A última exposição individual da artista caxiense Rochelle Costi em Porto Alegre foi em 1987. De lá para cá, ela participou de mostras importantes como as bienais do Mercosul (1999) e de São Paulo (1998 e 2010), ganhando reconhecimento com trabalhos que abordam o tempo e a memória. Quando recebeu o convite para expor de novo na capital gaúcha, quis resgatar a cidade que deixou para trás e falar sobre o tempo que passou. O resultado são as instalações, fotografias e vídeos da mostra Passatempo, em cartaz no Museu do Trabalho.
Nos anos 1980, Rochelle conciliava o trabalho autoral com fotografias de bandas e peças de teatro. A mostra começou a se desenhar a partir desse arquivo:
– Eu tinha esse patrimônio, que é um registro de acontecimentos coletivos, gerados num momento de euforia, de entusiasmo pela cultura e pela vida, no início dos anos 1980. É algo que não me pertence, então senti que tinha que devolver isso para a cidade.
Rochelle criou cinco vídeos a partir de fotografias feitas naquela época. Costurou imagens de artistas – como Os Replicantes no Araújo Vianna, do TNT e De Falla no Hotel Majestic, Urubu Rei e Nei Lisboa no Margs – com outros registros da época, como trabalhos seus e cenas de programas de TV. Agora, a projeção dos vídeos passeia pelas paredes do museu embalada pelas músicas das próprias bandas.
– Era um momento muito profusivo, surgiam bandas o tempo inteiro e eu fotografei muitas delas no início. Procurava usar espaços da cidade, como o Hotel Majestic, que já estava desativado, mas ainda não era Casa de Cultura Mario Quintana – lembra a artista.
Algumas das fotos originais podem ser vistas também, expostas em uma vitrine. O tempo que correu desde que foram tiradas, há três décadas, é marcado por um enorme relógio (foto abaixo), instalação conceitual que, em vez de números, exibe as letras da palavra Passatempo. Diante dela, uma referência mais sutil ao tempo é a releitura da última série feita por Rochelle em Porto Alegre: Ser Um (1987), na qual o performer João de Deus posou para fotos vestido com uma roupa de lagarto, em diferentes locais da cidade. Rochelle ampliou uma das imagens e a imprimiu sobre uma cortina de 4,5 metros x 6,5 metros (foto acima) que é recortada para que possa ser atravessada.
– Escolhi a foto com a Usina do Gasômetro, que na época não era um aparato cultural, e agora está de novo fechada, sem função, entre uma coisa e outra... A orla está toda renovada e esse edifício ali, sem utilidade, é um fato bem estranho – justifica Rochelle. – Para mim, o lagarto representa o tempo porque é um ser longevo, e também a adaptação, porque muda de aspecto conforme o lugar onde está. Na época, fotografei ele em vários locais, como observador da passagem do tempo sobre os espaços, sendo transformados, destruídos, indevidamente usados.
Segundo Rochelle, a exposição ficou completa no dia da inauguração (abaixo), no sábado passado:
– Além de trazer o registro e a questão da memória, a ideia era fazer as pessoas se reencontrarem. Foi importante, porque essa mostra não é sobre nostalgia, é o resgate de um momento. Hoje a gente tem que se dar conta de que a cultura tem sim muito poder, e é extremamente necessária e indispensável.
Passatempo
- De Rochelle Costi
- Curadoria de Gabriela Motta
- Museu do Trabalho (Rua dos Andradas, 230), no Centro Histórico, Porto Alegre.
- Visitação de terça a sábado, das 13h30min às 18h30min, e domingos e feriados, das 14h às 18h30min, até 23 de dezembro. Entrada franca.