Em meados dos anos 1970, foi encontrado em uma caverna do Egito um códice perdido por 1.700 anos que contava a história de Jesus de uma perspectiva diferente dos quatro Evangelhos canônicos. Apresentado em copta, uma antiga língua egípcia, mas traduzido do grego, o documento que veio a ser conhecido como o Evangelho de Judas retratava o apóstolo não como traidor, e sim como o mais fiel seguidor de Jesus. Nesta versão, Judas entrega-o para ser crucificado a pedido do próprio Filho do Homem para se libertar da carne e retornar à casa celestial.
Os fragmentos do documento começaram a ser estudados por pesquisadores apenas a partir de 2001, depois que o papiro de 66 páginas foi adquirido pela National Geographic Society, em um trabalho que contou com parceria da Maecenas Foundation e do Waitt Institute for Historical Discovery – não sem alguma controvérsia da parte de quem considerou o comércio da relíquia um "contrabando de antiguidade". Em 2006, a edição em inglês entrou para a lista de livros mais vendidos de não ficção do New York Times.
Agora, o ator Carlos Vereza, de longa trajetória nos palcos, na televisão e no cinema, apresenta em Porto Alegre um "oratório livremente inspirado" no Evangelho de Judas. Com o título Iscariotes. A Outra Face, a peça terá sessões neste sábado (30/9), às 21h, e domingo (1º/10), às 18h, no Theatro São Pedro (Praça Marechal Deodoro, s/nº), com ingressos de R$ 40 a R$ 100. Assinando a dramaturgia e a direção deste solo, Vereza explica, em entrevista por e-mail, que não entende o Evangelho de Judas como a versão definitiva da história. Para ele, trata-se de mais um documento que pode ajudar a entender o contexto da história:
O que incentivou o senhor a criar um espetáculo inspirado no Evangelho de Judas?
Entre outras motivações, o gritante fato deste apóstolo, sem o qual não existiria o cristianismo, ser sempre descrito como a caricatura do mal absoluto, sem que suas possíveis razões fossem sequer levadas em conta.
O Evangelho de Judas apresenta uma visão diferente da história em relação à que conhecemos. Como o senhor acredita que deve ser encarado este documento?
Creio que ele pode ser somado às versões dos quatro Evangelhos canônicos.
Além da revelação de que Judas foi o mais fiel seguidor de Jesus, que outras revelações do Evangelho de Judas aparecem na peça?
O Evangelho de Judas Iscariotes é ligado à filosofia gnose, na qual a salvação não estaria dependendo de uma força exterior, e sim que cada pessoa encontre em si mesma, no seu Cristo interno, sua libertação de um mundo que teria sido criado não por um Deus amoroso e bom, mas por um demiurgo, um deus vingativo e cruel. Por meio de projeções, tento mostrar algumas das traições a Jesus ao longo da história.
O senhor tem uma longa trajetória na TV, no cinema e no teatro. Que temas mais lhe interessam para tratar na arte hoje?
Não tenho um tema específico. Me move a aventura humana, em todos os seus aspectos.
O senhor fez teatro durante a ditadura militar, quando a arte era censurada, e o pensamento crítico, reprimido. Como o senhor vê a ideia, levantada por alguns, de uma nova intervenção?
A única via possível é por meio da democracia. Por meio do voto, e não do autoritarismo.
O senhor poderia comentar quais são seus próximos projetos?
Escrevi recentemente outro texto, O Trampo, que pretendo dirigir como longa-metragem.
ISCARIOTES. A OUTRA FACE
Neste sábado (30/9), às 21h, e domingo (1º/10), às 18h.
Theatro São Pedro (Praça Marechal Deodoro, s/nº), em Porto Alegre;
Ingressos: R$ 40 (galeria), R$ 60 (camarote lateral), R$ 80 (camarote central) e R$ 100 (plateia e cadeiras extras). À venda na bilheteria do teatro nesta sexta, das 13h às 18h30min, e sábado e domingo, das 15h até a hora da sessão.