Compre uma ideia, leve outras 400 e pague por elas sem se dar conta. O artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor proíbe a venda casada. Se você for a um banco pedir empréstimo e o gerente condicionar a liberação da grana à aquisição de um seguro, ele estará atropelando a lei. No caso do debate sobre o futuro próximo do Brasil, essa prática se repete sem pudor e sem disfarce. Embarcamos na fraude sem reagir.
O contraveneno é o uso urgente do senso crítico. Não precisa de receita. Mas é tarja preta. Não compre o que você desconhece só porque vem colado em algo de que você gosta e que apoia. Por exemplo: é possível admirar o juiz Sergio Moro mas achar que ele exagera no protagonismo. Não é crime defender o mandato de Dilma Rousseff mas reconhecer que ela é uma má presidente.
Em vez disso, o que vemos é a adesão cega a teses esdrúxulas, coladas de propósito em arquivos que julgamos seguros. É só clicar e, sem se dar conta, instalar o vírus da ovelinha. Esse que nos transforma em rebanho.
Só porque ideias e atos nasceram de um lado ou de outro da polêmica não significa que sejam razoáveis. É aí que nos tornamos massa de manobra: quando o espaço da ponderação some, quando teses e posturas se transformam em dogmas religiosos. Não se deixe enganar. Você não precisa – e não deve – embarcar na idiotice alheia.
É possível defender o impeachment mas achar que o PT fez algumas coisas boas no poder. É legítimo reconhecer alguns méritos de Lula mas julgar que ele errou ao não explicar até agora o sítio, o triplex e tantas outras nebulosidades. Você pode estar em dúvida. Você pode ter certeza.
Você pode odiar a Dilma mas achar que não há motivo para impeachment. Você pode apoiar o impeachment mas considerar que todo o sistema político brasileiro é podre, e não apenas o PT. Você pode não achar nada. Você pode estar confuso.
Você pode dizer o que pensa e não deveria ter vergonha ou medo. Você pode.
Identidades monolíticas, adquiridas em pacotes prontos, são típicas de ditaduras. São prova de burrice e de submissão. Estamos reeditando o famigerado slogan "Brasil: ame-o ou deixe-o", só que, desta vez, segmentado em duas faltas de opção. É só trocar "Brasil" por "PT" ou por "impeachment". Como se não houvesse matizes e relevos de compreensão. É tudo ou nada, pegar ou largar. Pronto. Mais uma lição desaprendida do passado. Pelo menos nisso nós, os brasileiros, estamos todos do mesmo lado.