Foco de dúvidas e pudores, a sexualidade na velhice acaba se tornando um debate quase interditado em diferentes esferas da sociedade. Mudanças fisiológicas podem alterar funções e sensações, mas não devem anular a atividade sexual com o passar das décadas.
De acordo com a psicóloga e sexóloga Lina Wainberg, o principal fator que preserva a sexualidade na terceira idade é uma sexualidade anterior saudável.
— Há desconhecimento de homens e mulheres em relação às mudanças naturais da resposta sexual com o envelhecimento. Se o futuro idoso souber o que esperar, não vai se frustrar e não vai se sentir incapaz, entendendo o que é natural — afirma Lina, coordenadora da especialização em Sexologia Clínica do Centro de Estudos da Família e do Indivíduo (Cefi).
A especialista destaca o entrave representado pelo aprisionamento à estética e ao corpo jovens. O erotismo, salienta Lina, muda ao longo da vida.
— Se o idoso não puder se permitir ir transformando esse erotismo, não vai permitir, a esse corpo modificado com a idade, poder sentir prazer. Precisa haver uma transformação do erotismo para outros aspectos da vida. A história do casal, a intimidade, a segurança, o bom humor e a inteligência também contribuem para o erotismo — comenta Lina.
Entre os homens, um temor está entre os questionamentos mais frequentes: a impotência é um problema inevitável após os 60 anos? O urologista Ernani Rhoden, presidente da Sociedade Brasileira de Urologia — Seção Rio Grande do Sul, afirma que a disfunção erétil é um problema muito comum nessa faixa etária.
— Com o avanço da idade, existe um declínio das funções fisiológicas do ser humano de uma maneira geral. A função sexual do homem, obviamente, é afetada pela idade — diz Rhoden, também chefe do Serviço de Urologia da Santa Casa e professor da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). — A função erétil nada mais é do que uma função fisiológica que envolve a necessidade de um órgão saudável para que as coisas se processem da maneira normal. Hoje, com o aumento da longevidade, os homens querem viver mais, mas também querem viver com qualidade de vida, e esse é um impacto importante na qualidade de vida. Nós, profissionais de saúde, podemos interferir nisso de maneira terapêutica — acrescenta.
Confira, a seguir, as respostas a algumas das dúvidas mais comuns sobre o tema.
Como fica a sexualidade na terceira idade?
O principal fator que preserva a sexualidade na terceira idade é uma sexualidade anterior saudável.
O que muda em relação ao desempenho masculino?
Há uma mudança importante: aumenta o chamado período refratário, aquele de que o homem precisa para se recuperar após um orgasmo. Ele precisa de mais tempo para ter uma nova ereção. Quem esperava uma resposta rápida pode vir a se frustrar caso não saiba disso.
Também há a necessidade de estímulo físico direto para se ter uma ereção suficiente para a penetração. A psicóloga e sexóloga Lina Wainberg ressalta que homens que não tinham no seu repertório o estímulo do pênis flácido como algo natural podem passar por constrangimentos com o envelhecimento e enfrentar impossibilidade de ereção.
E as mulheres?
As mulheres são menos estimuladas e menos propensas a enriquecer o seu mundo de fantasia erótica, segundo Lina. Elas têm dificuldade de identificar qual é o erotismo que funciona para elas e desconhecem as práticas que mais lhes agradam. Já no universo masculino os estímulos são bem mais comuns, especialmente com a facilidade de acesso a conteúdos no celular.
Para a parcela feminina, quando existem mudanças hormonais afetando a libido, a fantasia sexual se torna imperativa.
— Talvez seja a fase da vida em que as mulheres mais precisam fazer uso do conhecimento sobre o que funciona eroticamente para elas mesmas. Se não costumam dar tempo e vazão a seu mundo erótico, terão dificuldade para dar vazão a isso no envelhecimento — afirma a sexóloga.
A libido muda?
Há, sim, interferência de fatores hormonais, mas a libido tem relação com o espaço e a importância que se dá, na vida, ao prazer. Terá mais ou menos espaço a depender da forma com que cada um lida com esse aspecto.
É possível mudar de comportamento na velhice e passar a dar mais espaço ao prazer?
Nunca é tarde, diz Lina. Outros aspectos de nosso comportamento também mudam com o passar do tempo.
— Se, em determinado momento da vida, a pessoa não tinha a maturidade ou não estava bem resolvida consigo mesma, acho que o envelhecimento nos dá isso. Nos dá segurança, a ideia de que não precisamos mais agradar a ninguém. A autoestima também é um recurso muito interessante para ser utilizado em uma nova descoberta. Tem mulheres que descobrem a sua sexualidade mais velhas — fala a especialista.
A impotência sexual é inevitável?
A disfunção erétil, mais conhecida como impotência sexual, é um problema muito comum a partir dos 60 anos. Quanto mais se avança nas décadas de vida, mais frequente a disfunção erétil se torna.
Quais são os fatores de risco para a disfunção erétil?
Existem diversos fatores de risco que podem aumentar as chances de um homem ter impotência à medida em que envelhece. Além do aumento da idade, estão entre eles a obesidade, o sedentarismo, o tabagismo, o consumo de álcool, as doenças crônicas e o uso de medicamentos.
Estou com dificuldades de ereção. O que fazer?
Procure um urologista, mas seu clínico geral também pode ser o primeiro contato. Esse médico está habilitado a tratar o que estiver dentro de suas possibilidades. No caso de ser necessário ouvir um especialista, ele poderá fazer o encaminhamento.
Como é o tratamento?
O médico deve começar fazendo uma avaliação que inclui exame físico e alguns testes laboratoriais. A causa da disfunção pode estar ligada aos fatores de risco citados acima. Se o paciente enfrenta um ou mais deles, pode começar com uma mudança de estilo de vida: parar de fumar, praticar atividade física, aliviar o estresse. Talvez seja necessária também uma abordagem complementar.
É perigoso tomar remédio para impotência depois dos 60 anos?
Os remédios mais utilizados, como tadalafila e sildenafila, são altamente efetivos, com uso prescrito e orientado pelo médico. De acordo com o urologista Ernani Rhoden, existem incompatibilidades com algumas condições clínicas — é o caso da cardiopatia isquêmica, por exemplo. Não deixe de consultar um médico a respeito do assunto.
Que outras queixas de ordem sexual os homens costumam ter após os 60 anos?
Ejaculação precoce e alteração das sensações de orgasmo também podem ocorrer. Rhoden destaca que problemas de relacionamento com o parceiro ou a parceira podem afetar a sexualidade.
Como manter a vida sexual ativa em casamentos muito longos?
Lina Wainberg acredita que manter o desejo sexual em um relacionamento de longo prazo é um dos maiores desafios da vida. Existe uma diferença de linguagem entre o amor — constância, previsibilidade, conhecimento — e o desejo — descoberta, surpresa, novo.
— Já se sabe qual é a posição preferida, como se aproximar, parece não ter muito o que provocar no outro. Por isso, é importante ter uma vida rica de experiências, se enxergar em locais diferentes, cuidar um do outro, mostrar que deseja, ter admiração. É normal que o relacionamento passe por várias renegociações ao longo da sua história. Se não tiver renegociação, a vida sexual vai minguar — comenta a psicóloga.
O relacionamento entre os parceiros é um item fundamental nessa equação:
— Muitos casais, nas fases anteriores, foram se perdendo sexualmente. Às vezes, há um certo constrangimento em mexer nessa temática. As mulheres podem deixar de falar no assunto, os homens deixam de investir, e aí o casal acaba entrando no marasmo sexual, com mágoas não resolvidas.
Idosos também podem contrair infecções sexualmente transmissíveis (ISTs)?
Quem tem relação sexual desprotegida pode contrair ISTs, não importa a idade. O indivíduo pode estar aparentemente saudável, mas ter contraído uma IST.
Como deve ser feita a prevenção para infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) na terceira idade?
Valem as mesmas orientações para toda a população, independentemente da idade. O uso da camisinha (masculina ou feminina) em todas as relações sexuais (orais, anais e vaginais) é o método mais eficaz para evitar a transmissão de ISTs, HIV/aids e hepatites virais B e C. A camisinha masculina ou feminina pode ser retirada gratuitamente nas unidades de saúde.