A divulgação de um documento da Receita Federal que sugere a retirada da isenção tributária de livros sob o argumento de que eles seriam consumidos majoritariamente pela faixa mais rica da população tem causado reações em diversos setores da sociedade, especialmente entre editores.
Em entrevista ao Gaúcha Atualidade desta segunda-feira (12), o cofundador e editor da L&PM, Ivan Pinheiro Machado, disse que os dados apresentados pelo documento, baseados na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2019 do IBGE, não são críveis.
— Esta é mais uma insana tentativa de derrubar o livro no Brasil. Isso (o documento) é baseado numa pesquisa de nenhuma credibilidade. Na verdade, o que se tem de dado crível é uma superpesquisa que foi feita na última Bienal de São Paulo, que envolveu mais de 600 mil pessoas, que constatou que 68% delas eram classe C, D e E, e 97% se declaravam leitores.
De acordo com o editor, as conclusões da Receita vão de encontro ao esforço internacional de facilitar o acesso ao livro.
— O livro é uma ferramenta básica para a educação, para a compreensão da cidadania e de mobilidade social. É a maneira que a pessoa tem de evoluir socialmente — pontua Pinheiro Machado. — Todos os grandes países subsidiam a cultura e os livros, especialmente. Acontece que o Brasil não tem uma política cultural. O que a gente vê agora é o seguinte: quem tá fazendo a política cultural é a Receita Federal.
No país, o livro é um produto isento de impostos desde a Constituição de 1946, proteção que foi mantida pela atual carta, de 1988. Em 2004, o mercado editorial foi desonerado também do PIS e Cofins, que, pela proposta do governo, seria substituído pela Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), que tornaria os livros sujeitos à tributação mais uma vez, sob alíquota de 12%.
Pinheiro Machado ainda ressalta que a cadeia de produção do livro paga impostos.
— A cadeia produtiva do livro começa no reflorestamento, quando é produzido o pinheiro, a celulose, o papel, que vai pra gráfica. Outra etapa começa quando o escritor, lá atrás, começa a escrever, o texto vai para a editora, tem dezenas de profissionais que trabalham nisso, enfim... E todo mundo tá lá, descontando seu imposto na fonte. Quer dizer, se não tá pagando PIS/Cofins, está pagando todo o resto da montanha de impostos que se paga no Brasil. Por isso é uma falácia dizer que livro não paga imposto no Brasil.
O editor cita um cálculo da Câmara de Livros do Brasil (CLB) que afirmou que, depois de 2004, o preço do livro baixou mais de 40%.
— O mercado tá passando por uma crise, além da pandemia e da recuperação judicial das grandes cadeias de livros. O editor, ao contrario do que pensa a Receita Federal, tá sempre procurando o livro mais barato, porque é o que mais vende — finaliza.