Ao misturar a dor física com a dor psicológica e explorar a relação entre sanidade mental e devoção religiosa, Saint Maud, que entrou em cartaz neste ano no Google Play, no YouTube e no Vivo Play, é um dos mais impactantes títulos de terror dos últimos tempos.
Dirigido pela inglesa Rose Glass, 31 anos, e lançado no circuito dos festivais em 2019, ganhou destaque nas premiações de 2021 no Reino Unido. Por exemplo, concorreu ao Bafta de melhor filme britânico, recebeu os troféus Douglas Hickox (para obras de estreia) e de fotografia (assinada por Ben Fordesman) no British Independent Film Awards e foi laureado pela associação dos críticos de Londres.
Escrita pela própria diretora, a história se passa em uma cidadezinha litorânea da Inglaterra. A "santa Maud" é uma jovem enfermeira interpretada por Morfydd Clark, atriz galesa nascida na Suécia que será vista como a Galadriel da série O Senhor dos Anéis, no Amazon Prime Video.
Maud é contratada para cuidar de uma coreógrafa que decidiu sofrer em casa seu câncer em estágio avançado, Amanda, papel de Jennifer Ehle (de O Discurso do Rei). A enfermeira assume o trabalho como se fosse uma missão religiosa, a de salvar não o corpo, mas a alma da paciente.
Isso ela revela ao espectador nas conversas que tem com ninguém menos do que Deus. Na verdade, solilóquios narrados em off que permitem perceber o quão perturbada é a protagonista. O corpo paga o preço pela mente: Maud exibe cicatrizes na barriga, coloca a mão no fogo, literalmente ajoelha-se no milho.
Saint Maud acerta em praticamente tudo. É enxuto — tem apenas 84 minutos, suficientes para desenrolar a trama sem enrolá-la novamente e adequados para não martirizar também a experiência do espectador. A trilha sonora composta por Adam Janota Bzowski atordoa, a edição de Mark Towns (o mesmo de O Ritual) perturba quando insere flashes rápidos em meio a cenas mais demoradas, e a atmosfera do filme é sufocante, graças a uma direção de fotografia que mescla cores quentes (como o vermelho e o amarelo) e ambientes escuros. Morfydd Clark nos conduz pela mão por seu mundo solitário e autodestrutivo, mas Rose Glass nunca perde o controle da situação: ela sabe exatamente a história que está contando, sem deixar margem para dúvidas, o que torna ainda mais incandescente seu final. Tão cedo não se apagará da memória.