Muitas vezes, é mais fácil compartilhar um problema com um desconhecido do que para a própria mãe. As inconsistências das relações familiares, que se alavancaram durante a pandemia, ganham um viés profundo em A Mãe da Mãe da Menina, novo espetáculo virtual do Projeto GOMPA. Com três grandes atrizes gaúchas, a produção tem exibições no canal do YouTube do grupo de quarta a domingo, até o dia 7 de novembro, às 20h. Os ingressos custam R$ 10 e podem ser adquiridos pelo site Canal Entreatos.
Em 71 minutos de duração, o espetáculo traduz dilemas de três gerações de uma mesma família com os depoimentos da avó, Ruth (Sandra Dani), da mãe, Marta (Liane Venturella), e da filha, Júlia (Laura Hickmann). É uma sessão descarrego. O trio fala sobre o envelhecimento, a dificuldade de expressar o amor e o quanto o não-dito atravessa as relações de uma com a outra.
Para chegar à versão final, o grupo teatral coletou depoimentos de 18 mulheres e fez o trio de atrizes imergir no assunto, fazendo um cruzamento de suas percepções pessoais com o material obtido. O roteiro-base surgiu do improviso das atrizes, seguindo a trajetória de vida das personagens construída em conjunto. Em algumas cenas, elas respiram fundo e demoram para iniciar seus depoimentos.
— É instigante vê-las falando para a câmera, como se fizessem uma confissão, um jogo de segredo com o espectador. São coisas que elas não têm como falar uma para a outra e quem assiste acaba juntando as peças para entender as reações — acredita a diretora Camila Bauer.
Foram nove meses de trabalho, entre entrevistas, ensaios e a realização das mais de 40 horas de gravação. Esta peça dá continuidade ao projeto A Avó da Chapeuzinho, contemplado em um edital do Movimento Pró-Cultura/SEDAC RS, que já estreou o primeiro espetáculo em 2020, A Vó da Menina, focado na relação entre a avó e a neta. O grande volume de material produzido renderá ainda o curta-metragem Três Tempos, dirigido por Lucas Tergolina, com finalização prevista para dezembro.
— Foi tudo gravado em apenas um take, e isso é o que torna o projeto ainda mais especial. É orgânico, com uma naturalidade peculiar que vai tocar quem assiste, de uma forma que só o audiovisual permite, muito além do palco e do teatro — compara Camila.
Uma das discussões mais evidentes de A Mãe da Mãe da Menina é a presença do idoso na sociedade. Em uma das cenas, a avó Ruth revela ter medo da morte e pensa sobre a sensação de solidão. Segundo Camila, muitas vezes as pessoas pensam em rótulos sociais (como avó, mãe e filha) e se esquecem de que estamos falando de pessoas de carne e osso:
— Mostramos como falta empatia nas nossas relações dentro de casa. E é muito comum, nas famílias, algum membro acabar se dedicando com mais atenção aos mais velhos. Como fica a vida dessa pessoa?