Das aulas de culinária na casa de um morador local ao aprendizado do artesanato tradicional com povos indígenas, a maior parte das viagens – até março de 2020 – tinha tudo a ver com o fato de se relacionar com os outros.
Agora, na era da covid-19, conforme as pessoas começam a pensar em se aventurar de novo – sozinhas, com familiares ou amigos próximos –, as agências de viagens já oferecem novas opções e meios de se manter afastado das multidões.
Antes da pandemia, menos de 20% dos norte-americanos passavam algum tempo ao ar livre mais de uma vez por semana, segundo pesquisas. De lá para cá, as vendas de bicicletas para adultos aumentaram 121% no território dos Estados Unidos.
Hoje, até as atividades que supostamente exigem um grupo para sua realização estão oferecendo opções solitárias. A Rowing The World, por exemplo, já tem passeios autoguiados para a prática de remo nas versões individual ou em pequenos grupos em Seattle, em Sarasota (Flórida) e no norte do Michigan e do Maine.
Quem ajuda a carregar o peso da cesta de piquenique e dos apetrechos para as trilhas percorridas em mais de um dia das excursões da Paragon Guides de Vail, no Colorado, são as lhamas. Neste verão, a empresa vai continuar apostando nos passeios guiados, mas quem preferir evitar qualquer contato humano pode pagar para ter um dos animais e sair só (o aluguel mínimo sai por US$ 100 ao dia; a caminhada com direito a almoço, US$ 490 para duas pessoas).
— Expor-se à natureza é essencial para a saúde e a felicidade humanas. Neste momento de estresse e ansiedade, estar ao ar livre é mais importante do que nunca — afirma Alyssa Ravasio, diretora executiva do Hipcamp, que administra as reservas de mais de 300 mil campings nos EUA.
Cerca de um terço dos acampamentos oferece barracas de lona, yurts (tenda ou cabana circular usada tradicionalmente pelos pastores nômades mongóis) ou casas de árvore. O Hipcamp espera uma temporada movimentada: já em maio, os proprietários tinham faturado o triplo do valor arrecadado no mesmo mês de 2019.
Outro serviço, o Tentrr, oferece opções em terrenos particulares no melhor estilo “glamping”, com barracas mobiliadas e banheiro próprio, entre elas uma cervejaria na região de Finger Lakes, em Nova York (diárias a partir de US$ 145) e uma fazenda no Tennessee (a partir de US$ 75).
— Não quero o campista médio, aquele que chega com toda a parafernália. Meu cliente é a pessoa que vem de moto, sem nada. É só chegar e se instalar — explica Ken Ford, que construiu um espaço de locação em um terreno da família próximo a Wevertown, na região das Montanhas Adirondacks (diárias a US$ 150).
O carro como bolha
Em maio, os moderadores da Solo Travel Society, no Facebook, perguntaram a seus mais de 260 mil membros: “A pandemia mudou sua forma de encarar as viagens futuras?”. Em questão de três horas, quase 200 respostas revelaram um pouco de tudo, desde o medo de contaminação no avião até a impaciência com as restrições de viagem, mas a maioria seguiu o exemplo resiliente e inabalável de Chris Engelman, de Ottawa, no Illinois, que escreveu: “Viajar me faz feliz. Vou continuar a viver uma vida de alegrias”.
— O pessoal está de olho nas viagens na bolha segura do próprio carro — conta Janice Waugh, fundadora do site SoloTravelerWorld.com.
O viajante solo geralmente opta por excursão, e agências como a Tauck, de olho nesse nicho, criaram alguns suplementos individuais em alguns roteiros. Mas, como as viagens para o Exterior estão em compasso de espera por causa das restrições de entrada e as viagens em grupo se transformaram em potencial de ameaça à saúde, a operadora Audley Travel, por exemplo, informa que as reservas para uma única pessoa dobraram desde meados de março, indicando que o público está desistindo das férias em bando.
Para este segundo semestre, Caren Kabot, fundadora da Solo Escapes, pretende substituir as viagens de pequenos grupos a destinos como o Marrocos por fins de semana no interior do nordeste dos EUA, para onde muitos clientes podem ir de carro até se sentirem confiantes em voltar a voar. Caminhadas, passeios de barco e atividades culinárias devem estar na agenda.
— Os jantares serão socialmente distantes. Talvez em uma mesa bem longa, ou duas. Vamos nos ajustando — conclui Caren.
Romantismo em alta
Imagens de praias desertas e drinques ao pôr do sol para dois: sob vários aspectos, a indústria do turismo já está voltada para os casais, com a promessa de isolá-los do resto das pessoas.
— Há anos já praticamos o distanciamento social; foi sobre ele que construímos nosso nome. Afinal, o romantismo exige privacidade — diz Adam Stewart, vice-presidente da Sandals Resorts, que tem 15 resorts all-inclusive em seis países caribenhos.
Voltados para casais, eles têm ofurôs, redes para dois e jantares privados na praia. A maioria vai reabrir para o verão com as mesas do restaurante ainda mais espaçadas e o uso do elevador limitado a apenas um casal. Os ônibus que faziam o transfer do aeroporto, com capacidade para até 30 passageiros, levarão um máximo de 10.
— As festas na praia com drinques à base de rum e reggae continuam, mas nada de trenzinho de conga — avisa Stewart.
Os resorts com acomodações individuais separadas – desde o luxuoso e exclusivo Bluefields Bay Villas, na Jamaica, com chef próprio (diárias a partir de US$ 980), até as barracas de glamping da Collective Vail, no Colorado (a partir de US$ 249), passando pelas casinhas de preço acessível da Canoe Bay Escape Village, no Wisconsin (a partir de US$ 125) – afirmam já ter naturalmente uma configuração adequada para as viagens em tempos de covid-19.
— As unidades são bem afastadas umas das outras, há pouquíssimo ou nenhum contato com os outros hóspedes e, além disso, você está no meio da natureza, onde pode relaxar. Quase todos os finais de semana deste verão já estão lotados — diz Dan Dobrowolski, dono do Canoe Bay Escape Village.