Realizada no Teatro Dolby, em Los Angeles, entre o final da noite de domingo (24) e início da madrugada de segunda-feira (conforme o horário de Brasília), a 91ª cerimônia do Oscar consagrou Green Book – o Guia como o Melhor Filme da edição 2019. Além do principal prêmio da noite, a comédia dramática venceu nas categorias de Melhor Roteiro Original e Melhor Ator Coadjuvante (Mahershala Ali).
Tendo sua vitória recebida com surpresa nas redes sociais, o longa é baseado em uma história real e narra a viagem de um pianista negro com um motorista branco pelo sul dos EUA à época da segregação racial.
Inicialmente, Green Book era bem cotado à disputa de Melhor Filme, mas foi perdendo força em meio às polêmicas que elenco e produção se envolveram: um tweet de Nick Vallelonga, roteirista do filme, em que criticava muçulmanos foi trazido à tona; jornais publicaram que o diretor Peter Farrelly tinha o hábito de mostrar o pênis de brincadeira em 1998, no set de Quem Vai Ficar com Mary?, inclusive para a atriz Cameron Diaz; já o protagonista Viggo Mortensen foi acusado de racismo por usar um termo ofensivo para se referir a um negro.
– Essa é uma história de amor. Sobre sabermos amar uns aos outros apesar das diferenças – garantiu o diretor ao receber o prêmio de Melhor Filme.
Além de Green Book, quem também recebeu três Oscar foram Roma e Pantera Negra. Com quatro estatuetas, Bohemian Rhapsody foi o longa que mais levou troféus este ano.
Começo rock
Foi com rock 'n' roll que a cerimônia de 2019 foi aberta. O Queen deu início ao Oscar subindo ao palco com dois membros originais – o guitarrista Brian May e o baterista Roger Taylor – e, substituindo o astro Freddie Mercury, o vocalista Adam Lambert. Na apresentação, trechos das músicas We Will Rock You e We Are the Champions.
Diversidade
A 91ª edição do Oscar quebrou o recorde da história da premiação com maior número de prêmios para profissionais negros (sete estatuetas) e para mulheres (15).
Na primeira estatueta entregue na noite, Regina King confirmou seu favoritismo e faturou o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por sua atuação em Se a Rua Beale Falasse. Ela já havia conquistado o Globo de Ouro este ano.
– Eu sou um exemplo do que acontece quando alguém recebe apoio e amor – destacou Regina em seu discurso.
Ruth E. Carter se tornou a primeira mulher negra a ganhar uma estatueta de Melhor Figurino. Ela recebeu o prêmio por seu trabalho em Pantera Negra.
– Demorou muito tempo esse prêmio – desabafou Ruth no início do discurso. – A Marvel pode ter criado o primeiro super-herói negro, mas, por meio do figurino, o transformamos em um rei africano.
Pantera Negra também fez história em Direção de Arte, que consagrou o trabalho de Hannah Beachler e Jay Hart. Hannah foi a primeira mulher negra a ser indicada e, consequentemente, a vencer na categoria.
– Quando alguém disser que vocês não são bons o suficiente, ouçam este conselho que uma mulher muito sábia me disse: eu fiz o meu melhor, e o meu melhor é o suficiente – aconselhou Hannah.
Na categoria de Melhor Ator Coadjuvante, Mahershala Ali voltou a vencer. Sua primeira estatueta veio na mesma categoria, em 2017, com Moonlight – Sob a Luz do Luar. Desta vez, ele confirmou seu favoritismo por sua interpretação do músico Don Shirley em Green Book – O Guia. Mahershala é o segundo negro na história da premiação com dois Oscar – o outro é Denzel Washington.
Soberania mexicana
Ao apresentar os indicados de Melhor Filme Estrangeiro ao lado da atriz Angela Bassett, o ator espanhol Javier Bardem falou em sua língua natal para alfinetar o governo Trump:
– Não há fronteira ou muros que possam restringir a genialidade e o talento.
Roma ganhou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Foi a primeira vez que o México venceu na categoria. Ainda, o diretor Cuarón ganhou dois prêmios individuais: Fotografia e Direção. Foi a segunda vez que o cineasta venceu como diretor – a primeira foi em 2014, com Gravidade. Desde então, só deu mexicano na categoria: venceram cinco dos últimos seis prêmios.
Em seu último discurso, ao receber a estatueta de Melhor Diretor, Cuarón chamou atenção para a questão da mulher indígena.
– Agradeço à Academia por reconhecer um filme que trata de uma mulher indígena, e uma das 70 milhões de empregadas domésticas sem direitos trabalhistas. Uma personagem historicamente sempre deixada para trás – ressaltou.
O cineasta também agradeceu a sua babá, Libo, que inspirou o filme:
– O nosso trabalho é olhar para onde ninguém olha. Essa responsabilidade se torna muito maior numa época onde estamos sendo encorajados a não olhar. Muito obrigado, Libo.
Desenhos e absorventes
Em Melhor Filme de Animação, outro favoritismo se confirmou: Homem-Aranha no Aranhaverso, que traz um super-herói latino como protagonista.
– Quando um garoto diz "ele se parece comigo" ou "ele fala espanhol como a gente", nós já vencemos – disse Phil Lord, um dos diretores da animação.
Homem-Aranha no Aranhaverso consagrou também Peter Ramsey como o primeiro diretor negro a concorrer e a vencer na categoria.
Outra conquista no quesito diversidade foi o Oscar de Curta de Animação para Bao, escrito e dirigido pela chinesa Domee Shi – a primeira mulher da Pixar a comandar uma produção do estúdio.
– Para todas as garotas nerds por aí que se esconder atrás de seus sketchbooks, não tenha medo de contar suas histórias para o mundo – declarou Domee.
O Melhor Curta de Documentário foi para Absorvendo o Tabu, uma produção da Netflix que trata sobre o estigma da menstruação na Índia rual. Era o único documentário da categoria a ser dirigido por uma mulher – a cineasta americana de origem iraniana Rayka Zehtabchi.
– Eu não acredito que um filme sobre menstruação acaba de ganhar um Oscar! – brincou Rayka.
Gaga coaching
Em seguida, Lady Gaga e Bradley Cooper subiram ao palco para realizarem um dueto em Shallow, tema de Nasce Uma Estrela que venceu na categoria de Melhor Canção Original. A performance emocionante da dupla foi bastante aclamada nas redes sociais. Ao receber a estatueta, Gaga se emocionou e fez um discurso motivacional.
– Não é sobre ganhar, é não desistir. Se você tem um sonho, lute por ele. Existe uma disciplina. Não é sobre quantas vezes você foi rejeitado, caiu e teve que levantar. É quantas vezes você fica em pé, levanta a cabeça e vai adiante – encorajou a cantora e atriz
A vez de Spike Lee
Se em 2006 Spike Lee havia recebido um Oscar Honorário, desta vez, ele ganhou sua primeira estatueta em disputa. Foi na categoria de Melhor Roteiro Adaptado, por Infiltrado na Klan. Seu nome foi anunciado com muito entusiasmo por Samuel L. Jackson, que apresentou a categoria ao lado de Brie Larson.
– Não desliguem esse microfone – avisou Spike Lee, antes de iniciar seu discurso. – A eleição de 2020 está aí. Façamos uma escolha certa entre amor e ódio. Vamos fazer a coisa certa!
Queen e a rainha
O Oscar de Melhor Ator foi para Rami Malek, que viveu Freddie Mercury na cinebiografia Bohemian Rhapsody. Em seu discurso, ele lembrou que não era a primeira opção para viver o cantor:
– Talvez eu não tenha sido a escolha obvia, mas funcionou no fim.
Rami também comentou sobre o fato de ser filho imigrantes egípcios, relacionando com as origens indianas de Freddie:
– Fizemos um filme sobre um homem gay e imigrante que viveu sua vida sem pedir desculpas. Seu sucesso é a prova de que as pessoas querem ver isso. Sou filho de imigrantes do Egito, de primeira geração. Parte da minha história está sendo escrita agora. E não poderia ser mais grato a todos que acreditaram em mim.
Na categoria de Melhor Atriz, Olivia Colman venceu por sua interpretação em A Favorita, desbancado nomes como Lady Gaga (Nasce Uma Estrela) e a então bem cotada Glenn Close (A Esposa) – sete vezes indicada ao Oscar, não foi dessa vez que levou a estatueta. Olivia interpretou Ana, rainha da Grã-Bretanha entre 1702 e 1707. Ao receber seu prêmio, ela parecia surpresa:
– Isto é realmente estressante. Oh! Ganhei um Oscar!
Além de agradecer a equipe do filme, seu marido e filhos, Olivia mandou um recado à Glenn Close:
– Você é minha ídola há tanto tempo. Eu sinto muito por estar com este Oscar na sua frente.
Aos 45 anos, foi a primeira indicação da atriz britânica ao Oscar – que resultou em vitória.
Apresentador para quê?
Foi a primeira vez em 30 anos que o Oscar não teve um anfitrião para conduzir a cerimônia. Entre os participantes que subiram ao palco para anunciar uma categoria, destaque para Melissa McCarthy. Ela apresentou o prêmio de Melhor Figurino com o ator Brian Tyree Henry. Ambos vestiam um conjunto exagerado, mas a atriz chamou a atenção com sua capa e vestido cobertos de bichos de pelúcias.
– Nuance e sofisticação são apenas duas qualidades do design mais eficaz de figurinos – brincou, arrancando risos da plateia.
As primeiras apresentadoras da noite foram Tina Fey, Amy Poehler e Maya Rudolph – trio de ex-integrantes do programa Saturday Night Live –, que estavam afiadas.
– Uma atualização rápida para todos, caso você esteja confuso. Não há anfitrião esta noite, não haverá uma categoria de filme popular e o México não está pagando pelo muro –disse Maya.
Responsável por apresentar o prêmio de Melhor Fotografia, categoria que a Academia planejava entregar a estatueta durante o intervalo, o ator Tyler Perry cutucou a organização do evento:
– É uma verdadeira honra apresentar a próxima premiação na frente das câmeras, não durante os comerciais. Obrigado, Academia.
Lista de vencedores do Oscar 2019
- Melhor Atriz Coadjuvante: Regina King, Se a Rua Beale Falasse
- Melhor Documentário: Free Solo
- Melhor Maquiagem/Penteado: Greg Cannom, Kate Biscoe e Patricia Dehaney, por Vice
- Melhor Figurino: Ruth E. Carter, por Pantera Negra
- Melhor Direção de Arte: Hannah Beachler e Jay Hart, por Pantera Negra
- Melhor Fotografia: Alfonso Cuarón, por Roma
- Melhor Edição de Som: Nina Hartstone e John Warhurst, por Bohemian Rhapsody
- Melhor Mixagem de Som: Paul Massey, Tim Cavagin e John Casali, por Bohemian Rhapsody
- Melhor Filme Estrangeiro: Roma
- Melhor Montagem: John Ottman, por Bohemian Rhapsody
- Melhor Ator Coadjuvante: Mahershala Ali, por Green Book – O Guia
- Melhor Filme de Animação: Homem-Aranha no Aranhaverso
- Melhor Animação em Curta-Metragem: Bao
- Melhor Documentário em Curta-Metragem: Absorvendo o Tabu
- Melhores Efeitos Visuais: Paul Lambert, Ian Hunter, Tristan Myles e J.D. Schwalm, por O Primeiro Homem
- Melhor Curta-Metragem: Skin
- Melhor Roteiro Original: Peter Farrelly, Nick Vallelonga e Brian Hayes Currie, por Green Book – O Guia
- Melhor Roteiro Adaptado: Spike Lee, David Rabinowitz, Charlie Wachtel e Kevin Willmott, por Infiltrado na Klan
- Melhor Trilha Sonora Original: Ludwig Göransson, por Pantera Negra
- Melhor Canção Original: Shallow, de Lady Gaga, Mark Ronson, Anthony Rossomando e Andrew Wyatt, de Nasce Uma Estrela
- Melhor Ator: Rami Malek, por Bohemian Rhapsody
- Melhor Atriz: Olivia Colman, por A Favorita
- Melhor diretor: Alfon Cuarón, por Roma
- Melhor Filme: Green Book – O Guia