No ano passado, uma intensa mobilização de editores, escritores e leitores promoveu a ideia de dar livros como presente de final de ano. O movimento tinha como grande motivação aquecer um mercado que acabava de sofrer um grande baque, com a entrada de duas gigantes do mercado livreiro em recuperação judicial – as redes Saraiva e Cultura.
Hoje, um ano depois, o escritor Reginaldo Pujol Filho lamentou que a campanha não se repetiu, mas não ficou parado – por e-mail, convidou centenas de amigos e leitores a visitar livrarias de Porto Alegre para as compras de Natal.
Pujol explica que sua maior preocupação é com os pequenos livreiros:
— Quando a Palavraria fechou, me dei conta de que eu não era tão coerente quanto dizia ser em relação ao meu consumo de livros. Quando via alguma facilidade, me jogava em compras pela internet. Foi então que percebi que era preciso fazer algo para ter um mundo com mais livrarias, pois não são apenas lojas com livros, mas centros cívicos em que pessoas apaixonadas pela leitura se encontram.
O escritor também chama atenção para o fato de que, na região central de Porto Alegre, há um circuito de pequenas livrarias em que é possível visitar quatro lojas em menos de dois quilômetros.
— Muitas vezes a gente se olha com preconceitos e críticas, mas esquecemos que Porto Alegre é uma cidade espetacular em termos de livrarias.
Leia íntegra a mensagem de Reginaldo Pujol Filho:
Amigas e amigos,
se estão recebendo essa mensagem é porque são pessoas que considero que têm sensibilidade para as coisas dos livros. E é por isso que tomo a liberdade de escrever para vocês. Talvez tenha gente que já antecipou as compras de Natal, e aí tudo bem. Mas acredito que muita gente ainda não fez isso. E é com vocês que quero falar.
Ano passado, nessa mesma época, as redes sociais estavam em chamas fazendo campanhas mil para que déssemos livros de Natal, lembram? Foi um movimento bonito, muito motivado pelos calotes da Saraiva e da Cultura, que deixaram editoras, distribuidores e, por consequências, escritores, capistas, revisores, preparadores de originais, diagramadores, em situação muito complexa. A quase falência de duas grandes redes de livrarias mexeu com todo mundo, e a reação foi demais.
Porém, um ano depois, sem notícias de falência de Saraiva e Cultura nos jornais, onde foi parar aquela mobilização? Acredito que ela é hoje ainda mais importante do que no ano passado. Mas num sentido um pouco diferente. É urgente comprar livros em livrarias independentes nesse Natal. Na esteira da crise das grandes livrarias, o mercado, a seu modo, se reorganizou. Um dos principais fenômenos foi o investimento das editoras (grandes e pequenas) nas vendas diretas, com descontos grandes (justamente o valor que ficaria com livraria e com distribuidor). Num mercado que opera por consignação, as pequenas livrarias – aquelas que gostamos de visitar, de tomar um café, etc. – não tem a menor chance de competir. Também se passou a evitar fazer lançamento em livraria, para a editora ficar com todo o lucro da noite. E a Amazon segue praticando dumping (se duvidam, leiam esse relato: https://www.editoraelefante.com.br/amazon-destroi/). Não é de se estranhar que, em menos uma década, as livrarias tenham desaparecido do Brasil (viram, essa notícia? https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2019/12/apenas-177-das-cidades-brasileiras-tem-livrarias-aponta-estudo-do-ibge.shtml). Em 2011, 42% dos municípios brasileiros, tinham ao menos uma livraria. Hoje, são 17%.
Talvez não enxerguemos essa realidade porque, acreditem, vivemos numa cidade privilegiada. A cidade da livraria do Globo (que já fechou), da Palavraria (que já fechou), da Sapere Audi (que já fechou). Mas outras nasceram ou resistiram a esses tempos trituradores das livrarias (que, para mim, são as igrejas da nossa religião, os livros). Só que, se as pessoas não forem até as livrarias (ou ao menos ligarem para elas e pedirem para um motoboy entregar alguns livros; sim, elas fazem isso) mais livrarias vão fechar. E estou falando isso da posição de alguém que frequenta livrarias, que dá cursos e palestras em livrarias, que conversa com livreiros sobre a situação.
A livraria local, independente, é uma mola fundamental para a cena literária. É a livraria que não tem medo de colocar o autor local, a editora pequena na vitrine. E o espaço em que o livreiro te recomenda um livro porque pode te interessar e não “porque está saindo muito”, ou porque “pessoas que compraram isso, também compraram aquilo”. A pequena livraria, a passos de formiguinha, ajuda a estimular a bibliodiversidade, fazer com que mais e diferentes livros circulem. Furar a bolha dos mais vendidos.
Então, amigos e amigas, venho pedir um presente de Natal para vocês: uma cidade que, em 2020, continuará com suas pequenas e bravas livrarias abertas, vivas e pulsantes.
Recomendo vivamente que aproveitem o final de semana e passem na Livraria Taverna (https://goo.gl/maps/HTchkcfBp56yeDAx9). André, Eder e William têm o maior prazer em ficar escolhendo presentes com vocês. E fazem lindos pacotes. E ainda dá para tomar um café ou uma cervejinha enquanto escolhem os presentes. E, pensem bem, às vezes dizemos: nesse ano vou dar só lembrancinha de 15 reais, 20 reais. Está cheio de pocket book com esse valor. Não é bem melhor dar uma lembrancinha chamada livro, do que um badulaque made in trabalho escravo? Passem na Taverna, os guris estão precisando.
Mas, caso não queiram ir na Taverna, ou não encontrem lá o livro procurado, saibam que, num raio de 2km, temos uma verdadeira rota dos livros. Baleia e Padula estão na mesma Fernando Machado. E na Lima e Silva, continuação da Fernando Machado, está a Bamboletras. Temos uma rota das livrarias e não sabemos. É bem melhor caminhar nessa rota, do que correr no shopping, não acham?
Desculpem o longo texto, mas achava importante demais dividir isso com vocês.
Obrigado pela paciência e, quem sabe, nos vemos numa livraria nesse final de semana.
Beijos e abraços.
Ah, sim, que tal compartilhar nas redes uma foto dos livros de Natal com a hashtag #VemPraLivraria ?