Por Loraine Bohtomé Müller
Professora da Escola de Negócios da PUCRS, coordenadora do MBA em Gestão de Equipe e Liderança
Após um contexto de crise sanitária e financeira de proporções mundiais como a que estamos vivendo, vamos admitir que a balança entre saúde e economia pode se tornar mais equilibrada. Mas essa realidade mudará a gestão de pessoas como a conhecemos?
Talvez. Um estado de caos traz o melhor e o pior de todos à tona. Nossa capacidade de superar adversidades, transcender, pode ser resgatada ou solapada. E trata-se de uma escolha primeiramente pessoal. O brasileiro sabe muito bem, pois o país vive de tombo em tombo. Por isso somos mais maleáveis, risonhos e esperançosos. E, sem dúvida, aguerridos. Assim, indivíduos não saem iguais de um pós-guerra.
Profissionais de várias idades e formações foram jogados despreparadamente em seus home offices. A maioria das casas não dispõe de espaços apropriados para isso, nem para o home school.
Mas podemos fazer com que o momento seja de aprendizado de empatia, respeito e melhor balanço da liberdade individual versus coletiva, ou, contrário disso, podemos exercitar a desordem.
O impacto desse estado na gestão de pessoas se dará na medida das nossas escolhas pessoais. Posso voltar para o meio profissional pós-quarentena melhor ou pior.
Os negócios sempre precisaram de pessoas criativas, competentes, capazes de fazer mais com menos. Ninguém sai de uma crise fazendo o que sempre fez. Não é inteligente.
Vegetar a partir do piloto automático não será mais uma possibilidade. Pais tendo que dar conta de filhos em atividades escolares podem ter repensado a importância dos professores (expressão máxima do desenvolvimento de um país). A geração dita tecnológica se viu frente a entender que redes sociais e jogos não os tornam nativos digitais, mas conseguir criar novas rotinas de estudo e trabalho e proceder a entregas, se disciplinada, os tornam.
Assim, lembrando que as escolhas individuais impactam coletivamente, imagino a gestão de pessoas tendo de lidar com os desafios de manter empregos e fazer a economia reagir. Não há social sem econômico. Imagino que renegociações são oportunas, tais como readequações trabalhistas dentro das flexibilidades legais, mudanças dos pacotes de benefícios (manter o básico, como plano de saúde), além dos planos de remuneração. Cabe a colaboradores e sindicatos darem seu quinhão. Quanto aos empregadores, é oportuno equilibrarem sustentabilidade financeira e respeito aos funcionários. Renegociar pode ser a forma de manter dois empregos ao invés de escolher entre um deles.
Imagino profissionais pós-home office mais autônomos, bem como outros formatos já “pilotados” durante a crise, permitindo mais liberdade no formato de trabalho a ser escolhido daqui para a frente. Precisamos mesmo deslocar tantos profissionais, todos os dias da semana? Que o home office será oficializado como uma realidade, com autonomia e entregas de qualidade, isso pode liberar o trânsito, trazer mais qualidade de vida e mudar a balança de prioridades, trazendo à frente, por exemplo, o tempo em família.
E também haverá oportunidades. Toda crise abre espaços de negócios e demandas ainda não pensadas.
O que, afinal, pode mudar? A forma como nos relacionamos entre nós, com as empresas e com a sociedade. Mas depende das nossas escolhas.
Este artigo integra uma série de cinco textos nos quais, convidados por GZH, pesquisadores refletem sobre mudanças na sociedade pós-pandemia. Leia os demais: