Por não se considerar uma "pessoa da palavra", a diretora Bia Lessa chamou diversos autores para ajudarem na adaptação para o teatro de Grande Sertão: Veredas, a obra-prima de 1956 de Guimarães Rosa. Mas nenhum aceitou, tamanha a dimensão do livro. Bia se viu em um impasse, que. ao final, a conduziu por um novo entendimento sobre o trabalho. Decidiu então levar o romance à cena tal como é – não na íntegra de suas 500 páginas, mas por meio de uma seleção de trechos.
Assim nasceu, em 2017, o espetáculo-instalação Grande Sertão: Veredas, que será apresentado neste sábado (15) e domingo (16) no Teatro do Sesi, dentro da programação do 25º Porto Alegre Em Cena. O trabalho tem recebido elogios por onde tem sido exibido e já amealhou o Prêmio Shell de Teatro de São Paulo pela direção de Bia e pela atuação de Caio Blat, que interpreta Riobaldo, jagunço que narra sua saga pelo sertão e reflete sobre as coisas da vida. Ele acabará apaixonado por Diadorim, um homem que guarda um segredo sobre sua identidade (papel de Luiza Lemmertz, filha de Julia Lemmertz, que por sua vez esteve em cartaz no Em Cena na peça A Tragédia e Comédia Latino-americana).
O conceito de espetáculo-instalação partiu do próprio livro de Guimarães Rosa, que começa como se já estivesse no meio da ação e termina com o símbolo de infinito. Essa fusão entre teatro e artes visuais também diz respeito a duas áreas de atuação da diretora, como ela conta:
– Não queria fazer um trabalho que fosse de teatro ou de artes plásticas, mas uma coisa emaranhada na outra. Hoje, todos nós somos muitas coisas ao mesmo tempo, temos múltiplas funções sociais. Não cabe mais o pensamento de que "isso é teatro" ou "isso é arte".
Desde o início do processo, Bia tinha claro um pensamento para superar a paralisia sofrida pelos autores que se recusaram a adaptar a obra. Ela estava menos preocupada com o espetáculo que Guimarães Rosa faria do que com o que seria revelado na sala de ensaio a partir dos profissionais envolvidos com o projeto. Não procurou reproduzir imagens do sertão no teatro, mas "evocações", levando a sério o célebre trecho segundo o qual o sertão "é dentro da gente".
– É um livro que fala da formação do homem. Nós, seres humanos, criamos um mundo torto, que não nos serve, com valores equivocados, no qual o que importa é o dinheiro. Temos uma justiça que não é justa, um sistema de saúde que não é para curar. É como se o livro questionasse: "E aí, o que fazemos agora?".
Para as sessões em Porto Alegre, haverá lugares para o público no palco, ao redor do cenário (com ingressos esgotados), e também na plateia e no mezanino. Os espectadores do palco ouvirão as falas e a trilha sonora de Egberto Gismonti por meio de fones de ouvido, enquanto os demais terão o áudio do teatro. São experiências diferentes, mas Bia garante que nenhuma é melhor do que a outra, pois as duas mixagens foram trabalhadas em suas particularidades para alcançar o máximo efeito expressivo.
Para a diretora, Grande Sertão: Veredas não deve ser encarada como uma obra regional, mas que poderia se passar em qualquer lugar do mundo:
– A cada leitura se descobre novos aspectos. Até porque você já é outra pessoa em relação à primeira vez. Os estudiosos enxergam de formas diferentes, assim como os atores. É a grandiosidade da obra.
GRANDE SERTÃO: VEREDAS
Sábado (15), às 20h, e domingo (16), às 18h.
Teatro do Sesi (Av. Assis Brasil, 8.787), em Porto Alegre.
Ingressos a R$ 30 (mezanino) e R$ 80 (plateia baixa e alta), à venda em uhuu.com/poa-em-cena e na bilheteria do Em Cena no BarraShoppingSul.