Há 111 anos, em outubro de 1906, ocorreu a primeira greve geral em Porto Alegre, conhecida como Greve dos 21 Dias, que reivindicou, entre outras coisas, oito horas de trabalho. Em torno de 3,5 mil operários ocuparam ruas e praças da cidade. Uma característica dessa greve foi o número expressivo de trabalhadores estrangeiros e de mulheres operárias. O intendente (prefeito) de Porto Alegre, na época, era o engenheiro José Montaury (1858-1939), e Antônio Augusto Borges de Medeiros (1863-1961) governava o Estado.
A ideia de uma paralisação gerou-se entre os marmoristas, que se reuniam na Escola Eliseu Reclus, na Rua dos Andradas, número 64, sob o comando do líder anarquista Polidoro Santos (1881-1924). Já o grupo socialista era representado pelo líder negro, gráfico e jornalista Francisco Xavier da Costa (1871-1934) e por Carlos Cavaco (1878-1961). O primeiro criou, em 1897, o Partido Socialista Rio-Grandense, e o segundo, considerado o “verbo de fogo”, incendiou, com a sua oratória, a classe trabalhadora. Ambos fundaram, em 1906, a Federação Operária do Rio Grande do Sul (Forgs).
Além dos marmoristas, outras categorias aderiram à greve, como carpinteiros, marceneiros, pintores, alfaiates, tecelões e estivadores. Após oito dias, a paralisação dos serviços industriais era quase total. Os comerciários aderiram quando a greve se encontrava em sua fase final. Quanto à sua condução, os anarquistas defendiam a neutralidade e a independência política dos sindicatos, divergindo nesta questão do grupo socialista. A discussão na imprensa ocorria entre o jornal anarquista A Luta, relançado em 1906 por Polidoro Santos e pelo gráfico José Rey Gil, e o jornal socialista A Democracia (1905-1908), criado pelo líder Francisco Xavier da Costa.
Um verdadeiro duelo de palavras ocorria entre os seus redatores. No decorrer da greve, Alberto Bins (1869-1957) – representante dos industriais – e o líder Francisco Xavier da Costa chegaram a um acordo, no qual ficou estabelecida a jornada de trabalho de nove horas. Embora as diferenças no campo ideológico, anarquistas e socialistas tinham objetivos em comum, como lutar por melhores condições de trabalho, reduzir a excessiva carga horária do operário, exigir aumento salarial, além de denunciar os maus-tratos sofridos pelos operários. Durante a greve, o policiamento foi ostensivo, e os piquetes tentavam impedir os chamados “fura-greve”. No dia 9 de outubro de 1906, os operários descontentes quanto à proposta da classe patronal de nove horas diárias decidiram permanecer em greve. Seguiram-se várias prisões...
Em 21 de outubro de 1906, a greve chegou ao seu término, embora os conflitos entre operários e patrões continuassem. Os anarquistas, por meio do jornal A Luta, denunciavam que, ao contrário do que outros jornais divulgavam, ocorriam punições e demissões quando o operário voltava ao trabalho. As arbitrariedades, com certeza, eram resultados da ausência, na época, de uma legislação trabalhista que garantisse os direitos dos trabalhadores.
Encerrada a greve, a categoria dos marmoristas, que deu início ao movimento, seguiu na luta até conquistar a carga diária de oito horas. De acordo com o jornalista João Batista Marçal, o líder socialista Francisco Xavier da Costa deixou-se envolver pelo jogo da política burguesa. Ao perder espaço na Forgs para os anarquistas, ele concorreu, em 1912, pelo Partido Republicano Rio-Grandense (PRR). Eleito, naquele ano, com 4.337 votos, foi o primeiro vereador negro de Porto Alegre. A greve geral de 1906 foi um marco da luta operária em nosso Estado.
Colaboração de Carlos Roberto Saraiva da Costa Leite, pesquisador e coordenador do setor de imprensa do Musecom