Decididos a desvendar os mistérios do cérebro e a testar se as convicções dos pacientes podem alterar o resultado de um tratamento, os cientistas reuniram 22 voluntários para uma bateria de exames. No laboratório, sem que os envolvidos soubessem, manipularam suas expectativas em relação à dor. Os resultados foram surpreendentes.
Imagine a cena: acomodados em um aparelho de ressonância magnética, com tubos intravenosos nos braços, os participantes foram expostos a uma dor física, provocada por uma fonte de calor. Pela corrente sanguínea, passaram a receber um analgésico potente.
Em determinado momento, ficaram sabendo que o medicamento seria cortado repentinamente. Quando isso aconteceu, os relatos de sofrimento aumentaram vertiginosamente. Nada demais, não fosse um pequeno detalhe: eles continuavam medicados. O mais curioso é que, por meio de imagens da atividade cerebral dos voluntários, os estudiosos confirmaram que eles realmente sentiam o desconforto relatado. Em outras palavras, a certeza de que a situação iria piorar anulou o efeito do remédio.
- Isso mostra que os médicos não podem subestimar a influência das expectativas negativas que os pacientes têm sobre o resultado de um tratamento - declarou a professora Irene Tracey, do Centro de Ressonância Magnética Funcional do Cérebro da Universidade de Oxford, que comandou o trabalho.
A conclusão também reforça algo que outras pesquisas já vinham apontando. Um levantamento desenvolvido em 2010 pela International Stress Management Association (Isma-BR) revelou que, entre pessimistas inveterados, as chances de desenvolver moléstias - como problemas gástricos, dores musculares, arritmia e taquicardia - são maiores. Pelo menos 94% dos entrevistados disseram sofrer com alguma preocupação crônica, 83% apresentaram sintomas de ansiedade e 79% de angústia.
- Na ciência, classificamos os pessimistas como pessoas que interpretam as dificuldades como fracassos e sempre esperam o pior. Eles sofrem muito. Acham que o mundo é injusto, são inflexíveis e obsessivos - diz a presidente da Isma no Brasil e PhD em Psicologia, Ana Maria Rossi.
Não raro, quanto mais pensamentos negativos nutrem, mais pessimistas ficam. Mas o que está por trás disso? O neurologista Pedro Schestatsky, do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, diz que a explicação passa por um conjunto de fatores. Em geral, sempre que uma pessoa crê que algo vai dar errado e vive uma situação de estresse, um gatilho hormonal é disparado no cérebro, e substâncias como cortisol e adrenalina são liberadas. É como se o órgão percebesse que há algo ruim por vir e preparasse o corpo para a guerra - mantendo-o em estado de hipervigilância.
Em pessoas saudáveis, essas descargas são comuns e até benéficas. O problema é que, no caso dos pessimistas, passam a ser contínuas. O resultado de cascata hormonal é a diminuição da capacidade de suportar a dor e o enfraquecimento do sistema imunológico, abrindo brechas a doenças. Por essa e por outras razões, Schestatsky comemora o resultado da pesquisa britânica:
- O estudo comprova o quanto é importante o médico conversar com seu paciente, entender o que se passa na cabeça dele e trabalhar isso. Não adianta atendê-lo em cinco minutos e prescrever um remédio sem um vínculo terapêutico. Se a expectativa for ruim, tem tudo para dar errado.