A presença do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, em Brasília provocou uma onda de indignação contra o presidente Lula por receber um ditador com honras de chefe de Estado. Maduro não é o tipo de pessoa com quem um democrata gostaria de dividir a mesa do jantar, mas é curioso que entre os mais indignados com a visita estejam figuras que apoiaram sem ressalvas a ditadura militar brasileira, caso do senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) e do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP).
A ditadura da Venezuela incomoda os democratas por uma questão de princípio: regimes autoritários, sejam de esquerda ou de direita, devem ser repudiados. A ditadura brasileira (1964-1985) censurou, cassou mandatos, sequestrou, torturou e matou em nome do combate ao comunismo.
Saudosistas dos Anos de Chumbo não se incomodaram de ter um presidente que elevou o general Brilhante Ustra à condição de ídolo e passou essa admiração a seus descendentes. Nessa visão distorcida de democracia, ditadura é coisa da esquerda. Ou de países pobres. Certo estava Ulysses Guimarães, que em uma de suas declarações inesquecíveis disse que tinha ódio às ditaduras. Ódio e nojo.
Para uma parte do Congresso, só Venezuela e Cuba são ditaduras. Da China, da Rússia, da Arábia Saudita e de outros não se fala, ainda que também não respeitem a liberdade de expressão nem os direitos humanos, não tolerem a oposição e não tenham eleições livres.
Qual a diferença, afinal? China, Rússia e Arábia Saudita são grandes players globais. Se adotarem alguma sanção, a economia brasileira terá prejuízo. Cuba nada tem a oferecer, além de belas praias.
A Venezuela produz petróleo, mas empobreceu com Hugo Chávez e Maduro, porque não soube aproveitar o ouro negro. São países de população pobre, sem poder de pressão. Ninguém quer saber de briga com parceiros comerciais, mesmo que seus ditadores sejam tão sanguinários quanto os de esquerda ou que suas eleições sejam de faz de conta.