Recebemos da jornalista Laura Peixoto, de Lajeado, a colaboração abaixo. Laura está resgatando alguns recortes históricos da vida de uma importante mestra, que atuou no Vale do Taquari, para escrever um romance sobre essa figura, que vai misturar fatos e personagens fictícios. Este será seu quinto livro.
Em março de 1899, a professora Julia Malvina Hailliot Tavares (1866-1939), avó do jornalista e escritor Flávio Tavares, chegou à colônia de São Gabriel de Lajeado (hoje, Cruzeiro do Sul), no Vale do Taquari, com o marido José Tavares e os quatro filhos.
Malvina graduou-se como professora na Escola Normal da Província de Porto Alegre — a qual desde 1869 formava professores primários. Ela foi a primeira professora estadual da pequena São Gabriel. Diz a lenda familiar que a transferência teria se dado por ordem de Júlio de Castilhos, provavelmente por alguma represália.
Malvina organizou sua escola na própria casa, próxima ao Rio Taquari — localização apontada em mapa da época. Como funcionária pública, recebia um ordenado de 93,33 réis e uma gratificação de 46$666 como professora da cadeira do sexo masculino e ainda 18$000 para o aluguel, água e asseio da aula.
Conforme pesquisas, a professora Malvina orientava os estudantes com "um tipo de educação laica e libertadora, espécie de escola moderna, nos moldes talhados pelo pedagogista catalão Francisco Ferrer (1859-1909). E o resultado desta didática revolucionária não se fez esperar muito, seus alunos: Nino Martins, Cecílio Vilar, Espertirina Martins e suas irmãs se tornaram líderes e dirigentes sindicais profundamente respeitados pela massa operária gaúcha".
Na verdade, Malvina ensinava os educandos a pensar. E com isso, a duvidar. Além do que, não se valia da tradicional palmatória e não aplicava nenhum castigo físico aos alunos — tão comum na época.
Apesar dessa mulher incomum ser, hoje, um verbete na Wikipédia (wikipedia.org/wiki/Malvina_Tavares), nunca (ou raramente) se ouviu falar da professora nos 40 anos em que trabalhou e viveu na cidade de Cruzeiro do Sul, com pouco mais de 12 mil habitantes. Nada ficou registrado. Sequer um comentário de uma avó que poderia ter sido aluna. Tudo leva a crer que ocorreu um silenciamento intencional de sua memória: a professora Malvina, invisibilizada pela história local, acabou totalmente esquecida. E ninguém jamais reivindicou sua importância. Existem, sim, teses acadêmicas e pesquisas sobre sua trajetória. Alguns a definem como anarquista; outros negam.
Sepultada em Cruzeiro do Sul, Malvina morreu aos 72 anos, no dia 16 de outubro de 1939. Antes disso, viu um de seus filhos, Aristides Hailliot Tavares, assumir como prefeito de Arroio do Meio.