Em conversa com o público ao final da sessão de estreia do solo História do Futuro, que esteve em cartaz no Teatro da Santa Casa na semana passada, em Porto Alegre, o ator Caco Coelho garantiu não ter modificado quase nada do livro homônimo do padre Antônio Vieira (1608-1697) adaptado no espetáculo. Quem assiste percebe um paralelo surpreendente com a atualidade brasileira.
Conhecido por seu trabalho como diretor teatral, Coelho desta vez se expõe sozinho em cena para dar voz a uma persona — que pode ou não ser o próprio Padre Vieira — falando de uma profecia sobre um país repleto de riquezas, mas com uma população terrível, onde grassa a corrupção e a violência.
Coelho pôde ser visto em 2017 na peça Desassossegos, em que contracenou com Gisela Sparremberger e Antonio Czamanski para imaginar um encontro entre Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro e António Botto. Mas é em História do Futuro que revela por completo o domínio da cena, dirigido por Eduardo Severino e supervisionado por Vera Holtz. Desgarrado de um espaço-tempo misterioso, seu personagem dialoga com a voz de um profeta (vivido por Lima Duarte, em participação luxuosa gravada em vídeo) para dizer verdades que precisamos ouvir. Com poucos objetos, a cenografia é baseada em projeções mapeadas que preenchem o fundo do palco, inventando ambientações as mais insuspeitadas e de forte impacto estético.
Especialista na obra de Nelson Rodrigues, o mais brasileiro dos dramaturgos, Coelho faz aqui um mergulho vertiginoso e verborrágico nas raízes mais profundas da nação. Evoca as promessas não cumpridas do país do futuro e desvela os impasses que o tragam para um buraco moral, mas termina com uma nota de esperança: para que alguma coisa aconteça, é preciso agir rápido. História do Futuro é, antes de tudo, um diagnóstico do presente.
Ainda não há previsão de volta a cartaz, mas a produção projeta um retorno para este ano.
Veja alguns espetáculos em cartaz nesta semana:
De volta aos Dancin' Days
Depois de ser apresentado em Porto Alegre na semana passada, o musical O Frenético Dancin’ Days chega a Novo Hamburgo para sessões nesta quarta (24) e quinta (25), às 21h, no Teatro Feevale (ERS-239, nº 2.755, no Campus II da Feevale). Os ingressos custam entre R$ 50 e R$ 160 no site uhuu.com.
Ao ritmo da disco music, o espetáculo dirigido por Deborah Colker mistura realidade e fantasia para contar a história de uma boate que funcionou durante apenas quatro meses no Rio, em 1976, e ficou marcada como um sopro de liberdade em meio à ditadura militar. Foi lá onde surgiu o grupo As Frenéticas, formado por atrizes que trabalhavam como garçonetes. Um dos sócios da casa era Nelson Motta, que assina o roteiro com Patrícia Andrade.
A dança do Grupelho
O Coletivo Grupelho surgiu em 2016 com profissionais de diversas áreas que passaram pelo Grupo Experimental de Dança: Bruna Chiesa, Bruno Cunha, Débora Poitevin, Janaína Ferrari e Roberta Fofonka. Esse é o elenco do experimento cênico de dança contemporânea Tiger Balm, que tem sessão única nesta quarta (24), às 20h30min, na Sala Álvaro Moreyra (Av. Erico Verissimo, 307), em Porto Alegre, com ingressos a R$ 30. Dirigido coletivamente, o trabalho parte de movimentos envolvendo quedas, variações de velocidade e empilhamento.
Sonho de espetáculo
Representante da nova dramaturgia gaúcha, Julia Kieling escreve e dirige a peça Sedimentos, em que atua ao lado de Pedro Shilling. Estreado em 2017, o espetáculo tem sessões de sexta (26) a domingo (28), às 20h, na Sala Carlos Carvalho da Casa de Cultura Mario Quintana (Rua dos Andradas, 736), em Porto Alegre, com ingressos a R$ 40.
Em cena, os atores vivem dois personagens que estão presos em um espetáculo e aguardam a chegada de um terceiro para resgatá-los, aludindo a Esperando Godot, de Beckett. Com cenografia que reflete um estado onírico, o trabalho questiona nossa forma de conhecer o mundo em que vivemos, a razão pela qual apreciamos espetáculos e a natureza dos sonhos.