"A vida é curta. Curta um caso." Esse é o slogan do site de traição — seu público são maridos, principalmente, e esposas infiéis — que é tema da minissérie Ashley Madison: Sexo, Mentiras e Escândalo (Ashley Madison: Sex, Lies & Scandal, 2024), lançada pela Netflix na quarta-feira (15). Em três capítulos, o documentário retrata a ascensão e a queda da rede social canadense surgida em janeiro de 2002 e que tinha 37 milhões de usuários ao redor do mundo em agosto de 2015, quando virou alvo de um ataque cibernético devastador: hackers divulgaram os nomes e dados pessoais dos clientes, provocando crises conjugais, demissões e até suicídios.
Fundado por Darren J. Morgenstern, o Ashley Madison foi batizado assim por causa da popularidade desses nomes femininos nos Estados Unidos — uma pista importante sobre seu interesse em atrair especialmente homens. O primeiro slogan era "Quando a monogamia se torna monotonia", substituído quando Noel Biderman, em 2007, assumiu o posto de CEO.
Biderman mostrou-se um gênio da publicidade e um visionário da internet. Entre as chaves do sucesso do Ashley Madison, estavam o marketing agressivo e o sistema de pagamento. Em vez de cobrar uma mensalidade, ganhava dinheiro em cima de cada interação: se um homem queria mandar mensagem para uma mulher, tinha de comprar créditos. O site também prometia um ambiente absolutamente seguro, com total discrição para quem quisesse pular a cerca. Mas, no fundo, isso era só propaganda, como comenta um dos entrevistados, Evan Back, ex-executivo da empresa.
Com direção geral de Toby Patton, a minissérie traz os depoimentos de usuários do Ashley Madison. Alguns tiveram suas vidas profundamente abaladas. Vide o casal Nia e Sam Rader, que estouraram no YouTube em 2014 graças a um vídeo em que dublavam a música Love Is an Open Door, do filme da Disney Frozen (2013) e viraram astros registrando seu cotidiano familiar — tinham dois filhos e esperavam um terceiro quando ocorreu o vazamento das informações supostamente confidenciais. Não vou contar o que aconteceu com eles porque o documentário é muito hábil em criar suspense e surpreender o espectador.
Além de ser envolvente na narrativa e de revelar bastidores (às vezes inacreditáveis) do empreendimento e da investigação sobre o ciberataque, Ashley Madison: Sexo, Mentiras e Escândalo consegue abordar temas sensíveis. O primeiro, claro, é o que leva alguém a trair sua esposa e o quanto somos capazes de manter tudo em segredo ou de perdoar. Um outro, talvez até mais delicado, tem a ver com a exploração da violação dos dados pela imprensa — nosso apetite pelo escândalo, em um processo de retroalimentação com a sanha moralista da audiência, que ajuda a explicar, também, a cultura do cancelamento. Vale transcrever o que disse uma das entrevistadas no documentário, viúva de um homem que acabou se matando ao ter sua infidelidade exposta:
— O que queremos nesta cultura atual é que alguém erre ou diga uma coisa para querermos erradicá-lo. As pessoas que se debruçavam no vazamento do Ashley Madison procurando nomes fizeram uma caça às bruxas. Como se não tivessem pecado nem culpa. Mas a verdade é que todos temos uma lista da qual não nos orgulhamos, todos temos nossos segredos.
A cidade gaúcha com mais usuários no Ashley Madison
Vou reproduzir aqui trecho de uma curiosa matéria publicada em 15 de fevereiro de 2019 em GZH:
"A notícia de que Guaíba é a cidade gaúcha com mais usuários cadastrados no Ashley Madison, o maior site de traição do mundo, causou repercussão nas redes sociais. De acordo com os dados divulgados pela própria plataforma, dos 113 mil perfis ativos gaúchos, 54 mil estão concentrados em Guaíba, na Região Metropolitana da Capital. Muita gente que leu ficou se perguntando: como é possível que a cidade, com população estimada pelo IBGE de 98 mil habitantes, poderia ter tanta gente assim usando um site de traição?
A justificativa, de acordo com a diretora de comunicações da Ashley Madison, Isabella Mise, está na forma que o site lê os dados de uma cidade. Neste caso, a análise é feita até um raio de 50 km em torno dessa cidade. Ou seja: Guaíba tem, sim, um ponto de maior concentração de usuários dentro desse raio de 50 km, mas essa distância inclui, também, pessoas de lugares próximos. Como, por exemplo, a região central de Porto Alegre. Isabella conta também que as pessoas criam contas nas cidades que estão planejando visitar:
— Já que Guaíba é muito próxima de Porto Alegre, algumas pessoas devem ir para lá. Eles escolheriam um lugar próximo à sua casa, mas longe o suficiente para não conhecer ninguém e não ser descoberto — aposta Isabella."