Lançado há poucos dias pela Netflix, De Tirar o Fôlego (The Deepest Breath, 2023) é um documentário que faz jus ao título e ao tema — o mundo do mergulho livre. O espectador pode realmente ficar sem ar ao acompanhar a história da italiana Alessia Zecchini e do irlandês Stephen Keenan, contada pela diretora e roteirista Laura McGann com técnicas do suspense. Por isso, tanto melhor será a sua experiência se, como os praticantes desse esporte, você decidir submergir sem equipamento, ou seja, sem muitas informações.
Mas algumas coisas podem e devem ser ditas sobre De Tirar o Fôlego para atiçar sua curiosidade. Por exemplo: esse é um esporte que requer um preparo físico e psicológico monstruosos. No mergulho em apneia, o atleta utiliza somente o ar que armazenou nos pulmões antes de afundar, procurando atingir o maior tempo possível ou a máxima profundidade possível. Não bastasse a imensa pressão da água sobre os órgãos, que ficam sujeitos a graves lesões, há a escuridão do ambiente. E a volta é tão ou mais difícil: nos 10 metros finais, muitos mergulhadores sofrem um apagão, uma perda de consciência que pode ser fatal, causando danos cerebrais ou até a morte.
A propósito, um dos cenários é o Blue Hole (buraco azul, em inglês), em Dahab, no Egito, considerado um dos locais mais famosos para o mergulho livre. Perigosíssimo, já matou mais gente do que o Monte Everest, nos Himalaias. Calcula-se que pelo menos cem mergulhadores já deixaram suas vidas no sumidouro que chega a ter 120 metros de profundidade e uma estrutura claustrofóbica e desorientadora, batizada de O Arco. Em 1997, os corpos entrelaçados de dois jovens mergulhadores foram resgatados. É provável que um tenha agarrado o outro enquanto entrava em pânico, arrastando para a morte o companheiro.
Qual é a recompensa para quem se arrisca tanto? Além dos troféus e dos recordes — e também além do desafio à morte —, os mergulhadores dizem que esse esporte proporciona uma conexão extraordinária com a natureza e consigo mesmo. No lugar mais silencioso da Terra, encontram a paz interior e passam a conhecer seu corpo e sua mente de um modo quase impossível na superfície.
Não quer dizer que possamos chamar de tranquilos todos os praticantes de mergulho livre. A italiana Alessia, mostra o documentário, combina talento nato a uma obstinação vista como imprudente por outras pessoas do meio. Mas ela acabou descobrindo uma espécie de porto seguro no irlandês Stephen, que antes de virar mergulhador havia se aventurado pela África, dando vazão aos sonhos alimentados pela leitura das revistas National Geographic (ele queria, por exemplo, conhecer os gorilas do Congo).
E mais não dá para contar, para não tirar o impacto deste documentário que mescla um vasto material de arquivo com entrevistas e reconstituições de uma maneira eletrizante e aflitiva. Em pelo menos um momento eu tive de apertar a tecla de pause para dar uma respirada.