Rafaela Ely*
Quinhentos dias não são suficientes para conhecer toda a América do Sul, mas já dá para ter uma noção das belezas que nosso continente oferece.
Entre 4 de maio de 2017 e 26 de setembro de 2018, passei por Uruguai, Argentina, Chile, Bolívia, Peru, Equador e Colômbia. O plano original do projeto Me Leva Embora Estrada Afora era chegar ao Alasca nesse período de tempo. Contudo, os países sul-americanos me encantaram tanto, que decidi aumentar minha estada neles para poder desfrutar mais de sua hospitalidade. Passei uma média de dois meses e meio em cada um.
A ideia do Alasca segue em pé – ou em duas rodas. Planejo começar uma viagem de moto em 2020. Por enquanto, fico com as lindas lembranças das pessoas e dos lugares pelos quais cruzei pelo caminho. Para conhecê-los em mais detalhes, é só entrar no blog melevaembora.com.br. Aqui deixo um resumo dos locais que mais me impressionaram em cada país em que estive nessa trip.
Quebrada de Humahuaca
Esta é uma zona deslumbrante na província de Jujuy, no norte da Argentina. A Quebrada de Humahuaca foi declarada patrimônio mundial pela Unesco. Além das formações geológicas, a região oferece a rica cultura dos povos originários. Uma época interessante para visitá-las é ao redor de 1º de agosto, quando se celebra o Dia da Pachamama (Mãe Terra). As cidades mais conhecidas são Purmamarca, Tilcara e Humahuaca.
Purmamarca é onde fica o Cerro de Siete Colores – minerais de diferentes milênios alteram as cores do morro. Tilcara é a cidade ideal para os que gostam de andar a pé. A Garganta del Diablo, com sua cachoeira, e o Cerro de la Cruz, com vista panorâmica, são dois dos passeios mais frequentes. A Paleta del Pintor, na localidade de Maimara, é outro cerro colorido da região.
O Hornocal, localizado no município de Humahuaca, é conhecido como Cerro de Catorce Colores. O acesso é um pouco mais complicado. É preciso pegar uma caminhonete para percorrer os cerca de 20 quilômetros que separam o centro de Humahuaca do Hornocal. A estrada não está em boas condições e no caminho havia dois carros com pneus furados.
A região fica a mais de 2 mil metros sobre o nível do mar. Mascar folhas de coca pode ajudar a diminuir os sintomas como cansaço, dores de cabeça, enjoos e tonturas. A dica é reduzir o esforço, realizar as atividades lentamente e sempre respeitar os limites do corpo.
Baños de Água Santa
Situado na província de Tungurahua, no Equador, é o destino ideal para quem busca adrenalina. Na Ponte San Francisco, 100 metros acima do Rio Pastaza, é realizado o puenting: o participante salta para um pêndulo de 40 metros com uma corda elástica amarrada na cintura.
Balanços são outros programas buscados pelos turistas. Há desde os mais tranquilos, como na clássica Casa del Arbol, como os mais radicais: o Vuelo del Condor tem uma queda de 30 metros de altura.
As cidades vizinhas a Baños também têm suas opções de aventura. Em Río Blanco, fica o Mega Park Adventure. São três cabos para fazer tirolesa nos estilos morcego, super-homem e sentado. São percorridos 500 metros de distância a 130 metros de altura, em uma velocidade média de 40 km/h. Na ponte tibetana, o visitante, protegido por luvas e cabos de segurança, precisa superar obstáculos no brinquedo suspenso a 120 metros de altura. Em seus 300 metros, os visitantes passam por 435 tábuas, dois dormentes, sete redes de metal e pneus. Dependendo do perfil do público, os guias colocam mais ou menos dificuldade, saltando na estrutura e causando um desequilíbrio nos que caminham.
Os que procuram contato com a natureza podem se deslumbrar com as cascatas nos arredores de Baños. A mais famosa é o Pailón del Diablo, com suas características escadas de acesso à queda d’água.
A intensidade da programação em Baños pede alguns momentos de descanso. Banhar-se nas termas é uma boa pedida. A água é meio amarela devido ao enxofre e as temperaturas variam – há desde piscinas frias até superquentes, onde não é recomendado ficar mais do que 10 minutos.
Cabo Polonio
— Esse lugar é uma armadilha. Tu chegas aqui e não consegues ir embora – me disse um menino de El Salvador no dia em que cheguei.
Ele não estava errado. Foram duas semanas no vilarejo, que fica dentro de um parque nacional no Uruguai. Aproximadamente 50 pessoas moram lá todo o ano, outras 50 vivem alguns meses, uns cem turistas visitam por dia fora de temporada. Já nos meses de dezembro a fevereiro, o local explode e recebe cerca de 3 mil pessoas diariamente.
O acesso é limitado. Os caminhões têm horários determinados e saem da Puerta del Polonio, onde há estacionamento e parada de ônibus. Desde a Puerta, também se pode caminhar por seis quilômetros até o povoado. Para os que se animam a andar a pé, outra opção é o acesso pelas dunas de Valizas, balneário vizinho.
Talvez esse não seja o destino mais recomendado para os que primam pelo conforto. Não há rede elétrica nem sistema de água e cada imóvel tem sua própria estrutura com poços, painéis solares, turbinas de vento ou geradores. Há apenas um armazém, mais caro do que os mercados fora do parque.
A grande atração de Cabo Polonio é o farol. São 132 degraus até o topo dos seus 27 metros, que proporciona uma vista incrível. Atrás dele, descansam lobos-marinhos.
Huaraz
A base glacial da montanha nevada Pastoruri está na Cordilheira Branca, no Parque Nacional Huascarán, patrimônio mundial pela Unesco. Partindo do município de Huaraz, no Peru, o trajeto de dois quilômetros é tranquilo e bem sinalizado (quem não quiser caminhar pode alugar um cavalo).
O glacial peruano fica 5,2 mil metros acima do nível do mar. É uma pena que o bloco de gelo logo irá desaparecer. Por causa do aquecimento global, a expectativa é de que o Pastoruri derreta completamente em menos de 10 anos.
Ipiales
Uma das maiores belezas da Colômbia está perto da fronteira com o Equador, em Ipiales. A história do Santuário de Las Lajas começa em 1754, quando uma menina indígena supostamente viu a virgem em uma das paredes do penhasco. No mesmo ano, foi erguida uma capela no local da aparição. Em 1779, começou a segunda construção. A terceira veio em 1859. A obra da estrutura que se vê hoje teve início em 1916 e terminou em 1949. Em 2007, foi considerada a Segunda Maravilha da Colômbia, segundo pesquisa do jornal El Tiempo com seus leitores.
Além de apreciar a arquitetura neogótica da edificação localizada dentro do cânion no Rio Pastarán, é possível entrar na igreja. No subsolo, há um museu cuja entrada custa o equivalente a R$ 4,50. Expõe peças pré-colombianas e explica o projeto de Las Lajas. É bom ir de dia para fazer uma caminhada pelas trilhas e à noite para ver o jogo de luzes.
Deserto do Atacama
San Pedro é a base para quem quer explorar o deserto mais árido do mundo, o Atacama. Os visitantes têm muitas opções de passeios partindo da cidade no norte do Chile. Na Calle Caracoles e na Calle Toconao, estão as agências de turismo. Após pesquisar bastante, fechei um pacote de quatro tours, um mais deslumbrante do que o outro: Valle de la Luna, Piedras Rojas + Lagunas Altiplánicas, Geysers del Tatio e Lagunas Escondidas de Baltinache. É bom ficar atento aos preços, pois variam muito de empresa para empresa.
O Valle de la Luna, na Reserva Natural Los Flamencos, é um dos passeios mais buscados. Em geral, ocorre à tarde, para contemplar o pôr do sol. Inclui uma caverna de sal, uma grande duna de areia e formações rochosas.
O Piedras Rojas + Lagunas Altiplanicas + Salar de Atacama dura o dia inteiro. A primeira parada é para tirar fotos no Trópico de Capricórnio e em um trecho do Caminho Inca. Piedras Rojas, no Salar de Talar, destaca-se pela mistura das pedras vermelhas com o branco do sal e o verde da água.
Nos Geysers del Tatio, as fontes termais lançam vapores ao amanhecer. O fenômeno acontece porque os rios subterrâneos são aquecidos pela lava e a água evapora. Senti que aquele espetáculo era uma prova de que a Terra está viva. Depois, os turistas são levados ao povoado de Machuca, onde podem comprar espetinhos ou pastéis de carne de lhama.
Amei as Lagunas Escondidas de Baltinache. São sete lagoas azuis cristalinas no meio de um salar. Pode-se tomar banho em duas delas, mas é quase impossível nadar, pois a água, com 47% de sal, é muito densa. Cuide para não molhar o rosto.
Torotoro
É um pequeno povoado no departamento de Potosí, na Bolívia. Fiz os dois passeios mais populares: Caverna Umajalanta + Ciudad de Itas e o Cânion de Torotoro. Os grupos se formam no escritório do parque nacional, e tive sorte de haver bastante gente interessada, assim, paguei o valor mínimo. A Umajalanta é considerada a maior caverna do país. Sete quilômetros já foram descobertos, mas nunca se alcançou o fim da cavidade – somente 400 metros são explorados turisticamente. Oito salas se formaram dentro desse grande buraco e não há nada de iluminação na gruta, a não ser pelas lanternas dos capacetes, inclusos no tour. O passeio é recomendado para pessoas com um mínimo de condicionamento físico, pois é preciso rastejar, escalar e saltar para superar obstáculos. Depois de explorar a caverna, é a vez da deslumbrante Ciudad de Itas. Essa denominação vem do guarani ititas, que significa “pedras sobrepostas”. O que deixou toda essa região tão pitoresca foi o choque das placas tectônicas de Nasca com a Sul-Americana. O Cânion de Torotoro exige umas cinco cansativas horas de caminhada e o risco de queda, mas vale a pena. O fim do tour reserva uma surpresa: pegadas de dinossauro.
* Rafaela Ely é jornalista e tem 28 anos. Natural de Porto Alegre, cidade pela qual é apaixonada, mora na capital dos gaúchos quando não está viajando. Mantém o blog melevaembora.com.br, com dicas dos lugares por onde passou.