O texto a seguir é baseado em um capítulo escrito por Lourenço Cazarré, para o livro A Língua de Pelotas e Outras Barbaridades (Editora Insular, 246 páginas, 2018) — uma coletânea que teve a participação de 15 autores que escreveram sobre diversos temas.
Em abril de 1943, Joaquim da Costa Fonseca Filho (1909-1968) viajou ao Rio de Janeiro em um avião que havia construído em Pelotas. Foi uma viagem solitária, concluída em 13h14min, após quatro escalas (Porto Alegre, Florianópolis, Paranaguá e Santos). O objetivo do aviador era solicitar ao gaúcho Salgado Filho, ministro da Aeronáutica, licença para construir na "Princesa do Sul" uma fábrica que produzisse em série exemplares daquele aeroplano, o F2, o segundo que construíra. Essa viagem teria sido sugerida pelo próprio ministro, envolvido na época em uma cruzada para aumentar o número de aviadores militares e civis no país.
No Rio, o avião de Joaquim (batizado Cidade de Pelotas) foi submetido a inúmeros testes e aprovado integralmente, mas a licença para a criação da fábrica jamais seria concedida.
Na então capital federal, Joaquim reuniu-se a sua esposa, Elda Neutzling Fonseca, que viajara até lá de navio. No total, o casal permaneceu 40 dias no centro do país. Voaram juntos no F2 a Minas Gerais e a Espírito Santo. "Para conseguir a licença para continuar a fabricação, encontrei e continuo a encontrar os maiores obstáculos, não da parte dos meios oficiais, mas dos a eles ligados", disse Joaquim referindo-se aos "inimigos da aeronáutica no Brasil", aos quais classificava como “antiaéreos”.
A paixão de Joaquim pelos aviões vinha desde a infância. “Com 21 anos bati às portas da Escola de Aviação, lá me familiarizei com aviões, vivi a aviação”, afirmou sobre o serviço militar prestado no Campo dos Afonsos (RJ). De volta a Pelotas, em fevereiro de 1939, em sua casa na rua Gonçalves Chaves, número 516, ele começou a trabalhar na construção do F1, que fez o seu voo inaugural em dezembro daquele ano. Logo anunciou sua intenção de construir um segundo tipo que poderia ser produzido em série.
O início da fabricação do F2 foi lá por 1941 e a conclusão no começo de 1942, quando voou até Porto Alegre, onde, depois de submetido a testes, obteve a licença especial do Departamento de Aeronáutica Civil.
O aparelho tinha dois lugares e duplo comando (destinado a treinamento de pilotos) e, com exceção dos tubos e do motor (um Franklin, 80 HP), a sua matéria prima era nacional. Podia voar por cinco horas a uma velocidade de 135 km/h.
Um ano a muitos voos depois, no dia 10 de abril de 1943, no Rio, o avião foi apresentado a Salgado Filho, que estava acompanhado de Assis Chateaubriand, dono dos Diários Associados e maior incentivador da campanha "Dê asas a juventude", a qual visava desenvolver a aviação, formando pilotos e criando aeródromos.
Apesar do F2 ter se comportado muito bem em todas as experiências, começaram os entraves burocráticos. Em 9 de maio de 1943, Joaquim, acompanhado da esposa, regressou ao Sul, numa viagem de apenas 11h. Começou, então, a desgastante espera pela licença para a fabricação, que nunca viria.
Em 1945, Joaquim vendeu o F2 para o Aeroclube de Ponta Grossa (PR), pensando usar o dinheiro para construir uma terceira aeronave, mais moderna e veloz. Essa, nunca saiu do papel. Joaquim morreu no dia 12 de julho de 1968, 22 dias antes de completar 59 anos.
Na segunda-feira (27), o Almanaque Gaúcho falará mais sobre o personagem e a música inspirada nele.