Recém adicionado ao menu do Amazon Prime Video, Réquiem para um Sonho (Requiem for a Dream, 2000), de Darren Aronofsky, pode ser considerado o filme definitivo sobre as consequências devastadoras da dependência de drogas.
O tema já rendeu um punhado de títulos marcantes, não raro polêmicos ou premiados. Em O Homem do Braço de Ouro (1955), por exemplo, Frank Sinatra interpreta um crupiê de Chicago que, após deixar a prisão, planeja se tornar baterista e se manter longe das drogas. Mas a pressão do antigo chefe e o assédio do traficante local o fazem retornar ao carteado e ao vício em heroína. O filme de Otto Preminger disputou três categorias do Oscar: melhor ator, direção de arte em preto e branco e música original.
Os Viciados é o burocrático nome dado no Brasil a The Panic in the Needle Park (1971), "o pânico no parque da agulha", dirigido por Jerry Schatzberg. Foi o filme de estreia do ator Al Pacino, na pele de Bobby, um traficante pobretão em Nova York que se apaixona pela sem-teto Helen (Kitty Winn, premiada como melhor atriz no Festival de Cannes). Bobby e Helen vão mergulhando num angustiante cenário de consumo pesado de drogas. Um de seus amigos chega a assaltar uma clínica veterinária e a injetar vermífugo na veia.
Eu, Christiane F., 13 Anos, Drogada e Prostituída (1982), de Uli Edel, é inspirado na história real de uma adolescente que, na Berlim da década de 1970, conhece o mundo das drogas e do álcool com um namorado. Vivendo a efervescente vida noturna da cidade, ela logo terá de se prostituir e viver uma rotina de violência para sustentar o vício.
Em Drugstore Cowboy (1989), de Gus Van Sant, dois casais de dependentes químicos (encarnados por Matt Dillon, Kelly Lynch, James LeGros e Heather Graham) percorrem os Estados Unidos roubando farmácias e são perseguidos por um policial.
Em Rush: Uma Viagem ao Inferno (1991), de Lili Fini Zanuck, policial novata (Jennifer Jason Leigh) se torna parceira de tira experiente da divisão de narcóticos (Jason Patric). Durante investigação em que precisam agir disfarçados, eles terminam virando usuários, trilhando perigosamente entre os dois lados da lei.
Há ainda o cultuado Trainspotting: Sem Limites (1996), indicado ao Oscar de roteiro adaptado, em que o cineasta Danny Boyle acompanha um grupo de jovens amigos de Edimburgo, na Escócia, onde um deles (o personagem de Ewan McGregor) tenta pular fora do barco antes que seja tarde demais. E vale destacar o australiano Candy (2006), de Neil Armfield, no qual Heath Ledger é um poeta que se apaixona por uma promissora pintora (Abbie Cornish). O vício deles em heroína, entretanto, faz o casal viver uma decadência física e emocional em meio à marginalidade.
Todos esses filmes, repito, são notáveis. Mas acho que Réquiem para um Sonho é o mais contundente e o mais perturbador — não à toa, jogou holofotes sobre Darren Aronofsky, que já havia chamado a atenção com Pi (1998) e que depois assinaria obras laureadas no Oscar, como O Lutador (2008), Cisne Negro (2010) e A Baleia (2022). Aqui, o cineasta nova-iorquino já trabalhava com algumas de suas marcas: os personagens martirizados e sua jornada espiritual, o corpo violentado refletindo a turbulência psicológica, os cenários confinados e claustrofóbicos.
Trata-se da segunda versão para o cinema do livro Última Saída para o Brooklyn, de Hubert Selby Jr., que coescreveu o roteiro com Aronofsky (a primeira foi Noites Violentas no Brooklyn, dirigida por Uli Edel em 1989). A trama é a seguinte: Harry Goldfarb (Jared Leto, que emagreceu 12 quilos para o papel, um dos melhores de sua carreira) é um rapaz de Coney Island que quer ser rico. Enquanto isso, ele e o amigo Tyrone (Marlon Wayans, despido de sua comicidade) injetam heroína em suas veias. A namorada de Harry, Marion (Jennifer Connelly, em atuação comovente), quer ter uma grife de moda. Enquanto isso, cheira cocaína. O trio vê no tráfico de drogas o caminho para obter o dinheiro que vai realizar seus sonhos.
O quarteto de personagens é completado por Sara, a mãe de Harry, em uma interpretação que valeu a Ellen Burstyn sua quinta indicação ao Oscar de melhor atriz — ela ganhou por Alice Não Mora Mais Aqui (1974) e competiu também por O Exorcista (1973), Tudo Bem no Ano que Vem (1978) e Ressurreição (1980). A senhora Goldfarb quer uma vida mais colorida e menos solitária. Por isso, passa o dia inteiro colada na TV, sempre comendo. Ao ser convidada para participar de seu programa preferido, fica obcecada em emagrecer — passa a tomar pílulas que tiram a fome.
Aronofsky disse que queria filmar "uma descida ao inferno". Mas seu personagens não são retratados como criminosos, pecadores ou gente malvada, e em nenhum momento o olhar do diretor os condena. São pessoas boas, cheias de amor e sonhos, simplesmente corrompidas pelo vício e pela dependência — provocam piedade.
A dolorosa experiência de assistir a Réquiem para um Sonho (vide a célebre cena de Jennifer Connelly no submundo do sexo) é potencializada pela forma narrativa — que, na época, foi simplificadamente classificada como "linguagem de videoclipe". O diretor de fotografia Matthew Libatique e o montador Jay Rabinowitz trabalharam para traduzir visualmente o frenesi causado pela droga e a angústia da fissura. Você deve se preparar para cenas com a tela dividida, cortes rapidíssimos (como aqueles que fazem os alimentos da mesa de Sara sumirem repentinamente, para ilustrar sua voracidade na hora de comer) e sequências delirantes _ tanto a imagem quanto a realidade podem estar distorcidas. E a trilha sonora de Clint Mansell (com a participação do conjunto erudito de cordas Kronos Quartet), às vezes sombria, às vezes nervosa e sobretudo melancólica — mesmo nos momentos "felizes" —, acompanha com perfeição a degradação física e psicológica dos personagens.