Criado para modular investimentos sociais e controlar os gastos do governo, fornecendo credibilidade à equipe econômica e segurança ao mercado, o novo arcabouço fiscal proposto pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva agrada ao PT gaúcho. O modelo apresentado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deve ser enviado ao Congresso Nacional nos próximos dias. As medidas, porém, enfrentam divergências internas.
Uma das críticas mais afiadas ao novo regramento fiscal partiu do deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ), que chegou a comparar o arcabouço a um pacto com o diabo, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, na semana passada. Em março, a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, também fez crítica ao mecanismo de controle de gastos. O argumento de Gleisi e Lindbergh é de que o governo precisa aumentar as despesas públicas como forma de estimular a economia do país, propósito que acabaria prejudicado com a nova regra.
No PT gaúcho, a posição majoritária é de apoio à proposta de Haddad. A presidente do diretório estadual do partido, Juçara Dutra, afirma que o mecanismo que pretende substituir o teto de gastos irá permitir a manutenção dos investimentos em programas sociais. Na avaliação de Juçara, a responsabilidade com as contas públicas é o caminho para atingir os compromissos na área social.
— O teto de gastos é uma linha que inibia os investimentos necessários. O arcabouço continua tendo responsabilidade (fiscal), mas dá margem para investimentos — opina a dirigente partidária.
A executiva estadual do PT tem reunião marcada para a próxima segunda-feira (17), a partir das 9h. O arcabouço deverá ser um dos itens da pauta. O secretário-geral do PT no Rio Grande do Sul, Carlos Pestana, considera que a nova regra poderá garantir ao Estado brasileiro a capacidade de fazer investimentos.
— Durante a campanha, o PT apresentou um conjunto de compromissos que dependem muito de investimentos do governo, até como forma de impulsionar o desenvolvimento econômico. Sem dúvida, é um avanço em relação ao modelo anterior, de teto de gastos.
Já o ex-governador Tarso Genro avalia que o arcabouço fiscal é uma espécie de "passagem" para levar o Brasil a "outro patamar", permitindo a combinação entre investimentos na área social e controle da dívida do país. Tarso cita o empenho de Lula nas relações exteriores durante os primeiros meses de gestão, especialmente na aproximação com China e Estados Unidos, e diz que a proposta da equipe econômica do governo é um modo de prestar contas aos credores internacionais, sem abrir mão da autonomia para investir em programas sociais.
— Não tem plano ideal para um país endividado como o nosso. Temos que lutar para aprovar o arcabouço. Depois, adequar receita e despesa — observa o ex-governador, para quem a aprovação da proposta também significará a sustentação política do governo.
Deputados apoiam proposta
Ministro nos governos Lula e Dilma, o deputado estadual Miguel Rossetto (PT) argumenta que o arcabouço precisa ser visto como parte de um conjunto de ações já adotadas pelo governo para a retomada da economia brasileira. Rossetto cita a aprovação da PEC da Transição, que permitiu investimentos no Minha Casa Minha Vida, Bolsa Família e salário mínimo, e a "reconexão internacional com uma nova política externa". O próximo passo, diz o petista, são a reforma tributária e o arcabouço fiscal.
— O arcabouço deve ser visto dentro deste conjunto. É uma medida positiva, vista como necessária e eficaz pela maior parte do partido. Essa posição é majoritária, sobretudo porque cria condições para uma política fiscal flexível, com disciplina de gastos e preocupação anticíclica. É importante lembrar que o presidente Lula tem uma base parlamentar ainda frágil e trabalha com limites. Esse conjunto de medidas trabalha para a superação desses limites — analisa Rossetto.
Na mesma linha, o deputado estadual e ex-ministro Pepe Vargas (PT) afirma que o arcabouço é um "avanço em relação ao teto de gastos", porque estabelece limites e preserva os investimentos sociais. Com críticas ao Banco Central pela manutenção da taxa básica de juro em 13,75% ao ano, Pepe considera que a proposta pressiona a autoridade monetária a baixar a Selic.
— A taxa de juro já deveria estar caindo. Não temos inflação por excesso de consumo. O Banco Central tem que dar a sua contribuição. Desestimula o investimento privado, aumenta a despesa da União e desestimula o consumo das famílias. A política monetária precisa acompanhar a fiscal — afirma.
Os deputados federais gaúchos Bohn Gass (PT) e Dionilso Marcon (PT) apoiam o arcabouço, mas ponderam que a proposta ainda não chegou ao Congresso e segue em construção. Ambos minimizaram as críticas de Gleisi e Lindbergh.
— As críticas são boas. O governo é do povo brasileiro, e o partido é de uma parte minoritária da população. É legítimo — observa Marcon.