O decreto estadual que impediu a circulação de pessoas na beira das praias gaúchas entre 18h de segunda-feira (1º) e 8h desta terça (2), para evitar aglomerações por conta da covid-19, foi respeitado nas praias do Litoral Norte.
A noite foi tranquila nas orlas de Imbé e Tramandaí. Policiais militares circularam de carro e moto pelas avenidas Beira-Mar, orientando as pessoas sobre a restrição. A medida foi para evitar aglomerações durante as homenagens à Iemanjá, para os praticantes de religiões afro-brasileiras, e à Nossa Senhora dos Navegantes, para os católicos, no sincretismo religioso.
Em Cidreira, onde ocorre anualmente a tradicional festa próxima ao Santuário Sincrético e Ecológico de Iemanjá, o amanhecer deste 2 de fevereiro foi diferente. A área estava vazia. Na beira da praia, oferendas haviam sido deixadas durante à noite, mas sem qualquer aglomeração. Dois carros da BM foram encontrados circulando na orla depois das 6h.
Vinda de Alvorada, a família Ferreira saiu da Região Metropolitana por volta das 3h30min para prestar homenagens à Iemanjá, em Cidreira. Ao contrário de anos anteriores, desta vez, por conta da pandemia de coronavírus, a matriarca Zeneida de Araújo Ferreira, 51 anos, decidiu passar apenas alguns minutos na beira da praia, no início da manhã.
Ao lado do filho, o auxiliar de depósito Christian Ferreira, 27 anos, ela entrou no mar e permaneceu em silêncio. Na beira da praia, dois amigos e uma sobrinha acompanhavam o momento de mãe e filho.
— Entendemos a situação do vazio da praia por conta da pandemia. Por isso, respeitamos e viemos rápido. Nos outros anos, passávamos alguns dias em Cidreira neste período. Desta vez, será um bate-volta apenas para agradecermos e pedirmos saúde, paz e a vinda logo da vacina — contou Zeneida, antes de voltar à Alvorada com a família.
Tramandaí
As irmãs Reci e Maria Pinheiro, de 45 e 44 anos, respectivamente, chegaram de São Leopoldo direto à beira da praia, em Tramandaí, no início desta manhã. Depois de passarem pela imagem de Iemanjá, numa das pontas da praia, as duas se dirigiram à faixa de areia, onde depositaram flores no mar.
Há mais de 30 anos, as duas mantêm a tradição da família de iniciarem o 2 de fevereiro na beira do mar. Ambas de máscara, logo deixaram a orla para retornarem ao Vale do Sinos.
— Este ano está completamente diferente, mais tranquilo e seguro. É necessário não termos aglomeração. Viemos aqui para pedir saúde e sabedoria para todos — comentou Reci, que é terapeuta holística.
Capão da Canoa
A imagem de Iemanjá instalada na orla de Capão da Canoa foi isolada por uma fita zebrada desde o calçadão. Parte dos pedestres parou ao lado, em pedidos ou agradecimentos.
Morador da Serra, Luiz Francisco Guzzi, 57 anos, estava concentrado, de mãos espalmadas e em silêncio em frente à protetora das água. Ele perdeu o filho há cerca de um ano. O jovem foi morto na saída de uma festa.
— Eu estava rezando pelo meu filho. Pedindo pra ele ir em paz. Todo dia eu venho aqui e converso com ele — afirmou o homem, sobre o filho único.
Suliman Soares, 47 anos, saiu de casa às 6h30min para a caminhada matinal. Se surpreendeu com o cumprimento ao bloqueio.
— Pessoal está respeitando muito — afirmou.
Às 7h, nenhuma pessoa tentava ultrapassar o isolamento. Da calçada, a reportagem de GZH não viu ninguém na faixa de areia, próximo à guarita 80.
Já na Zona Nova de Capão da Canoa, faixas de proibição ao acesso foram afixadas sobre uma duna. Em torno de uma dezena de pessoas caminhava na praia, sem aglomerações.
Em Capão Novo, um pequeno grupo foi visto ao lado da imagem de Iemanjá, à beira-mar. A deusa dos mares fica sobre um púlpito a poucos passos das ondas — a manhã foi de maré alta no Litoral Norte. Velas, pequenas embarcações de madeira e as mais variadas oferendas estavam ao lado da escultura.
As pessoas que estavam na areia pertenciam a religiões de matrizes africanas, identificados pelas vestimentas brancas. Apesar do descumprimento do decreto que foi visto, não foi encontrado nenhum excesso no número de veranistas na praia.