Seria clichê começar esta reportagem dizendo que ir ao cinema, depois de sete meses e com uma pandemia em curso, dá nostalgia. Ou então que a sétima arte, mesmo diante de mais de 150 mil mortos por coronavírus em todo o país, revigora o sentido da vida. No entanto, a sensação de revisitar o escurinho do cinema depois de tanto tempo foi bem diferente.
Primeiramente, como sabemos, é obrigatório o uso de máscaras em todos os ambientes — ela só pode ser retirada no assento, na hora de comer a pipoca. Não é algo confortável, convenhamos, porém necessário.
Ao chegar no hall do GNC Cinemas, às 13h, este repórter achou que teria um dia calmo, assistindo ao longa Os Novos Mutantes, grande estreia da semana. Após chegar ao local, completamente vazio se não fossem os funcionários com seus EPIs, a sensação era de estar em um deserto. Nem as bolas de feno tão tradicionais para relatar uma situação de plena calmaria em filmes estavam ali.
Ninguém na fila. Fui direto ao caixa comprar um ingresso. Antes do balcão, uma área estava isolada entre eu e a atendente, com aquelas faixas utilizadas para organizar filas. Assim, estávamos distantes um do outro.
Escolhi pela tela do computador um lugar no meio da sala, mais ao fundo. Apenas outras duas pessoas tinham adquirido o ingresso antes de mim, com poltronas em cinza marcando onde estavam sentados e outros sinais de proibido ao redor deles mostrando os bloqueados, para assegurar o distanciamento mínimo. Até fiquei feliz: nas últimas vezes em que tinha ido ao cinema, antes da pandemia, foi para assistir a blockbusters, com salas lotadas. Então, me senti um rei ao saber que teria quase todo espaço só para mim.
Paguei com cartão, e a máquina de validação estava no balcão com plástico isolante. Digitei a senha e, logo sem seguida, já limpei minhas mãos com álcool gel, com um tubo disponível ao lado do equipamento. A atendente imprimiu a entrada, entregou o papel e também higienizou as mãos com o líquido.
Sem conferir o ticket, coloquei-o no bolso e fui para a bomboniére, também sem filas. Assim como na bilheteria, o local para compra de alimentos e bebidas também tem adesivos no chão para orientar o espectador na fila, e a área ao redor do balcão tem faixas isolantes, a fim de manter o distanciamento mínimo de dois metros. Pedi uma pipoca pequena e um refrigerante médio — afinal, não existe cinema sem pipoca, não é mesmo?
Novamente, paguei com cartão, com o mesmo padrão do guichê pelo qual passei anteriormente: plástico ao redor da máquina e álcool gel disponível ao lado. Então, veio a surpresa: a pipoca foi colocada dentro de um saco de papelão, "para a viagem". O decreto municipal, divulgado na segunda-feira (19), deixa claro que o produto só pode ser consumido na poltrona, dentro da sala.
Ansiedade na sala
Com o saco de papelão e o copo de refrigerante em mãos, passei pela checagem do ingresso. A atendente olhou rapidamente meu ticket e o marcou com um furador.
Ingressei na sala seis do GNC Cinemas faltando três minutos para o início da sessão, marcada para as 13h45min. Outras cinco pessoas estavam sentadas ali dentro, bem afastadas umas das outras, com a exceção de Alex de Moraes e a filha Júlia, que eu tinha entrevistado anteriormente no hall.
Foi quando a adrenalina começou a correr pelas minhas veias: eu tinha um ingresso para a poltrona J12 e, ao subir as escadas, percebi que eles estavam na mesma fileira, sentados muito próximos do assento que escolhi.
— Quais são os lugares de vocês? — questione.
Júlia, então, pegou os papeizinhos e verificou: assentos J13 e J14. Algo estava errado, pois o GNC, em entrevistas que realizei nesta semana, destacou que o bloqueio das poltronas ao redor do espectador seria automático, sendo duas poltronas para cada um dos lados, duas atrás e mais duas na frente.
Como prezava pelo distanciamento, subi três fileiras e sentei no assento que não tinha comprado originalmente. Iria questionar a gerência depois, porque não estava acreditando no erro. Sentei e comecei a sentir uma vontade imensa de chorar. Além da tensão pelo lugar “errado”, pela primeira vez a ansiedade me tomou porque iria retirar a máscara em um ambiente completamente fechado, bem distante da minha casa, para comer a pipoca.
Ansioso do jeito que estava, é claro que acabei com o pacote inteiro quando recém tinham começado os letreiros iniciais de Os Novos Mutantes. Foram apenas 13 minutos entre o início da exibição e o começo do filme.
O pacote de papelão, no fim, foi ótimo para guardar o pote de pipoca vazio e os guardanapos utilizados para limpar as mãos. Uma das coisas que mais me incomodavam, antes da pandemia, era o que fazer com esses produtos durante o filme. Agora, fica tudo no mesmo lugar.
Banheiro e erro explicado
Após assistir ao longa, precisei ir ao banheiro. Nos toaletes, o distanciamento também foi seguido à risca: as cabines, os mictórios e as pias estavam com bloqueios alternados, com uma sinalização enorme. Assim como dizia o decreto, o dispenser para limpeza das mãos também era de toalhas de papel não reciclado.
Ao sair dali, procurei a gerência para verificar o problema com o bloqueio de assentos e, finalmente, a ansiedade e aquela “choradeira interna” pararam. A gerente do local, Maristela Kaiser, percebeu que a minha entrada tinha sido vendida para o sábado (24), no mesmo horário, e não para esta esta sexta-feira (23). No mesmo momento, fomos até a bilheteria e checamos o sistema: os lugares ao redor do Alex e da Júlia estavam corretamente bloqueados.
Pedi para ver o mapa de outras sessões e tudo parecia, aparentemente, correto: poltronas em cinza dos espectadores e marcas de proibido nos lugares ao redor de cada um delas. No fim, este repórter pecou pela ansiedade. Os funcionários, pelo visto, também. Todos me pediram desculpas e, felizmente, tudo terminou bem, como aquelas comédias adolescentes das quais sou fã.