Com razão, o professor Peter Walter Ashton, nosso leitor, registra que: “Raras vezes há referências no noticiário sobre monumentos e prédios históricos e, ainda mais raramente, é mencionado quem projetou e construiu estes edifícios que hoje embelezam e caracterizam a cidade...”
O importante arquiteto Theodoro (Theo) Wiederspahn, merecidamente o mais conhecido, trabalhou muito tempo para o escritório de engenharia dos Ahrons, mas, sobre eles pouco se conhece. O professor Peter lembra que, dessa família, fazem parte os antepassados da sua esposa, a professora Ina Warncke Ashton. A empresa dos Ahrons, pai e filhos, atuou no Estado entre 1885 e 1915, deixando implantados, no visual da cidade, prédios, atualmente tombados, e sempre admirados, sem os quais a nossa cidade não seria o que é hoje. O fundador, bisavô de Ina, chamava-se Guilherme (ou Wilhelm) Ahrons, nasceu em Lüneburg, na Alemanha, em 1836, e veio de veleiro aos 19 anos, em 1855, para o Brasil. Desembarcou na baía de Babitonga, hoje baía de São Francisco, em Santa Catarina. Logo comprou terras no loteamento selvático Dona Francisca, hoje a cidade de Joinville. Após dois anos de uma difícil vida de colono, Guilherme, que já era agrimensor, vendeu a colônia, foi para a Ilha do Desterro (hoje Florianópolis) e, após algum tempo, transferiu-se para Bagé. Ali estabelecido, fez amizade com o médico Azevedo Pena. Por sugestão e apoio dele, começou a fazer medições de estâncias da região. Com os recursos amealhados, voltou à Alemanha cinco anos depois e graduou-se na Universidade de Hannover como engenheiro civil com especializações em construção de pontes, cais de portos e minas. Guilherme voltou ao RS casado com Anna Nahrten e foi contratado pela Intendência de Pelotas para construir pontes. Construiu também o cais do porto histórico em Rio Grande. Depois, foi contratado para administrar as minas de carvão de São Jerônimo.
De São Jerônimo, Guilherme veio para a Capital, contratado como engenheiro civil da prefeitura. Após algum tempo, abriu seu escritório de engenharia, no qual, mais tarde, participaram os filhos Rodolfo e Alexandre Ahrons, todos gaúchos. O mais velho, Rodolfo, era formado pela Escola Militar e também agrimensor. Já Alexandre era um engenheiro civil que, mais tarde, passou a construir residências, além de atuar como funcionário da prefeitura. Nesta função, Alexandre elaborou uma planta da cidade.
Rodolfo Ahrons, nascido em Porto Alegre, em 1869, foi mandado pelo pai, Guilherme, para Berlim, na Alemanha, onde se formou engenheiro civil pela Escola Politécnica de Berlim. Graduando-se com distinção no curso de Engenharia, teve como prêmio um estágio técnico na cidade de São Petersburgo, na Rússia. Ali trabalhou como engenheiro pouco mais de um ano, tendo participado da reforma do palácio de verão do czar Nicolau II. Rodolfo Ahrons voltou de São Petersburgo para Porto Alegre casado com uma jovem russa que era filha do carpinteiro-chefe da obra do czar. Além dos filhos engenheiros, Rodolfo e Alexandre, Guilherme Ahrons e Anna Nahrten tiveram mais dois filhos: Hugo (bancário do ex-banco Pfeiffer, mais tarde Banco Industrial e Comercial do Sul S.A.) e Margarida Ahrons.
A empresa dos Ahrons se expandiu enormemente e contratou dois arquitetos alemães muito competentes Theodoro Wiederspahn e Hermann Otto Menschen. Entre 1890 e 1915, portanto, durante 25 anos, os Ahrons e seus arquitetos projetaram e construíram uma grande quantidade de prédios públicos e privados como: as Faculdades de Direito e de Medicina da UFRGS, a Delegacia Fiscal (hoje Margs), o antigo Correio (hoje Memorial do RS), o projeto e o primeiro pavimento da Escola Militar, a Cervejaria Continental (hoje Shopping Total), o projeto e o aterro inicial do cais do nosso porto (o cais Mauá) e a construção do próprio cais, o edifício Pedro Chaves Barcellos, e o antigo edifício do Banco da Província do RS, entre outros que hoje continuam a caracterizar boa parte do visual urbanístico da nossa cidade, compondo o que se pode chamar de a era Ahrons. Em 1915, o engenheiro Rodolfo Ahrons encerrou as atividades do escritório de engenharia parcialmente, em decorrência dos efeitos negativos da Primeira Guerra Mundial. Mais tarde, associou-se a Rubem Berta e fundou com ele a Varig*, da qual passou a ser diretor técnico.
*Esclarecimento (02/05/2019)
Na verdade, a Varig foi fundada em 1927, em Porto Alegre, pelo imigrante alemão Otto Ernst Meyer, (1897-1966), em conjunto com diversas personalidades teuto-brasileiras do Estado, como Alberto Bins, Artur Bromberg, Waldemar Bromberg, Emílio Gertum, Jorge Pfeiffer, Ernst Rotermund e Rudolph Ahrons.
A companhia alemã Condor Syndikat, atual Lufthansa, possuía 21% das ações da Varig. Devido à Segunda Guerra Mundial, Otto Meyer, então presidente, resolveu renunciar ao cargo para proteger a empresa, já que ele era alemão e o Brasil apoiou os aliados na guerra. Em 1942, Ruben Berta (1907-1966), o primeiro funcionário contratado por Otto, aos 19 anos, assumiu a presidência. Ruben Berta foi, com certeza, uma das mais importantes figuras da Varig, dedicava parte da vida exclusivamente para a empresa que amava.
Colaborou Beatriz Meyer da Silva