essa idosa estaria morando, iniciando uma viagem pelo seu pequeno corpo. Quem sabe essa velhinha não estaria sugando sua alegria?
— Que família com criança pequena não precisa ficar regulando o uso de tecnologia? Permitir à criança assistir televisão, usar o celular, computador ou tablet sem que o tempo seja excessivo? O livro aborda isso, mas de uma forma lúdica — diz o autor. — A tecnologia é boa, mas é importante equilibrar com outras atividades.
A fonte de inspiração para Lázaro costuma estar em casa: os filhos João Vicente, nove anos, e Maria Antônia, seis anos, frutos de seu casamento com a atriz Taís Araujo. Às vezes, o escritor conta as histórias para os dois antes de dormirem e assim vai captando a reação deles. Contudo, sua pesquisa de trabalho vai além do lar.
Há alguns anos, Lázaro costuma mandar seus livros para duas escolas: uma particular e outra pública, sem o seu nome, para as crianças lerem e darem um feedback — por meio de desenhos, redações e críticas. Com esse material em mãos, ele escreve a versão final. Edith e a Velha Sentada, por exemplo, teve o desfecho totalmente alterado por duas crianças.
Em um momento do livro, Edith está "se afogando nas telas". Duas crianças desenharam um computador, com a personagem dentro da máquina. Uma criança ilustrou Edith se afogando no computador, enquanto outra esboçou a personagem nadando.
— Quando escrevi a primeira versão do livro, era só para falar mal de tecnologia. Uma pessoa mais velha querendo dar lição de moral (risos) — reflete Lázaro. — Esses desenhos deles me levaram à consciência de que não dá para ficar só julgando e eliminando a tecnologia da vida das crianças. Quando recebi a devolutiva das crianças, elas me lembraram que eu tinha que falar sobre equilíbrio.
Próximos projetos
Depois de abordar o universo infantil em seis obras, Lázaro prepara um livro para adolescentes intitulado Você não É Invencível, que está sendo editado pela Companhia das Letras. Ainda está nos planos uma obra de não ficção para o público adulto, sobre a qual o autor evita dar detalhes. Já pelo lado audiovisual, ele irá lançar o filme Medida Provisória no segundo semestre, o qual dirigiu.