Como até aqui o governo do presidente Lula não enfrentou nenhum teste no Congresso, exceto a votação da PEC da Transição, ainda não se sabe qual é o tamanho da base aliada, mas já é possível dizer que os problemas que alimentam a oposição têm origem doméstica. Do presidente com suas falas fora do lugar aos ministros que se precipitam no anúncio de medidas, passando pelas invasões de terra do MST e as intervenções indevidas da primeira-dama, o governo e seus satélites têm fornecido material para os adversários inundarem as redes sociais.
As declarações infelizes sobre a Ucrânia, que o obrigaram a fazer um remendo nesta terça-feira (18), foram as últimas munições distribuídas por Lula à oposição. Antes, o presidente atravessou a rua para pisar numa casca de banana quando insinuou que os planos do PCC para matar o senador Sergio Moro seriam uma armação do ex-juiz que o condenou à prisão.
Lula também exagerou na dose em sua briga com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, pela redução dos juros. Embora tenha o apoio de empresários e da população em geral na defesa do juro menor, o confronto com o presidente do BC não produziu resultados concretos e o Brasil segue com a mais alta taxa real do mundo.
Acostumado a ser oposição, o PT ainda não entendeu que é governo e seus líderes sabotam o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que vive de apagar incêndios. A presidente do partido, Gleisi Hoffmann, tem se especializado em criar problemas para o governo com declarações que alvoroçam o mercado e em nada contribuem para distensionar o clima de permanente confronto. Outras alas do partido, como a executiva no Rio Grande do Sul, pedem explicitamente mudanças no arcabouço fiscal, no intuito de flexibilizar a regra desenhada pelo time de Haddad.
No front interno, o governo Lula enfrenta críticas por ações da primeira-dama Janja, como a compra de um sofá por R$ 62 mil e um conjunto de cama e colchão por R$ 43 mil. Ainda que sejam móveis incorporados ao patrimônio da União, o preço é alto demais. Janja também planejava gastar R$ 100 mil para mobiliar o escritório em que vai trabalhar, mas teria sido contida pelo chefe da Casa Civil, Rui Costa.
A primeira-dama está no centro de outra polêmica. Depois de uma postagem equivocada, dizendo que seriam as empresas chinesas como Shein e Ali Express a pagar impostos, e não o consumidor, Janja descobriu que o fim da isenção de US$ 50 nas compras internacionais prejudicaria o comprador. Foi ela quem convenceu Lula a recuar, deixando mal os técnicos que conceberam a medida porque comprovaram que os sites driblam a lei e despacham mercadorias como se fossem de pessoa física para pessoa física. E assim, uma fonte de aumento da receita secou antes de render o primeiro real.
A taxação das compras no Exterior foi mal comunicada desde o primeiro momento. As diferentes versões mostraram que o governo estava batendo cabeça. Foi assim também quando o ministro da Previdência, Carlos Lupi, anunciou um teto de juros para empréstimos consignados, os bancos suspenderam os financiamentos e Lula teve de intervir e elevar a taxa.
Por falar em ministros problemáticos, Lula manteve o das Comunicações, Juscelino Filho, apesar da enxurrada de denúncias de irregularidades, que vão do uso de verba do orçamento secreto para pavimentar a estrada que dá acesso a sua fazenda à viagem com dinheiro público para participar de um leilão de cavalos de raça em São Paulo. Outra ministra, a do Turismo, conhecida como Daniela do Waguinho, ainda não disse a que veio, mas trouxe problemas para o governo. Primeiro, por aparecer em fotos ao lado de um miliciano conhecido da polícia. Segundo, por ameaçar sair do União Brasil, partido que tem um pé no governo e outro na oposição.
Como se tudo isso fosse pouco, o MST retomou as invasões de terra, azedando ainda mais as relações de Lula com o agronegócio. A volta do Abril Vermelho apavora os fazendeiros, que temem a invasão de terras produtivas diante do conceito impreciso de “função social da terra”, usado pelo movimento.