Já está disponível na Netflix o filme vencedor do Oscar de melhor documentário, 20 Dias em Mariupol (20 Days in Mariupol, 2023), de Mstyslav Chernov, que registra o início da invasão da Ucrânia pela Rússia em uma das cidades mais devastadas pela guerra deflagrada 24 de fevereiro de 2022.
Com experiência em cobertura de conflitos (esteve no Iraque e no Afeganistão), o ucraniano Chernov foi um dos últimos remanescentes da imprensa em Mariupol, no sudeste do país, onde ele próprio e seus colegas correram risco de morte enquanto trabalhavam — mais de uma vez vemos o diretor fugindo ou se escondendo. Embora não apareça na frente da câmera (com uma única exceção), ele próprio é um personagem, narrando os fatos, fazendo reflexões e interagindo com alguns dos 450 mil moradores.
Antes de ganhar o Oscar, o documentário recebeu o Bafta, da Academia Britânica, e o troféu do Sindicato dos Diretores dos EUA, além de ter sido laureado pelo público no Festival de Sundance de 2023.
O currículo vitorioso não esconde a controvérsia. Para alguns críticos, Chernov é demagogo ao "explorar o sofrimento alheio" e "espetaculariza o horror da guerra", exibindo, por exemplo, crianças mortas e adultos ensanguentados. Uns também reclamam que o filme é "pró-Ucrânia, pró-Estados Unidos, pró-Ocidente", procurando demonizar a Rússia.
Para outros, Chernov é honesto ao expor seu medo, suas dúvidas e seus próprios erros e ao debater sobre o poder das imagens e a ética da profissão. A brutalidade mostrada serve à denúncia de que, ao contrário do que sustentavam as autoridades russas, o exército invasor estava bombardeando prédios civis, inclusive hospitais e maternidades.
No discurso de agradecimento pela estatueta dourada concedida pela Academia de Hollywood, no Teatro Dolby, em Los Angeles, Chernov afirmou:
— Este é o primeiro Oscar da história da Ucrânia. E estou honrado. Mas provavelmente serei o primeiro diretor neste palco a dizer que gostaria de nunca ter feito este filme. Desejo poder trocar isto pelo fato de a Rússia nunca atacar a Ucrânia, nunca ocupar as nossas cidades. Os russos estão matando dezenas de milhares de meus compatriotas. Desejo que libertem todos os reféns, todos os soldados que protegem as suas terras, todos os civis que estão agora nas suas prisões. Mas não posso mudar a história. Não posso mudar o passado.