As dificuldades do setor automotivo, com a falta de semicondutores, que compromete a cadeira produtiva, poderá ser afetada pela situação política e institucional com o adiamento de investimentos. Apesar da produção prejudicada pela parada total ou parcial de 11 fábricas em agosto, saíram das linhas de montagem 164 mil veículos, 0,3% a mais em relação a julho, e queda de 21,9% ante as 210 mil unidades do mesmo mês em 2020. Como ocorreu em julho, foi o pior resultado para um mês de agosto desde 2003.
O resultado acumulado do ano — 1,476 milhão de unidades — saltou 33% sobre o mesmo período de 2020, que teve uma base muito baixa.
Nos primeiros meses do ano passado, as montadoras paralisaram as linhas de montagem e reduziram a produção para atender medidas sanitárias provocadas pela pandemia do coronavírus, como o distanciamento social e a limitação de funcionários em função da área de operação.
A oferta reduzida de veículos novamente derrubou as vendas. Foram emplacadas 172,8 mil unidades em agosto, com queda de 1,5% sobre julho e 5,8% na comparação com o mesmo mês de 2020. Foi o pior agosto desde 2005. No ano, ocorreram 1,422 milhão de registros, 21,9% a mais sobre igual período de 2020.
As exportações reagiram com o embarque de 29,4 mil veículos, 23,9% a mais sobre julho e 5,5% em relação a agosto do ano passado. Em valores, os US$ 688,7 milhões saltaram 23,2% sobre julho e 33,7% na comparação com o mesmo mês de 2020. No ano, foram exportadas 253,3 mil unidades, mais 43,5% em relação a igual período do ano passado. O equivalente a US$ 4,9 bilhões, 54,9% sobre 2020.
Mercado e estoques
O perfil do mercado brasileiro mudou e, pela primeira vez, os utilitário esportivos venderam mais do que a soma de hatchs e sedãs no país. Os dados divulgados pela Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) nesta quarta-feira (8) mostraram também que os carros híbridos e elétricos tiveram participação recorde nas vendas, com 3.873 unidades, 2,4% de todo o mercado.
Os estoques nas fábricas e nas concessionárias estão sendo consumidos sem condições de renovação nos pátios a curto prazo. A entidade dos fabricantes lembra que, na virada do mês, havia apenas 76,4 mil unidades disponíveis, suficientes para 13 dias de vendas. Motivo que justifica as filas de espera para vários modelos. Foi o pior nível em mais de duas décadas.
Economia e política
A situação dos semicondutores traz uma enorme imprevisibilidade para o desempenho da indústria no restante do ano, explicou Luiz Carlos Moraes, presidente da Anfavea. Num cenário normal, a produção estaria em ritmo acelerado nesta época do ano, quando as vendas geralmente ficam mais aquecidas. O executivo lembrou que, no ano passado, a produção foi boa no segundo semestre.
— Neste ano, temos a volta da demanda, mas infelizmente uma quebra considerável na produção — acrescentou.
O agravamento da crise institucional após os ataques do presidente Jair Bolsonaro ao judiciário preocupa a entidade que representa os fabricantes de veículos. O impacto no câmbio e as dificuldades provocadas pela instabilidade política compromete as negociações por novos investimentos com as matrizes no exterior.
Moraes mostrou a preocupação do setor automotivo pelo atual momento do ponto de vista econômico e das consequências dessa instabilidade política e institucional. Lembrou a ociosidade existente hoje em fábricas de diversos países que podem atrair investimentos que poderiam vir para o país.
O executivo destacou a necessidade do andamento da agenda de reformas no Congresso, em especial a tributária, e de pautas essenciais para a recuperação da economia. Lembrou que são mais de 14 milhões de desempregados, a inflação e os juros estão em alta.
— A questão social é preocupante, porque no final do dia ela gera economia, gera negócios, gera mais carros no final. A gente olha a coisa como um todo. Então a preocupação é muito grande — afirmou.