A lista de hoje é dedicada a quem, como eu, costuma ficar com o pé atrás antes de começar a ver uma série que tem muitas temporadas, mas ao mesmo tempo sente vontade de acompanhar o desenrolar de uma história em mais do que as duas horas de um filme.
Separei 10 seriados curtos e minisséries disponíveis nas plataformas de streaming. São dramas, comédias, policiais, adaptações de quadrinhos de super-herói, reconstituições históricas...
Todas as obras têm de quatro a 10 episódios, como uma única e justificada exceção, e todas foram premiadas, com uma única e, na minha opinião, inexplicável exceção. Clique nos links se quiser saber mais.
Olive Kitteridge (2014)
Não apenas em sala de aula mas também no ambiente familiar, a professora Olive dá ordens e mantém um olhar amargurado, que afeta principalmente seu marido, um farmacêutico pacato, e o filho. Essa é a protagonista de Olive Kitteridge, adaptação de um romance homônimo de Elizabeth Sprout dirigida pela cineasta Lisa Cholodenko. Com quatro episódios, foi um arraso no Emmy, levando oito prêmios: melhor minissérie, direção, atriz (Frances McDormand), ator (Richard Jenkins), ator coadjuvante (Bill Murray), roteiro (Jane Anderson), elenco e edição. (HBO Max)
Fleabag (2016-2019)
É a única exceção no limite de 10 episódios: somando a primeira e a segunda temporada, tem 12, mas são curtos, menos de meia hora cada. Venceu seis prêmios Emmy em 2019, incluindo melhor série de comédia — embora trafegue bastante pelo drama também —, atriz (Phoebe Waller- Bridge), direção (Harry Bradbeer) e roteiro (da própria Waller- Bridge). A protagonista é uma mulher solteira, dona de uma café não muito frequentado em Londres, com problemas de relacionamento com a irmã, o cunhado, o pai e madrasta (a brilhante Olivia Colman) e sempre à procura de sexo para aplacar sua solidão. Essa personagem desconcerta o público ao quebrar a quarta parede: no meio dos diálogos, se vira para a câmera e faz uma careta ou dispara uma tirada irônica. Em outras vezes, no entanto, a máscara cai e nos vemos diante do seu choro e das suas aflições. Ah, vale avisar: na segunda temporada, surge um padre (Andrew Scott) para bagunçar ainda mais a vida dela. (Amazon Prime Video)
The Night Of (2016)
Filho de imigrantes paquistaneses em Nova York, o jovem universitário Nasir Khan, o Naz (Riz Ahmed), pega "emprestado" do pai o táxi para ir a uma festa. No meio do caminho, em duas ocasiões pessoas tentam embarcar no carro como passageiro. Mais tarde, uma infração de trânsito, um objeto levado da cena de um crime e uma testemunha ocular vão tornar Naz o suspeito número 1.
É esse o resumo do primeiro e fabuloso episódio da minissérie em oito episódios criada pelo escritor Richard Price e pelo cineasta Steven Zaillian. Trata-se de um retrato minucioso e muito humano das delegacias de polícia, do sistema judicial e dos presídios estadunidenses. À trama de suspense — a certa altura não saberemos se Naz é uma ovelha ou um lobo —, adiciona conotações culturais, políticas e sociais, refletindo o estado de ânimo nova-iorquino para com os muçulmanos pós-11 de Setembro e mostrando penitenciárias como fábricas de bandidos. À excelência do roteiro e da direção, soma-se a do elenco. Ahmed ganhou o Emmy de melhor ator, categoria em que também competia John Turturro, no papel do advogado de porta de cadeia John Stone. Bill Camp concorreu a coadjuvante na pele do detetive Dennis Box, assim como Michael Kenneth Williams, que faz o presidiário Freddy Knight. Todos trazem uma série de nuances a seus personagens, aumentando o envolvimento do espectador com uma história por si só cheia de matizes sobre o certo e o errado, o bom e o mau, a justiça e a lei, as percepções e as evidências. Recebeu outros quatro prêmios no Emmy, incluindo o de melhor fotografia. (HBO Max)
Dois Irmãos (2018)
Diretor das belíssimas minisséries Hoje É Dia de Maria (2005) e Capitu (2008), infelizmente indisponíveis no streaming, Luiz Fernando Carvalho comanda a adaptação de Maria Camargo para o premiado romance homônimo de Milton Hatoum. A história de Dois Irmãos se passa em Manau, entre as décadas de 1920 e 1980, e é narrada por Nael (vivido por Irandhir Santos), filho de uma indígena que trabalha para uma família rica de ascendência libanesa. Os personagens principais são os gêmeos idênticos Omar e Yaqub (interpretados por Enrico Rocha e Lorenzo Rocha na infância, por Matheus Abreu na adolescência e por Cauã Reymond na fase adulta). De personalidades conflitantes, eles disputam desde cedo a atenção dos pais, Halim (Antonio Caloni/Antonio Fagundes) e Zana (Juliana Paes/Eliane Giardini), e, posteriormente, o amor da jovem Lívia (Monique Bourscheid/Bárbara Evans). A minissérie tem 10 episódios e ganhou da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA) os troféus de melhor diretor e melhor atriz (Juliana Paes). (Globoplay)
A Maldição da Residência Hill (2018)
Criada e dirigida pelo estadunidense Mike Flanagan, a minissérie em 10 episódios adapta o clássico romance de terror A Assombração da Casa da Colina (1959), de Shirley Jackson. A trama alterna duas linhas de tempo: na vida adulta, cinco irmãos continuam lidando com os traumas das experiências paranormais vividas na infância em uma mansão que os pais, Hugh (Henry Thomas) e Olivia (Carla Gugino), iriam reformar para depois vender por um preço mais alto. Eles são Steven (Michiel Huisman), escritor de livros sobre casas mal-assombradas, Shirley (Elizabeth Reaser), que prepara corpos para serem enterrados, Theodora (Kate Siegel), psicóloga infantil, e os gêmeos Luke (Oliver Jackson-Cohen), um dependente químico, e Nell (Victoria Pedretti), a mais atormentada quando pequena - via Moça do Pescoço Torto. Cada um deles representa os estágios do luto: negação, raiva, barganha/negociação, depressão e aceitação. Além de boas atuações e de uma atmosfera tensa, com direito a alguns sustos nada gratuitos, A Maldição da Residência Hill se destaca pela excelente parceria entre a direção de fotografia e o time de editores. Inexplicavelmente, não foi indicada em nenhuma categoria do Emmy, do Globo de Ouro ou do prêmio do Sindicato dos Atores dos EUA. Só pode ter sido o célebre preconceito contra o gênero do terror. (Netflix)
Chernobyl (2019)
Criada por Craig Mazin, a minissérie em cinco episódios apresenta uma versão ficcional do pior acidente nuclear da história, o da usina de Chernobyl, ocorrido entre 25 e 26 de abril de 1986 perto da cidade de Pripyat, na Ucrânia. Ao reconstituir suas consequências imediatas e as primeiras ações tomadas pelo governo soviético, a obra ganhou assustadora atualidade durante a pandemia: cenas e falas parecem refletir o que vimos e ouvimos desde o surgimento do coronavírus. Chernobyl arrebatou 10 prêmios Emmy, incluindo melhor minissérie, e concorria a outros nove, entre eles ator (Jared Harris, no papel do renomado químico Valery Legasov), atriz coadjuvante (Emily Watson, como a fictícia cientista Ulana Khomyuk) e ator coadjuvante (Stellan Skarsgård, que interpretou Boris Shcherbina, vice-presidente do Conselho de Ministros da URSS de 1984 a 1989, designado para supervisionar a gestão da crise). O elenco multifacetado — que inclui Jessie Buckley como a esposa grávida de um bombeiro e Paul Ritter como o engenheiro que comandou o fatídico teste na usina —permite enxergarmos as dimensões científica, política e humana do desastre. (HBO Max)
Olhos que Condenam (2019)
Em quatro episódios, a cineasta Ava DuVernay dramatiza um dos maiores erros da polícia e da Justiça nos EUA: o caso dos Cinco do Central Park. No Harlem, em Nova York, os adolescentes negros Raymond, Kevin, Korey, Yusef e Antron brincam e jogam basquete até serem apanhados por policiais. Acabarão acusados e condenados pelo estupro de uma mulher branca que corria no parque na noite de 19 de abril de 1989. Olhos que Condenam ganhou os Emmys de melhor elenco e de melhor ator (Jharrel Jerome, no papel de Korey Wise). (Netflix)
Watchmen (2019)
Damon Lindelof pega elementos da HQ de Alan Moore e Dave Gibbons (a chuva de lula, personagens como Ozymandias e Dr. Manhattan) e cria uma trama central totalmente nova e absolutamente atual. Os novos heróis, como a Sister Night (Regina King) e o Looking Glass (Tim Blake Nelson), lidam com a violência contra negros nos EUA. O inimigo é uma organização racista, a Sétima Kavalaria. Desde a abertura, que reencena o Massacre de Tulsa, em 1921, durante anos apagado da história oficial, Watchmen mostra como os traumas da escravidão passam de geração a geração. Foram 11 troféus no Emmy, incluindo melhor minissérie, atriz (Regina King), ator coadjuvante (Yahya Abdul-Mateen II) e trilha sonora (Trent Reznor e Atticus Ross). (HBO Max)
Mare of Easttown (2021)
Fascinada com o "quem foi" da minissérie em sete episódios criada por Brad Inglesby, Kate Winslet ressaltou que embarcou no projeto porque "não é só a história de um crime". De fato, o crime descoberto no primeiro capítulo é chocante e misterioso, mas serve sobretudo como catalisador dos dramas pessoais e familiares em cidadezinha dos EUA. A morte traz à tona relações e segredos guardados em vida, imagem reforçada pela ambientação numa estação fria, que obriga os personagens a se esconderem atrás de casacos, mantas e gorros. E — até o final — todos têm o que ocultar ou algo do que não gostam de falar. Mare of Easttown venceu os Emmys de atriz (Winslet, também premiada no Globo de Ouro, ator coadjuvante (Evan Peters), atriz coadjuvante (Julianne Nicholson) e design de produção. (HBO Max)
The White Lotus (2021)
Em seis episódios, a série criada por Mike White consegue conjugar de modo brilhante comédia cáustica, dramas empáticos, mistério policial e crítica social — o alvo é o privilégio branco, a elite que jamais cede seu lugar ou estende a mão sem querer nada em troca. A trama começa em um saguão de aeroporto, onde descobrimos que alguém foi assassinado no White Lotus, um resort de luxo no Havaí. Aí, a história recua uma semana no tempo para acompanhar a chegada de um grupo de novos hóspedes, que inclui o milionário mimado Shane (Jake Lacy), recém casado com Rachel (Alexandra Daddario), uma jornalista em crise existencial, e a família da empresária Nicole (Connie Britton). Essa turma será recepcionada pelos empregados do resort. Entre esses, destaca-se Armond (Murray Bartlett), o gerente com um bigode tipo o do Tom Selleck, que define a classe trabalhadora aos olhos dos ricos: precisa ser invisível, mas estar sempre pronta para servir. The White Lotus foi eleito uma das 10 melhores séries de 2021 pelo American Film Institute, disputou o Globo de Ouro de atriz coadjuvante (Jennifer Coolidge) e concorre a dois troféus do Sindicato dos Atores dos EUA: ator (Bartlett) e atriz (Coolidge). (HBO Max)