Ano após ano, de 2014 a 2018, o mercado editorial registrou desempenho negativo. Crise macroeconômica, crise de gestão nas grandes varejistas, calotes, ausência de um grande best-seller.
Mas 2019 foi um ano bom, de crescimento surpreendente até — de 6,1%. O ano de 2020 teria seguido essa tendência, acredita Marcos da Veiga Pereira, presidente do Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel), mas então surgiu o coronavírus. As livrarias foram fechadas, lançamentos foram suspensos, o brasileiro viu seu salário ser reduzido, muitos perderam o emprego, ficamos mais em casa.
Em 2020, o mercado editorial encolheu outros 8,8% (de 2006 a 2019, a queda somada foi de 20%), segundo a Pesquisa Produção e Vendas do Setor Editorial. O desempenho das editoras no primeiro ano da pandemia, apurado pela Nielsen com base em informações fornecidas por elas, foi revelado na manhã desta terça-feira (25), pela Câmara Brasileira do Livro (CBL) e Snel.
Como esperado, foram publicados e vendidos menos livros no ano passado. Em termos gerais, foram impressos 314 milhões de exemplares (82% em reimpressão e 18% de novos títulos), uma redução de 20,5% na tiragem total. E editados 46 mil títulos (76%, 35.087, referem-se a reimpressões e 24%, 11.295, a novas obras) — uma queda geral de 17,4% nos lançamentos de novos livros.
No total, foram vendidos 354 milhões de exemplares e as editoras faturaram R$ 5,2 bilhões (cerca de R$ 3,7 bilhões em vendas para o mercado e R$ 1,4 bilhão para o governo).
Há alguns motivos para esse desempenho. Um deles é a desaceleração nos três primeiros meses da pandemia, quando ninguém sabia o que ia acontecer no mundo e tudo ficou em suspensão. Outro: o enfraquecimento das livrarias como pontos de venda e exposição — algo que já vinha acontecendo, mas que se acentuou agora. Em 2018, ela era responsável por 50,5% do faturamento das editoras. Em 2019, por 41,6%. Em 2020, por 30%.
Na contramão, as livrarias exclusivamente virtuais, como a Amazon, dobraram sua participação — de 12,7% em 2019 para 24,8% agora. Elas foram responsáveis por 84% do faturamento das editoras e venderam 53 milhões de exemplares. A venda em escolas também cresceu de 5,9% para 9,1%. E em market places, de 5,2% para 8,1%.
Outro dado interessante: os clubes de assinatura de livros aumentaram em 174% sua participação no faturamento das editoras. O valor ainda é baixo, R$ 36 milhões, e muito baixo se comparado com outros canais de distribuição, como as livrarias virtuais (R$ 932 milhões), mas é um formato de venda que vem conquistando leitores e mobilizando editoras e livrarias.
— E ele vem registrando um crescimento sequencial e constante, por isso vale o destaque — comenta Mariana Bueno, consultora da Nielsen.
Por falar em leitura, o subsetor de obras gerais foi o que teve melhor desempenho, e com números positivos (aumento nominal de 3,8%), no ano passado, quando analisamos apenas as vendas ao mercado. Foram produzidos 21.599 títulos e impressos 80,581 milhões de exemplares. E foram vendidos, também apenas para o mercado, 88,081 milhões de exemplares (1,1% a menos do que em 2019).
Quando colocamos as vendas para o governo na conta, os números caem drasticamente. Mas é preciso lembrar que essas compras são sazonais, e em 2020 não houve compras para o PNLD Literário, o que melhoraria muito esses números.
Esses livros de obras gerais foram, em sua maioria, vendidos por livrarias exclusivamente virtuais (38,5% ante 12,9% no ano anterior), livrarias (29,8% ante 57,7%), distribuidoras (10,7% contra 13,2%), clube do livro (4,1% contra 1,1%), supermercado (2,8% contra 3,5%) e outros (14,1% ante 11,3%). Isso em exemplares vendidos.
— A leitura de obras gerais cresceu. Temos visto isso no mundo inteiro, e esse crescimento entrou em 2021. As pessoas redescobriram os livros, reconectaram-se com eles — comenta Marcos da Veiga Pereira, que também é dono da Sextante. — A pandemia fez as pessoas ficarem em casa e elas voltaram a procurar o livro como forma de entretenimento, conhecimento e reflexão.
Para o editor, o canal online foi muito eficiente nesse atendimento. Ao contrário das livrarias físicas, "que passaram muito tempo passivas esperando que o consumidor fosse lá comprar os livros, o varejo online bate na sua porta, chega no seu e-mail, três vezes por semana, ou mais."
O pior setor em 2020 foi o de livros religiosos.
— Não imaginei que teria uma queda de R$ 90 milhões, que é um pedaço grande da queda do mercado como um todo. Analisando, vemos que isso é quase totalmente vinculado ao segmento porta a porta, que requer contato pessoal e a pandemia trouxe exatamente o distanciamento social — comenta Pereira.
O porta a porta vai cair ainda mais neste ano, com a Avon deixando de vender livros. Os didáticos também não foram bem no ano passado, e o setor apresentou queda de 11% nas vendas para o mercado e, em termos reais, essa redução é de 15%. CTP (Científico, Técnico e Profissional) continua em queda de produção e venda.
Para Vitor Tavares, presidente da Câmara Brasileira do Livro, uma ameaça ao setor é a possível taxação do livro, que é isento e na nova reforma tributária poderia deixar de ser.
— O mercado vai sentir muito — diz.
O livro vai ficar mais caro, as vendas vão cair, a crise vai perdurar. Outro desafio, na opinião de Pereira, é o que a indústria do livro vai fazer quando as pessoas se sentirem mais seguras para voltar a sair.
— Como vamos manter a leitura em alta? — questiona.