Autor que começou como romancista policial até refinar uma combinação toda própria de trama de crime com crônica social, o escritor cubano Leonardo Padura estará em Porto Alegre nesta segunda-feira para falar de livros. Ele participa, às 19h, no Teatro Renascença do Centro Municipal de Cultura (Avenida Erico Verissimo, 307), de um bate-papo com o professor Sergius Gonzaga e com o diretor do Instituto Cervantes, José Vicente Ballester.
O encontro é uma edição especial, promovida em parceria do Instituto Cervantes com a Coordenação de Literatura e Humanidades da Secretaria Municipal de Cultura, do projeto Os Livros de Nossa Vida. Padura vai debater as obras que o formaram como escritor. A lotação está esgotada. Após o encontro, às 20h, ele vai realizar uma sessão de autógrafos.
Padura alcançou reconhecimento nos anos 1990 com a “tetralogia de Havana”, primeira série de livros estrelada pelo policial cubano Mario Conde. E se tornou bestseller com o romance de 2009 O Homem que Amava os Cachorros.
Leonardo Padura passou a última semana em compromissos no Brasil. Esteve em Salvador para a edição local do Fronteiras do Pensamento e autografou em São Paulo. Em sua passagem por Porto Alegre, vai falar sobre os livros que o formaram como leitor, além de lançar seu romance mais recente, A Transparência do Tempo. Por telefone, ele conversou com Zero Hora.
O senhor vem a Porto Alegre para falar dos livros de sua vida? Qual obra despertou sua vontade de ser escritor?
Não poderia apontar um em específico. Mas me recordo de que, na adolescência, li O Conde de Monte Cristo, de Dumas, e foi para mim uma revelação do poder da literatura. Em meus anos de juventude, li de maneira desorganizada e não li muito, na verdade. O que eu gostava era de jogar beisebol. Isso só mudou depois que entrei para a universidade. Sempre digo que, na universidade, tive de fazer duas carreiras, a acadêmica e a de leitor. Foi aí que descobri dois universos literários que se tornaram fundamentais para mim: o romance americano do século 20 e o romance hispano-americano da segunda metade do século 20. Autores como Hemingway, John dos Passos, William Faulkner, John Updike, J.D. Salinger no primeiro grupo e García Márquez, Vargas Llosa, Juán Rulfo, Alejo Carpentier no segundo, a lista é longa. Mais tarde, foi importante para mim a descoberta de Manuel Vásquez Montalbán. Ele fazia uma literatura policial em língua espanhola que, de algum modo, me deu a pauta do tipo de romance que eu poderia tentar escrever.
Qual dos seus próprios livros teve maior papel em sua vida?
Cada um dos meus livros foi o melhor que fui capaz de escrever naquele momento, e cada um teve seus momentos. Os primeiros da série de Mario Conde me abriram muitas portas. Há também O Romance da Minha Vida, que é de 2002 e sairá este ano no Brasil pela Boitempo. É uma obra ambiciosa na qual arrisquei mudar minha narrativa e incluir elementos históricos. Usei vários planos temporais, vários protagonistas. Foi um romance que, para mim, foi importante ter escrito. E, finalmente, há O Homem que Amava os Cachorros, que saiu em 2009 na Espanha e depois em vários países, inclusive no Brasil. É o livro que me deu maior visibilidade internacional. Em Salvador, na sessão de autógrafos após minha conferência (no Fronteiras do Pensamento na capital baiana), foi o título que mais assinei.
Georges Simenon dizia que seu personagem Comissário Maigret havia sido um instrumento útil porque podia, como policial, conversar com todo mundo em todo tipo de ambiente. Seu detetive Mario Conde começou como policial, mas deixou a corporação. O que ele facilita para o senhor?
Quando comecei a escrever os romances com o personagem de Conde, precisava que ele fosse um policial porque não era verossímil ou lógico que, em Cuba, alguém investigasse um crime de sangue por conta própria. O próprio desenvolvimento do personagem me levou a fazê-lo deixar a polícia. Pensei que o havia largado para sempre. Mas voltei a ele em Adeus Hemingway, La Neblina del Ayer, Hereges e A Transparência do Tempo. Ele está fora da polícia e, por isso, não tem a mesma facilidade para coletar informações. Mas, como tem a obsessão por encontrar a verdade, eu o uso na busca de determinadas verdades.
É uma espécie de alter ego?
Tenho uma relação muito especial com esse personagem, ele me acompanha há quase 30 anos e é um homem da minha geração, com experiências de vida semelhantes às minhas. Estudou na mesma escola, tem a mesma paixão pelo beisebol. Essa proximidade com o personagem me serve para, por meio de seus olhos e de sua inteligência, lançar um olhar e às vezes até um juízo da realidade cubana. Ele me permite fazer uma espécie de crônica do que tem sido a vida em Cuba nos últimos anos da perspectiva de uma pessoa da minha geração.