Nem o PT, nem os comunistas, nem a mídia, nem os ateus. A maior oposição ao governo federal é, hoje, feita pelo próprio presidente. Jair Bolsonaro implicou com seu principal ministro em tempos de coronavírus. Acha que falta humildade a Luiz Henrique Mandetta. Ameaça demiti-lo e espalha a notícia pelos bastidores. Com isso tenta desgastar o principal gestor da maior crise da história recente do país. É mais ou menos como se o treinador quisesse tirar do time o seu atacante de melhor pontaria na hora da decisão por pênaltis.
Não é de agora que Bolsonaro vem demonstrando publicamente sintomas de paranoia. Mas quando a teoria conspiratória se transfere para o seu próprio governo, temos um caso clinicamente mais grave. O presidente trata seu ministro como se tudo o que ele fizesse tivesse como foco o ataque ao chefe. E, na lógica da patologia, se defende de algo que não existe, atacando.
O presidente do Brasil soma um outro ingrediente à paranoia: ciúmes. Para Bolsonaro, aparecer demais – e mais do que ele – é inadmissível. Até Paulo Guedes já andou levando uns encontrões. Líder é aquele que brilha ao fazer os outros brilharem. Líder, muitas vezes, está além do brilho. Está no resultado. Não para o presidente do Brasil, que deixa a oposição atônita e sem discurso ao ocupar a linha de frente das críticas a seu próprio governo.
Outro destrambelhado da linha de frente do Planalto, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, acha mesmo que, se pedir perdão à China, os respiradores virão. Ou seja, a pressão econômica dos Estados Unidos ficaria em segundo plano se ele, tão relevante que é no tabuleiro da geopolítica mundial, se desculpasse pelas insanidades que postou dias atrás em uma rede social. Weintraub imagina que, em meio ao caos planetário, não se fala em outra coisa em Beijing a não ser dos duros golpes desferidos por ele contra os vermelhos comunistas orientais.
A situação é tão complexa que, hoje, um deputado do PT ou do PSOL que quisesse desgastar Bolsonaro deveria elogiar Mandetta, assim como fazem as vozes lúcidas dentro e fora do governo. Sim, a verdadeira oposição é que apoia o governo, contra o presidente. Tente explicar para o seu filho. Se ele não entender, está de parabéns. Conte para ele a história de O Médico e o Monstro. Mas lembre de explicar que, aqui, Jekyll e Hyde são duas pessoas diferentes. Mas em um mesmo governo.