Deve ser retomada nesta quinta-feira (13) pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília, uma das votações mais polêmicas do ano: sobre a criminalização da homofobia (preconceito contra gays, lésbicas e bissexuais) e da transfobia (preconceito contra travestis e transexuais).
Não caberá à mais alta corte do país, entretanto, definir se as condutas devem ser tratadas como crime — as ações em julgamento requerem que o STF declare o Congresso Nacional omisso em relação a ofensas contra o público LGBT+, enquadrando as ofensas como crime de racismo, até que o Legislativo se pronuncie sobre a matéria. Solicita-se também que o STF estabeleça uma data para que os parlamentares votem projetos de lei a respeito do assunto.
Esta será a terceira rodada de votos dos ministros. Até o momento, foram proferidos seis pareceres, todos entendendo que há omissão do Congresso ao não proteger, em lei, a comunidade LGBT+. Em fevereiro, pronunciaram-se Celso de Mello, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso. Na sessão seguinte, em maio, foi a vez de Rosa Weber e Luiz Fux. Restam cinco votantes a se manifestar, concluindo-se, então, o julgamento. O parecer, mesmo que favorável, ainda dependerá de votação na Câmara dos Deputados e no Senado.
A homofobia e a transfobia não estão especificamente tipificadas na legislação penal brasileira. Atualmente, nos casos envolvendo agressões motivadas por preconceito contra indivíduos LGBT+, a conduta é tratada como lesão corporal, tentativa de homicídio ou ofensa moral.
Proposta prevê a inclusão da Lei Antirrascimo
As ações sob análise no STF, de autoria do Partido Popular Socialista (PPS) e da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT), solicitam a criminalização de todas as formas de ofensa, não importa se individuais ou coletivas, além de agressões, discriminações e homicídios motivados pela orientação sexual e/ou identidade de gênero, real ou suposta, de uma pessoa.
A proposta prevê a inclusão da discriminação por orientação sexual e identidade de gênero na lei 7.716/89, chamada de Lei Antirrascimo, que garante que crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia ou religião sejam punidos — de que forma e por quanto tempo, ficaria a cargo do Legislativo decidir.
Em plenário, o ministro Barroso afirmou que começa a se delinear "uma surpreendente unanimidade ou pelo menos uma expressiva maioria" pela criminalização da homofobia. Fachin e Mello, que relatam, cada um, uma das ações sendo julgadas, entenderam que o Congresso Nacional foi omisso ao discutir o tema e que houve uma demora inconstitucional do Legislativo em aprovar uma lei para proteger homossexuais e transexuais. Por isso, segundo eles, cabe ao Supremo aplicar a lei do racismo para preencher esse espaço.
A Advocacia-Geral da União (AGU), em parecer, declarou que os pedidos são "juridicamente impossíveis", pois a Constituição não diz que deve ser feita uma lei para criminalizar a homofobia.
Tire suas dúvidas sobre o tema
O que pode acontecer ao final do julgamento, já com maioria favorável às ações?
O Supremo pode determinar que o Congresso avalie a criação de uma lei tornando crime atos de homofobia. A definição de quais atos seriam considerados crime e qual a pena a ser aplicada seriam estabelecidos pelos parlamentares. Também é possível que o STF decida aplicar uma regra provisória para considerar a homofobia como crime mesmo antes de haver lei aprovada pelo Congresso, que valeria até o Legislativo se manifestar sobre o assunto.
O que seria passível de punição?
Nas ações em julgamento, pede-se a criminalização de todas as formas de ofensa, sejam individuais ou coletivas, além de agressões, discriminações e homicídios motivados pela orientação sexual e/ou identidade de gênero, real ou suposta, de uma pessoa.
Uma lei contra a homofobia feriria a liberdade de expressão?
Este é um ponto controverso. Quem é contra a criminalização da homofobia ou se opõe à sua inclusão na Lei Antirrascimo argumenta que, se todos são iguais perante a lei, dar o "privilégio" de criminalizar um discurso contrário à homossexualidade seria uma agressão ao Estado democrático e a um direito fundamental. Os favoráveis à inclusão específica da discriminação por orientação sexual e identidade de gênero como crime defendem que qualquer pessoa pode se expressar de forma respeitosa, mas sem patrulhamento de consciência.
Como ficariam as religiões contrárias à homossexualidade?
Seguidores de algumas religiões temem que uma das possíveis consequências da criminalização da homofobia seja não ter mais liberdade de pregar contra a homossexualidade em templos, por exemplo. Com isso, entendem, teriam cerceada a liberdade de expressão por professar crenças contrárias à orientação sexual e identidade de gênero da população LGBT+.
E se o Congresso, ainda assim, não legislar sobre o tema?
A decisão do Supremo, na prática, deve causar uma pressão política. É possível que seja estipulada uma data limite para que uma lei que diz respeito a essa questão seja aprovada. Se for definido um prazo e isso for ignorado, será decidido se caberá ao próprio STF considerar identidade de gênero e orientação sexual na lei que proíbe a discriminação por racismo, e se o Estado será o responsável por indenizar essas vítimas.
Como é hoje?
Homofobia e transfobia não estão na legislação penal brasileira, ao contrário de outros tipos de preconceito, como por cor, raça, religião e procedência nacional. A criminalização da homofobia é uma das demandas mais antigas de militantes LGBT+ no Brasil.
O que defende quem acha que homofobia precisa constar na legislação como crime
Advogados que defendem a criminalização destacam a inexistência de lei no Brasil que assegure proteção adequada para a comunidade LGBT+, ressaltando que, em mais de 60 países, há legislação criminalizando a chamada LGBTIfobia.
O que defende quem acha que não deve haver lei específica contra a homofobia
Considerando que o tipo de ofensa ou agressão a homossexuais que configuraria crime já pode ser enquadrado em outros tipos de práticas criminais, há quem entenda que a homofobia não deve ser especificamente incluída na legislação penal brasileira.
O que defende quem acha que não cabe aos ministros do STF julgar esse assunto
A questão é controversa. Câmara e Senado garantem que não estão se omitindo, mas os projetos de lei envolvendo a temática estão parados há anos nas casas.