Por Ingrid K. Williams
Uma dica para quem vai para a região das Dolomitas: não queira ser o motorista responsável por fazer as curvas fechadas e negociar espaços com bandos de ciclistas italianos pedalando através de desfiladeiros estreitos. Melhor ser o passageiro, cabeça para fora da janela, boca aberta, hipnotizado pelas montanhas e os vales gloriosamente verdes. Essa cadeia de montanhas monumental, no nordeste da Itália, é um dos mais belos playgrounds para aventuras – do esqui no inverno às caminhadas, pedaladas e escaladas no verão –, com um patrimônio cultural também fascinante.
A maior parte da região pertencia à Áustria até ser anexada pela Itália, após a Primeira Guerra Mundial, e a culinária local reflete bem essas raízes – ou seja, prepare-se para encarar muito speck, sauerkraut, knödel e strudel. De vale a vale, de vilarejo a vilarejo, você ainda encontra falantes do alemão, alguns do italiano, com sotaque cantado, e também do ladino-dolomítico, dialeto nativo dessa região remota. Embora a sinalização toda seja feita em duas ou três línguas, o fato é que a beleza das paisagens não precisa de tradução.
Sexta-feira
15h — Guerra e paz
Para entender um lugar é preciso compreender sua história; por isso, vale iniciar a visita com uma lição do passado dessa região tão castigada pela guerra. No Bunker Museum (entrada 5 euros), como diz o nome, você desce para as instalações dos tempos da Guerra Fria para conferir os registros dos acontecimentos da área do Sul do Tirol durante o fascismo e sua luta por autonomia.
Continue a viagem no tempo no Forte Tre Sassi (7 euros), museu que ocupa um forte abandonado no topo de uma montanha e revela não só as dificuldades enfrentadas pelos soldados da Primeira Guerra Mundial como as batalhas encardidas realizadas nos desfiladeiros das proximidades.
Quem tiver mais tempo também pode visitar os museus a céu aberto, suas trincheiras e os túneis usados nos confrontos trágicos entre os exércitos italiano e austro-húngaro. Se chegar pelo oeste, pare no imponente Forte di Fortezza, verdadeiro labirinto espalhado por 50 acres que foi construído pelo governo austríaco, por medo dos franceses, no século 19, e que agora criou o próprio museu (7 euros).
17h30min — Grande lago
Tons deslumbrantes de azul e verde se fundem nas profundezas gélidas do Lago di Braies, localizado em meio às montanhas. Percorra a trilha de quatro quilômetros que circunda o corpo d'água que brilha feito joia sob a luz do sol, adquirindo tonalidades verde-esmeralda e azul-safira e tendo como pano de fundo as montanhas, também em constante mutação. Nos meses de verão, há barcos a remo de madeira disponíveis para aluguel (25 euros/hora, de junho a setembro, entre 10h e 17h); nos de inverno, o programa é caminhar pelas trilhas com sapatos especiais.
20h — Jantar dolomita
Bem acima da cidade de Bruneck é possível provar a tradicional culinária tirolesa no Oberraut, chalé alpino com salão aconchegante, todo forrado em madeira, e garçons vestidos a caráter. No cardápio, pratos preparados com produtos cultivados na propriedade, como os deliciosos canederli, temperados com ervas e servidos com verduras (12,50 euros).
Outra boa opção é o Osteria Garsun, restaurante que oferece pratos substanciosos da cozinha ladina (25 euros), incluindo panicia, uma sopa de legumes e cevada, e o casunziei, ravióli caseiro servido com manteiga derretida, sementes de papoula moídas e queijo parmesão. Guarde espaço para duas rodadas de sobremesa, incluindo strudel quente, e uma dose de grappa para completar.
22h30min — Cenário etílico
Depois do jantar, faça como o pessoal local e vá ao Brunegg'n, às margens do rio em Bruneck, um bar de coquetel com música ao vivo – country, folk, rock – e DJs convidados nos fins de semana. Pegue uma mesa no terraço, peça uma Colonial IPA de uma cervejaria de Bolzano, a Batzen Bräu (5,50 euros), ou arrisque-se com um Hugo Mango, versão frutada do coquetel tirolês feito com flor de sabugueiro (4,50 euros).
Sábado
8h — Picos trigêmeos
Uma das caminhadas mais deslumbrantes (e obrigatórias) da área pode ser feita em questão de horas: os quase 10 quilômetros da circum-navegação do Tre Cime di Lavaredo, ou as três montanhas bem características que ficam à vista, ainda que à distância, ao longo de todo o passeio. As trilhas de pedra são relativamente fáceis e bem sinalizadas, o que faz dela uma das opções mais populares (e lotadas) da área.
Começa no Rifugio Auronzo e vai subindo, passando por campos de flores silvestres, pequenos lagos e alguns rifugi (pequenas cabanas). No ponto inicial há espaço de sobra para estacionamento, além do pagamento de uma taxa de trinta euros por veículo.
12h30min — Almoço local
Quando for hora de reabastecer as energias, vá para o Pur Südtirol, um mercadinho e café onde tudo – desde o iogurte e o queijo, passando por pêssegos madurinhos – são produzidos no território ao entorno. Reúna um bom material para piquenique, quem sabe um pouco de speck, graukäse (queijo tirolês de cheiro forte que ganhou o nome da casca acinzentada), sidra de maçã e um filão de pão cascudo. Se preferir, coma no café mesmo, que oferece saladas frescas e pratos especiais como knödel de queijo sobre repolho picado. Pratos a 12 euros.
14h — No alto da montanha
Depois da primeira escalada, aos cinco anos, Reinhold Messner se tornou um alpinista famoso – e o primeiro a conquistar todas as montanhas acima de 8 mil metros (incluindo o Evereste, sozinho). Hoje septuagenário, Messner fundou uma série de museus na sua região natal, o mais recente sendo o Messner Mountain Museum Corones, no topo do Kronplatz, a 2,9 mil metros e projetado por Zaha Hadid.
Suba de bondinho para apreciar a vista à sua volta e, ao chegar lá em cima, entre para ver as exposições dedicadas à história do montanhismo e seus pioneiros (10 euros). Mais tarde, faça um passeio pelas cercanias ou se arrisque na ferrata, ou cabos de aço que auxiliam a escalada alpina.
17 — Vinhos paroquiais
Em uma região mais conhecida pelos vinhos brancos, deixe de lado a sylvaner e a riesling para experimentar os tintos pouco conhecidos do Alto Adige durante degustação na Abbazia di Novacella, monastério pastoral agostiniano fundado no século 12 que usa as uvas cultivadas nos vinhedos aterraçados à sua volta. Prefere o robusto Santa Maddalena ou o schiava, mais doce? O perfumado lagrein ou o zweigelt, frutado? A uma das mesas da Stiftskeller, cantina movimentada dentro da estrutura, você pode repassar a carta inteira – e se encontrar um rótulo de que realmente goste, leva uma amostra para casa.
20h — Jantar estrelado
Alta Badia, o belo vale que abriga várias cidadezinhas turísticas, também é rico em estrelas do Michelin. Em San Cassiano fica o Hotel Rosa Alpina e seu prestigiado restaurante, o St. Hubertus, reconhecido pela verdadeira frota de Porsches estacionada à entrada. A casa ganhou a terceira estrela do guia graças aos pratos da alta gastronomia montanhesa de Norbert Niederkofler (menu degustação a partir de 200 euros).
Ali perto, no Ciasa Salares, o chef revelação Matteo Metullio, (ex-St. Hubertus), já chama a atenção da gastronomia mundial – e apesar de nem ter completado trinta anos, faturou a segunda estrela, no ano passado, para o restaurante do hotel, La Siriola, com um cardápio baseado em carnes de caça (menu degustação a partir de 130 euros).
Domingo
9h — Inspiração nos afrescos
Brixen (Bressanone em italiano) pode ser pequena, mas é um importante centro cultural e religioso da região. À luz fresca da manhã, visite a catedral, erguida em 980, de linhas barrocas, belíssimos afrescos e um altar revestido de mármore. Tão impressionante quanto ela é a clausura logo ao lado, com afrescos góticos que se acredita terem sido pintados nos séculos 14 e 15 para enfeitar as colunas românicas ao redor de um jardim que convida à contemplação.
11h — Plano de voo
Com apenas alguns passos – e talvez uma rápida oração – você pode se lançar do topo da montanha, preso a um instrutor de parapente. Aí é só aproveitar o voo cheio de euforia entre os picos majestosos, rumo ao vale lá embaixo. Uma das equipes mais experientes é a da Fly2, que trabalha na região de Val Gardena há mais de vinte anos (com vários pontos de partida e durações de voo, a partir de 110 euros).
13h — Planaltos e pináculos
Depois de uma aterrissagem suave, aproveite a onda de adrenalina voltando para as montanhas a bordo do bondinho vermelho que sai de Ortisei rumo ao topo do Monte Sëuc (ida e volta, 19 euros). A quase dois mil metros de altitude, o pico oferece uma vista panorâmica do Alpe di Siusi, maior planalto alpino da Europa. Para além de suas pradarias ergue-se uma série espetacular de montanhas, incluindo o escarpado Sassolungo e o Sasso Piatto. Dali, você pode caminhar ou pedalar pelos campos verdes (há bicicletas de aluguel disponíveis na base) ou, se preferir, se aboletar no Ristorante Mont Sëuc, onde a cerveja é gelada e as mesas externas oferecem uma das vistas mais belas dos Dolomitas.
Acomodações
Quem prefere se hospedar em lugares mais tranquilos e simples, perfeitos para a família inteira, vai encontrar uma abundância de pousadas em estilo chalé, como o acolhedor Hotel Tannenhof, um resort rústico de 35 quartos perto de Bruneck (Via Reipertinger 3, Riscone; hotel-tannenhof.it; diárias do quarto duplo a partir de 92 euros).
O Rosa Alpina é o principal hotel de luxo da região, e conta com um restaurante que faturou três estrelas do guia Michelin, spa exclusivo e 51 quartos e suítes no melhor estilo montanhês chic (Strada Micurá de Rü 20, San Cassiano; rosalpina.it; diárias do quarto duplo a partir de cerca de 500 euros).
O Adler Mountain Lodge, no Alpe di Siusi, além de oferecer trinta quartos, divididos entre uma sede moderna e chalés individuais, fica no meio de uma pista de esqui (Via Piz 11, Alpe di Siusi; adler-lodge.com; diárias a partir de 800 euros/pessoa em setembro).