É muito difícil, talvez impossível, fazer uma análise sobre atitudes ou frases de Jair Bolsonaro sem que haja radicalização e uma guerra de acusações passionais desprovidas do compromisso com a informação. Mesmo assim, é preciso destacar que o presidente demonstrou pouco conhecimento da realidade do esporte em nosso país, pelo menos em uma modalidade, ao se referir a uma pergunta na prova do ENEM.
Sem levar em conta o que pensa Bolsonaro sobre a diferença entre homens e mulheres, isto é sabido e debatido há longo tempo, o que existe de novo na declaração de que o "futebol feminino não é uma realidade no Brasil", é a desinformação do governante em relação ao segmento esportivo.
Não são necessários muitos argumentos ou amostragem de fatos para provar que as mulheres são realidade no futebol brasileiro há bastante tempo. Se esta situação é dura e diferente da modalidade no naipe masculino, ainda enfrentando a necessidade de mais condições e estrutura, isto é apenas parte de um processo de evolução acelerada e que parte de pontos bem sólidos, a começar pelo desempenho de nossa Seleção em competições internacionais, dos certames nacionais organizados e, fundamentalmente pelo fato de termos Marta, a maior jogadora de todos os tempos e eleita por seis vezes como a maior do mundo. Se isto não é real, o que será?
Ignorar o estágio do futebol feminino brasileiro é algo perigoso em ano olímpico. O que dirá o presidente de modalidades menos divulgadas, mas não menos poderosas e midiáticas? Será que ele sabe que existe um Isaquias Queiroz na canoagem? Como são encarados nossos surfistas e skatistas que podem chegar ao ouro em Tóquio? Seria para Bolsonaro uma realidade o tiro com arco ou o tênis de mesa, também com presença certa na Olimpíada?
Não é de se admirar que a resposta da craque Marta tenha sido uma ironia em rede social contra Bolsonaro. Ela é conhecida praticamente no mundo inteiro e está muito longe de fazer parte de um ambiente irreal, mesmo que atue no exterior. Como o esporte não tem ministério exclusivo no atual governo, sendo uma secretaria no ministério da Cidadania hoje comandado pelo gaúcho Onyx Lorenzoni, cabe ao titular da pasta ou o secretário, expor ao presidente quais modalidades são realidade no cenário nacional. Só assim ele não cometerá mais gafes como a que cometeu e poderá ter uma visão bem mais clara do panorama esportivo nacional antes dos Jogos Olímpicos.