A indicação de Bacurau ao Gotham Awards, noticiada na sexta-feira (13), atiçou a imprensa e talvez o público: seria um sinal de que o filme brasileiro está, de fato, na briga pelo Oscar 2021. Não é bem assim.
O ótimo longa-metragem dirigido por Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, que no Festival de Cannes do ano passado dividiu o prêmio especial do júri com o francês Os Miseráveis, aparece entre os seis concorrentes a melhor filme internacional. Os outros são Uma Mulher Alta (Rússia), Mignonnes (França) — ambos já comentados aqui na coluna —, Martin Eden (Itália), Sin Señas Particulares (México) e Wolfwalkers (uma animação coproduzida por Irlanda, Luxemburgo e França).
Com cerimônia marcada para 11 de janeiro de 2021, o Gotham é, sim, considerado um termômetro para o Oscar, porque abre a temporada de premiações nos Estados Unidos. Uma indicação gera, no mínimo, zunzunzum sobre o filme. Já houve casos recentes de títulos ganhadores do Gotham, como História de um Casamento (2019), que depois disputaram o Oscar de melhor filme.
Mas deve-se levar em conta que o troféu é exclusivo para produções independentes. Há um teto de US$ 35 milhões no orçamento — ou seja, sequer eram elegíveis ao Gotham obras como Destacamento Blood, de Spike Lee, e Mank, de David Fincher, bem cotadas para a premiação da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, que vai anunciar seus indicados em 15 de março (a pandemia de coronavírus obrigou o adiamento da cerimônia para 25 de abril).
Só que esse não é o principal motivo para frear as expectativas em relação a Bacurau. A questão central é que, repito, o título brasileiro foi indicado a melhor filme internacional, uma categoria na qual não pode mais concorrer no Oscar.
Para resumir: cabe a cada país selecionar um candidato ao Oscar de melhor filme internacional. Bacurau estava na briga para a edição 2020, mas perdeu para A Vida Invisível na votação da Academia Brasileira de Cinema (ABC). Mesmo que a ABC quisesse dar uma segunda chance, isso não seria possível. Como estreou comercialmente no Brasil em 23 de agosto de 2019, Bacurau está fora das regras estabelecidas para o Oscar 2021 — o longa deve ter sido lançado em seu país de origem no período entre 1º de outubro de 2019 e 31 de dezembro de 2020.
Portanto, a indicação ao Gotham pode, na melhor das hipóteses, gerar um zunzunzum que alimenta a esperança de Bacurau repetir o feito de Cidade de Deus (2002). Fora da lista de indicados ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2003, no ano seguinte, graças ao sucesso nos Estados Unidos, a obra disputou as estatuetas de direção (Fernando Meirelles), roteiro adaptado, fotografia e edição.
Bacurau tem chances? Claro. E sua distribuidora nos EUA, a Kino Lorber, vai fazer campanha. Sua diretora executiva, Wendy Lidell, acredita que, depois da vitória de Parasita e das crescentes reformas da Academia visando a uma internacionalização do prêmio, "é bem provável que haja pelo menos um longa não americano indicado ao Oscar de melhor filme”. Mas ainda é cedo para palpitar com mais entusiasmo. Falta, por exemplo, ver se o filme emplaca nas listas de melhores do ano dos críticos americanos, o que pode influenciar os votantes de outras premiações tidas como antessala da cobiçada estatueta dourada.