Reza a lenda que as pessoas que viveram intensamente as décadas de 1980 e 1990 se lembram de pouca coisa (ou quase nada) daquela época. Já quem recorda em detalhes, provavelmente, não a viveu com intensidade. Evidentemente, é uma piada, mas uma coisa é certa: em Porto Alegre, poucos lugares simbolizaram tão bem a efervescência do final do século 20 quanto o Bom Fim. Tanto é verdade que o bairro ficou inscrito na memória afetiva de duas ou três gerações como espaço privilegiado de diversão e arte.
– O que havia era uma sintonia entre o que vivíamos na calçada da Avenida Osvaldo Aranha e o que acontecia no mundo em termos de música, moda, atitude. Essa conexão com a cena global é surpreendente, se levarmos em conta que, naquele tempo, não existia internet – diz a DJ e produtora cultural Paulinha Dias.
Ela é a administradora do Sobreviventes 80/90 POA, grupo criado no Facebook para “abrir gavetas, caixas de memórias e fitas k7”, com o objetivo de reverenciar os bons tempos. Na rede social, está dito que “é mais que um grupo, é uma família, que sobreviveu aos anos 1980 e 1990 em Porto Alegre”. Ainda que bares e espaços culturais de outras regiões da cidade também sejam revisitados, o marco zero das conversas é o antigo Bom Fim.
Formada por quase 8 mil pessoas, a comunidade é heterogênea, e não poderia ser diferente. Afinal, o gueto boêmio acolhia uma plêiade de tribos distintas, como punks, góticos e adeptos do heavy metal, sem falar nos remanescentes da onda hippie. Essa galera gastava sola de sapato em um itinerário que abrangia locais como Bar João, Escaler, Cacimba, Vermelho 23 e Elo Perdido, que já não existem, além de outros que resistem à passagem do tempo, a exemplo de Ocidente e Lancheria do Parque.
– Não teremos mais um lugar tão acolhedor para todos os estilos e propostas de vida como o Bom Fim. Naquele formato, não existirá mais – assegura Paulinha.
Agora, essa galera decidiu fazer uma festa para que velhos amigos possam se reencontrar, depois de 30 anos ou mais. Ou para que gente que só se conhece pelo nome (através do Facebook) consiga se abraçar. O encontro está agendado para o dia 3 de fevereiro, no Arruda Bar, na Rua José do Patrocínio, 296, na Cidade Baixa. O detalhe é que a festa (animada por três DJs, incluindo Paulinha), com início às 18h, terá hora para acabar: à meia-noite.
– Hoje, é todo mundo tiozinho e não aguenta mais virar a noite – diz Paulinha, soltando uma gargalhada.
A capacidade do Arruda Bar é de 150 pessoas e os ingressos podem ser obtidos no link gzh.rs/sobreviventes.