Dias atrás, escrevi uma nota sobre a decisão do médico Thalis Bolzan, marido do governador Eduardo Leite, de se transferir de São Paulo para o Rio Grande do Sul e aqui exercer sua atividade profissional.
Era uma nota despretensiosa, que eu daria se os personagens fossem um governador heterossexual e sua esposa, caso ela morasse em outro Estado, porque são pessoas públicas.
O que me espantou foi que tão logo a nota foi publicada em GZH comecei a receber comentários no meu e-mail e nas redes sociais do tipo “e eu com isso?”, “essa nota mudou minha vida”ou “a coluna Política e poder virou uma coluna de fofocas”.
Acostumada aos ataques nas redes sociais, não me abalei, mas resolvi dar uma espiada nos comentários da matéria e fiquei impressionada. Além desses mais leves, como os citados, deparei com uma avalanche de mensagens grosseiras, homofóbicas, hostis ou francamente desinformadas.
Alguns leitores, querendo me dar lição de língua portuguesa, me chamaram de ignorante em mensagens diretas por chamar Thalis de marido do governador. Insistiam que as expressões marido e esposa só servem para casamentos entre homem e mulher.
Não adiantou explicar que é assim que Leite e Thalis se chamam e que “companheiro” pode ser uma opção de qualquer casal, mas na comunidade LGBT+ é usual se chamar de marido e de esposa. Aliás, o que temos nós a ver com a vida dos outros? Convém lembrar que Leite se elegeu para o segundo mandato depois de ter assumido a relação com Thalis, o que é uma façanha em um Estado conhecido pelo machismo.
Ora, se a notícia não interessa, como explicar que tenha sido a mais lida da minha coluna naquela semana e talvez de todo o mês de dezembro? Se o assunto não me interessa, passo para outro. Por que comentar e atacar o que deveria simplesmente ser ignorado se não importa?
A partir desse episódio resolvi revisitar a Threads, rede social que pretendia concorrer com o Twitter (ou X, como agora se chama), e olhar os comentários em notícias sobre celebridades ou novelas no Instagram e no Facebook. Quando estive no hospital, um dia terminei o livro que levara na bagagem e passei um tempo rolando as timelines dessas redes mais conhecidas. Impressionante a quantidade de pessoas que comentam em posts de desconhecidos.
Na Threads, alguém escreve um post em pedaços sobre encontros e desencontros amorosos e logo aparecem os comentadores com histórias parecidas ou querendo saber o desfecho. Qual o interesse nas histórias alheias? Com as celebridades, nem se fala.
Acho que foi no hospital, em outra internação, que descobri a existência de Virgínia. Não, não se tratava de Virgínia Wolf, mas de uma moça bonita, com dois ou três filhos, influencer que ostenta sua riqueza material e fatura milhões com essa exposição. E eu com isso? Eu, nada. A mim os influencers não me influenciam. Então que sigam suas vidas, mas cada post sobre a moça tinha uma quantidade absurda de comentários, alguns com alto teor de agressividade. Por que, Senhor?
Notas sobre novelas são outra fonte inesgotável para estudo de algum antropólogo interessado em escrever um ensaio sobre a solidão na era digital.
Os comentaristas, que às vezes passam a ideia de robôs programados para comentar e ampliar o engajamento, xingam o autor e os atores, não deixam pedra sobre pedra, mas mostram que vêm a novela em questão.
E discutem entre eles, talvez porque lhes falte uma roda de chimarrão ou de chope, um chá com as amigas, um trabalho produtivo (manual ou intelectual), uma caminhada diária para olhar vitrines, um cachorro, um bom livro, uma família para discutir política sem se agredir, um par com quem conversar sem que estejam os dois com os olhos grudados no celular.