Silveiro, Silvério e até Silvéiro (equivocada junção dos nomes anteriores). São várias as denominações pelas quais, no linguajar coloquial, é chamada a rua que se estende da Avenida José de Alencar até quase o pico do morro Santa Teresa, na Capital. É uma confusão que não se limita ao jargão popular, praticado sem a obrigação de respeitar os registros históricos.
Até aplicativos de mobilidade urbana se atrapalham na hora de indicar caminhos para se chegar à rua do bairro Menino Deus, na zona sul de Porto Alegre.
De minha parte, guardo com carinho esse canto da cidade. A Silveiro (ou Silvério?) está no mapa da minha infância como endereço do estádio dos Eucaliptos. Foi lá que assisti às primeiras partidas de futebol, junto com meu pai, Luiz Osório, o Barão. Tenho até hoje nítida a imagem do alambrado à esquerda do pavilhão social, a poucos metros do campo, onde a multidão gritava palavras de incentivo (ou ofensas, conforme a cor da camiseta) aos jogadores. Por aquela faixa, corria Sadi Schwerdt, lateral-esquerdo do time que me fez torcedor do Internacional (à época, jamais imaginei que, meio século depois, em 2017, eu ajudaria o Sadi a escrever seu livro de memórias). Daqueles dias já distantes da década de 1960, retenho na lembrança também o cheiro do "churrasquinho de gato" vendido à porta do estádio para torcedores esfomeados após as partidas.
Mas, recordações afetuosas à parte, devo confessar que eu também, por muito tempo, pronunciei erradamente o nome da rua que abrigou a sede do Internacional de 1931 até 1969, quando o colorado se mudou para o Beira-Rio, alguns quarteirões dali (o estádio dos Eucaliptos foi demolido, em 2012, para construção de um condomínio residencial com sete torres). Devo dizer que o correto é Silveiro, homenagem a uma família que tem muita história na Capital.
A começar por Dionísio de Oliveira Silveiro, médico homeopata português, que se estabeleceu por essas bandas ainda jovem. Ele havia cursado Medicina na Universidade de Coimbra durante quatro anos, mas não chegou a concluir os estudos antes da transferência para o sul do Brasil. "Provavelmente, regularizou mais tarde sua situação, pois se tornou conhecido como profissional da Medicina", anota Sérgio da Costa Franco, na imprescindível obra Porto Alegre – Guia Histórico.
Em agosto de 1832, o português casou-se com Rafaela Pinto Bandeira da Silva Freire, com quem não teve filhos. Poucos anos depois, com o falecimento da primeira esposa, contraiu núpcias com a irmã dela, Maria Sofia, com quem teve descendência. Ele foi dono de uma chácara enorme na região, que se desdobrava a perder de vista — do morro Santa Teresa até o Cristal — e tinha como sede um sobrado localizado na atual Travessa Paraíso.
Não era a única propriedade de Silveiro. Tanto que ele doou terrenos para a construção da Igreja Nossa Senhora da Conceição e do Hospital Beneficência Portuguesa, na área central da cidade, o que o tornou uma figura ilustre da Capital, digna de nome de rua. Só que não — na realidade, a Rua Silveiro é homenagem ao filho do médico homeopata, que tem o mesmo nome do pai. Nascido no Rio de Janeiro, em 1840, e batizado em Porto Alegre quatro anos depois, foi um advogado que exerceu a magistratura como juiz municipal e de órfãos nos anos 1870. "Foi esse segundo Dionísio de Oliveira Silveiro que deu nome à conhecida Rua Silveiro", esclarece, definitivamente, o mestre Sérgio da Costa Franco.