O ano de 2020 poderia ser narrado em uma espécie de novo dialeto criado a partir de expressões já existentes, mas até então pouco usadas. Saíram do fundo dos dicionários para a linha de frente das conversas em razão, principalmente, da luta contra uma nova doença, a covid-19, e uma velha chaga, o racismo.
O uso de um conjunto específico de substantivos cresceu de forma exponencial para tentar explicar, monitorar e controlar o avanço da pandemia. O termo mais ouvido das multidões boquiabertas, é claro, foi coronavírus. Mas por trás desse carro-chefe vocabular vieram outras palavras e expressões incomuns no linguajar cotidiano: pandemia, média móvel, imunidade de rebanho, distanciamento social, lockdown.
Também no que diz respeito ao racismo o vocabulário foi incrementado com palavras em língua inglesa, moldando o dialeto de 2020 sem restrições às limitações do português. A morte do negro norte-americano George Floyd, que só conseguiu sussurrar “eu não consigo respirar” antes de perecer sob o joelho de um policial branco de Minnesota, em maio, levou milhares de pessoas às ruas do mundo inteiro para gritar novas palavras de ordem, sendo a principal delas aquela que batizou esse movimento: black lives matter, ou “vidas negras importam”.
Racismo estrutural é o termo que marca 2020. Não tem como não ficar impactado com o preconceito quando há tantas discussões sobre diversidade e inclusão. Grande parte da sociedade já não aceita mais.
PALAVRA DO LEITOR GILSON SPANEMBERG
Engenheiro químico em Porto Alegre
À tradução literal do termo foram incorporadas frases fortes reverberadas por cartazes em protestos que, no Brasil, ganharam novo impulso a partir da morte do gaúcho João Alberto Silveira Freitas, espancado em um supermercado Carrefour de Porto Alegre. No fundo, “parem de nos matar” e “só queremos respirar” propõem reflexões sobre outra das expressões do ano: racismo estrutural. A estrutura social em que nos inserimos está moldada por preconceitos, defendem pesquisadores da área – e agora, em um ano de mortes trágicas bastante midiatizadas, o tema ascendeu definitivamente ao centro dos debates.
O vocabulário de 2021
"No ano que vem, com a chegada dos imunizantes, acho que vamos falar muito de formação de anticorpos, cobertura vacinal e imunidade coletiva, além de reinfecção e também mutação, já que ainda não sabemos se o coronavírus poderá sofrer modificações, como ocorre sazonalmente com o vírus da gripe."
Paulo Petry, epidemiologista da UFRGS