Vencedor do Leão de Ouro e do troféu da Federação Internacional dos Críticos de Cinema (Fipresci) no Festival de Veneza do ano passado e laureado com o César de atriz mais promissora (Anamaria Vartolomei), O Acontecimento (L'Événement, 2021) acaba de "ganhar" outro reconhecimento. Nesta quinta-feira (6), o Prêmio Nobel de Literatura foi concedido à escritora francesa Annie Ernaux, autora do livro autobiográfico que deu origem ao filme disponível na plataforma de streaming HBO Max.
Destaque do mais recente Festival Varilux de Cinema Francês, O Acontecimento é dirigido pela francesa de origem libanesa Audrey Diwan. O filme dá sequência a uma tradição: a das obras sobre aborto que são premiadas em importantes festivais ou premiações.
Um Assunto de Mulheres (1988), do também francês Claude Chabrol, valeu à atriz Isabelle Huppert a Copa Volpi no Festival de Veneza e concorreu ao Globo de Ouro de melhor filme internacional. O Segredo de Vera Drake (2004), do inglês Mike Leigh, ganhou o Leão de Ouro e o troféu de interpretação feminina (Imelda Staunton) em Veneza, faturou três Baftas e disputou três categorias do Oscar: direção, roteiro original e atriz. 4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias (2007), do romeno Cristian Mungiu, conquistou a Palma de Ouro no Festival de Cannes e foi indicado ao Globo de Ouro. Aprendendo com a Vovó (2015), do nova-iorquino Paul Weitz, entrou na lista dos 10 melhores títulos independentes elaborada pela National Board of Review (NBR). Nunca, Raramente, Às Vezes, Sempre (2020), da estadunidense Eliza Hittman, recebeu o Grande Prêmio do Júri no Festival de Berlim e uma distinção pelo neorrealismo no Festival de Sundance. Lingui (2021), do chadiano Mahamat-Saleh Haroun, foi escolhido pela NBR como um dos cinco estrangeiros da temporada passada.
O Acontecimento se passa na França de 1963, mas seu tema adquiriu enorme atualidade no mundo de 2021. No Brasil, veio à tona o caso da menina de 11 anos que teve negada pela Justiça a interrupção da gravidez, prevista em lei, pelo fato de a garota ter sido vítima de estupro e correr risco. Nos EUA, a Suprema Corte revogou a decisão conhecida como Roe vs. Wade, de 1973, que garantia direito ao aborto às mulheres de todo o país. Agora, a decisão passa a ser dos Estados.
Na trama, Anamaria Vartolomei interpreta Anne, uma estudante promissora que descobre estar grávida. Em nome de seu futuro, ela decide abortar, desafiando a lei e os preconceitos em uma jornada por conta própria. De modo seco e amparada pela atuação estoica de Vartolomei, a diretora Audrey Diwan retrata o quão solitária — e, também por isso, perigosa — pode ser a luta das mulheres por seus direitos.