O reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Pedro Hallal, explicou a pesquisa do governo estadual em parceria com a instituição, que analisa a prevalência do coronavírus no Estado. Em entrevista ao Estúdio Gaúcha, na noite desta quarta-feira (13). Hallal exemplificou o que significa o dado apontado pela terceira fase do levantamento:
— Explicando de uma forma muito simples para o público, basicamente, se a gente quer saber quantos casos de coronavírus têm no Rio Grande do Sul, basta pegar o número das estatísticas oficiais e multiplicar por 10, que estaremos muito próximos da realidade da população infectada.
Hallal também afirmou que o estudo mostra um dos principais perigos do coronavírus: a transmissão do vírus por meio de pessoas assintomáticas.
O reitor explicou que identificar as primeiras cidades e os novos municípios que registraram casos de coronavírus é “extremamente importante” para ver o quanto esse vírus está conseguindo se ramificar e se espalhar para o resto do Estado:
— Tendo essa informação, as autoridades de saúde e as prefeituras podem tomar as melhores decisões por evitar que o vírus se dissemine na cidade.
Veja abaixo alguns trechos da entrevista:
Quando a gente fala em casos registrados e infectados significa dizer que todo esse percentual acima desenvolveu os anticorpos? Teve contato com a doença? Ele foi assintomático? Ele propagou isso? O que exatamente a pesquisa mostra?
Quando a gente estima que tem 25 mil gaúchos que já tem anticorpos contra o coronavírus, o que nós estamos dizendo é exatamente que essas pessoas — ou 90% delas, descontando os que chegaram ao serviço de saúde — ou não tiveram sintomas ou tiveram sintomas leves, que fizeram com que eles nem procurassem o serviço de saúde. Se olhar pelos próprios dados da nossa pesquisa, só uma das 18 pessoas que testaram positivo, até agora, relatou que teve febre. E duas delas relataram que tiveram dificuldade para respirar. Seriam dois sintomas que indicam um pouco mais de gravidade no quadro. Todas as outras pessoas ou não tiveram nenhum sintoma ou tiveram sintomas leves. Um pouco de tosse, um pouco de dor de garganta.
Então, qual é a nossa preocupação? É que essas outras pessoas que tem o contato com o vírus, tanto que desenvolvem anticorpos, mas que não estão notificadas, ou seja, não chegam na unidade de saúde, no hospital, por um período elas também podem transmitir a doença. Isso é o que faz com que o coronavírus tenha todo esse impacto que tem no mundo. É transmissão, principalmente pelos assintomáticos.
Isso é o que faz com que o coronavírus tenha todo esse impacto que tem no mundo. É transmissão, principalmente pelos assintomáticos.
PEDRO HALLAL
Reitor da Ufpel
O que essa terceira etapa da pesquisa apresentou para basear o distanciamento controlado, que está em vigor aqui no Estado desde o início da semana, por sustentar essa separação do Estado em 20 regiões, sobretudo nas regiões mais complexas?
Esse é um alerta que nós fizemos como pesquisadores ao governo do Estado e também à prefeitura de Passo Fundo, mesmo que no caso da prefeitura de Passo Fundo eu não tenha conversado diretamente com o prefeito, mas certamente ele teve acesso às nossas declarações pela mídia. No nosso entendimento, o fato de que 40% dos casos que apareceram na pesquisa foram em Passo Fundo chama muito a atenção.
Nós já temos as estatísticas oficiais mostrando um número considerável de casos em Passo Fundo. A gente já tem um número de mortes preocupante na cidade, comparado com o de Porto Alegre, que é muito maior. Agora, a pesquisa vai a campo e de 10 casos encontra quatro em Passo Fundo. Então, realmente, Passo Fundo está se tornando um dos epicentros da pandemia no Rio Grande do Sul.
Qual é a nossa recomendação? Os lugares que conseguiram controlar esses surtos iniciais são lugares que aplicaram políticas rígidas de isolamento. Então, a nossa sugestão é que Passo Fundo adote, pelo menos pelas próximas duas semanas, medidas rígidas de distanciamento para evitar que a situação piore ainda mais. Em outros lugares do Estado, não teve nada disso. Teve um caso em Pelotas, um caso em Porto Alegre, um caso em Santa Cruz, dois casos em Ijuí, um em Caxias, mas nada que preocupasse os nossos pesquisadores. A concentração de casos em Passo Fundo chamou um pouco a nossa atenção e fez ligar esse alerta na nossa forma de raciocinar como pesquisador. Que é hora de dar uma atenção especial por aquela localidade.
As pessoas têm saído mais de casa para motivo que não seja essencial?
Exatamente. Foi outra informação importante da pesquisa. Na verdade, se a gente comprar as três fases da pesquisa, houve um aumento considerável. Lá na primeira fase, que foi no feriado da Páscoa, lá no meio de abril, só 20% da população estava saindo de casa diariamente. Agora, nessa terceira fase, aumentou para 30% da população. Uma coisa que é importante de se dizer é que o maior aumento não foi agora, da segunda para a terceira fase. Foi entre a primeira e a segunda fase.
A população gaúcha segue aderindo bem às medidas de distanciamento. A gente reforça que quem puder ficar em casa deve ficar em casa, mas tem todo o planejamento do governo do Estado que está liberando e está bem embasado na ciência, (baseado no que) a nossa universidade e várias outras estão produzindo. A gente entende que o Rio Grande do Sul está lidando bem com a pandemia de coronavírus. Claro que, infelizmente, mais de 100 famílias já perderam seus entes queridos devido a essa doença, que sequer existia meses atrás. Mas, comparativamente com outros Estados, o Rio Grande do Sul tem resultados muito melhores e isso não acontece por acaso. O Rio Grande do Sul está fazendo um estudo epidemiológico que está servindo de exemplo para o país inteiro, tem uma política de distanciamento controlado que certamente servirá de inspiração para outros Estados ou até para o país inteiro.
Sobre os sintomas do coronavírus. Deve ter uma variação de sintomas de pessoa por pessoa. O que a pesquisa tem mostrado nesse sentido?
Foi a primeira vez, agora na terceira fase, que a gente resolveu mostrar o dado dos sintomas, porque a gente tinha muitos poucos casos nas primeiras duas fases. A gente juntou os dados da primeira, da segunda e da terceira e foi avaliar os sintomas que as pessoas que testaram positivo relataram. O sintoma mais comum foi dor de garganta, mas mesmo isso apareceu em bem menos da metade das pessoas. Depois, teve algumas pessoas que relataram tosse. Um sintoma que é bem inespecífico e que pode significar várias outras coisas é diarreia. Outro que foi citado, que tem alguns estudos da literatura mostrando, é a perda de olfato ou paladar. Como eu disse, os sintomas “mais graves”, que são dificuldade para respirar e febre, foram relatados por muito menos pessoas entre aquelas que tiveram teste positivo.